terça-feira, 6 de agosto de 2013

Crítica: Antes de Watchmen - Rorschach

Complexo vigilante ganha história à la 100 Balas em seu próprio prelúdio

Por Georgeos Constantim

Para uma geração inteira de leitores, Watchmen é um marco na história dos quadrinhos como uma das melhores experiências relacionadas ao gênero. Tornando-se quase que uma entidade superior, a graphic novel de Alan Moore é considerada por muitos intocável, e o anúncio da DC em fazer vários prelúdios à obra causou nesse grupo um súbito frio na barriga. Esse "conservadorismo" é explicado pelo medo destes em ver um legado tão importante ser destruído pela ambição de uma empresa em sua eterna busca pelo lucro, ignorando seus criadores originais (Moore e Dave Gibbons, contrários à ideia) e entregando a outros artistas e roteiristas o controle de uma obra tão delicada.
Para o alívio destes leitores, em Antes de Watchmen: Rorschach não há motivos para se temer esta deturpação de talvez um dos melhores personagens da graphic novel. Depois das minisséries com releituras fracas e roteiros superficiais dedicadas aos herois Coruja e a Espectral, onde focou-se mais em ilustrações interessantes (O primeiro nem isso) e cenas de ação intermináveis, o problemático Walter Kovacs vem para ser o primeiro prelúdio a acertar em sua proposta, adequando o vigilante a tempos mais modernos e mantendo uma história profunda e realista, mostrando uma face humana pouco explorada no universo de Alan Moore.
Através do traço realista de Lee Bermejo, concilia-se no desenrolar da trama cenas de ação mais presentes em HQs modernas com imagens mais fortes até para o canal, além de uma ótima ambientação, característica de Watchmen.Em vários momentos do encadernado é possível ver como os desenhos se comunicam melhor com uma nova geração de leitores de quadrinhos, que, mais acostumados ao estilo de arte realista criado por Jim Lee e Mike Deodato, ficam com um pé atrás quando visitam obras mais antigas e clássicas como a própria Watchmen devido à coloração, traços e distribuição de imagens mais antiquada. As inserções da máscara de Rorschach (oriundas do famoso teste) em vários quadros também tornam-se em vários momentos um ótimo convite para o leitor explorar mais a fundo as ruas de Nova York.

Enquanto isso, na trama...

Se os desenhos de Bermejo acertam em cheio, o roteiro de Brian Azzarello prima pela qualidade. Vemos em Antes de Watchmen: Rorschach o seu personagem central no auge de sua carreira pelos becos e esgotos nojentos da fétida Nova York dos anos 70, agora atrás de uma quadrilha que comanda todo o crime da cidade com mão de ferro, desde a prostituição ao tráfico de drogas. Durante a investigação do nosso "heroi" percebemos um personagem quase que totalmente distante da humanidade e paranoico, igualzinho à obra original. Essa falta de conexão de Kovacs com o ser humano é percebida por seus clássicos diários, aonde ele narra suas desventuras e aproveita para despejar sua repulsão sobre humanidade, e sua interação com funcionários de uma lanchonete (talvez uma das últimas que ele tenha) onde frequenta após o dia de trabalho.
Nessa última, podemos enxergar um ponto que pouco havia sido explorado nos quadrinhos (exceto Kick-Ass): As consequências físicas do super-heroísmo. Sempre tomando surras, Walter Kovacs acaba com ferimentos horrorosos, e não tarda para ir parar no hospital (!) e quase morrer por seus atos. A obra de Moore é nesse ponto preservada e renovada, criando um realismo ainda maior no universo Watchmen.
Além do desgaste físico, ao longo da minissérie percebe-se como a mente de Rorschach encaminha-se para a degradação total. Um dos momentos mais evidentes dessa estrada é a inesperada participação de Travis Bickle, de Taxi Driver, em uma fuga do personagem, que é plenamente apoiado pelo taxista maluco de Scorsese. A relação estabelecida entre os dois evidencia mais uma vez o talento de Azzarello, que já é experiente em contar histórias sobre as camadas mais pobres da sociedade desde 100 Balas.
Há porém uma certa pressa (e claramente editorial) em se encerrar o prelúdio, e quem sofre mais no processo é o vilão Carne Viva. Bem desenvolvido até ali, o perverso chefe do tráfico tem um final dos mais bobos para uma trama que se propõe a ser realista, desapontando o leitor até ali ansioso pelo fechamento mais intenso e surpreendente.
O erro, porém, é pequeno se comparado ao todo, que do começo ao fim centra-se em seu objetivo principal e o conclue brilhantemente. O realismo proposto por Azzarello e Bermejo funciona perfeitamente para Rorschach, que ganha ainda mais camadas eu sua já bem desenvolvida psique. E com tantos erros vistos em outros prelúdios, Antes de Watchmen: Rorschach ganha um gostinho de "quero-mais" para novas desventuras do heroi na sujeira da cidade de Nova York.
Nota: 10/10

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