Han Solo - Uma História Star Wars

Leia a nossa crítica do mais novo derivado da saga!

Deadpool 2

Continuação tenta manter a subversão do original enquanto se rende às convenções hollywoodianas

Desejo de Matar

Eli Roth aterroriza ação do remake e não deixa os temas caírem na ingenuidade

Nos Cinemas #1

Nossos comentários sobre O Dia Depois, Submersão e Com Amor, Simon

Jogador N° 1

Spielberg faz seu comentário sobre o próprio legado em Hollywood sem esquecer do espetáculo no processo

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Crítica: Que Horas Ela Volta?

Anna Muylaert encontra no jogo social exercido dentro do lar um palco para discussão sobre mães e filhos.

Por Pedro Strazza.

Nos últimos anos, vem-se notando no cinema (até agora) sul-americano uma nova tendência, que consiste em interiorizar as lutas e contradições sociais de seus países ao âmbito doméstico, usando da instituição familiar para conseguir compreender melhor como sua sociedade funciona em sua gigantesca e complexa totalidade. Do drama geracional proposto pelo peruano Casadentro ao ensaio quase presunçoso do brasileiro Casa Grande, esse movimento sinódico parecia estar perdido no excesso de preocupação sociológica em cima da causa, mas encontra novo fôlego com Que Horas Ela Volta?, que não só faz um retrato social satisfatoriamente interessante como também é sagaz em criar um drama de relações maternas que guie seu estudo sobre o coletivo brasileiro.
Escrito e dirigido por Anna Muylaert, o longa conta a história de Val (Regina Casé), nordestina que mora e trabalha numa casa de elite em São Paulo, primeiro como babá para Fabinho (Michel Joelsas), a criança da família, e depois como empregada doméstica. Há dez anos no serviço, ela vê sua vida virar de cabeça para baixo quando sua filha Jéssica (Camila Márdila), que chega na capital paulista para prestar o vestibular de arquitetura na USP, vem morar com ela na residência de luxo e começa a questionar todos os costumes adotado pela hierarquia formada no local.
Esse choque de culturas proposto pela diretora funciona muito por causa da atenção que ela dá no primeiro ato a esta organização soerguida entre empregado e empregador - nesse caso, entre Val e a matriarca Bárbara (Karine Teles). Seja no "muro" branco erguido para separar a sala de jantar da cozinha ou no posicionamento quase sempre lateral da protagonista nas cenas em que divide com sua chefe, Muylaert e a diretora de fotografia Barbara Alvarez são inteligentes em delimitar ao espectador a natureza do relacionamento das duas mães não apenas pelos diálogos, que mesmo fundamental - a situação envolvendo o jogo de xícaras, por exemplo, se faz importante para acompanhar os caminhos tomados na narrativa - não seria capaz de sozinho dar cabo de tal tarefa. Dessa maneira, quando Jéssica é apresentada aos patrões de sua mãe o palco já está pronto para ser desconstruído.
Mas enquanto peça de conflitos sociais, Que Horas Ela Volta? funciona melhor como análise do mãe-e-filha em tempos posteriores ao grande fluxo migratório nordeste-sudeste. Isso porque o roteiro entende muito bem que além da dinâmica entre Val e Jéssica existe uma relação similar da primeira com Fabinho, muito mais íntima e pessoal que ele tem com a própria Bárbara ou que ela tem com a filha. A cena de abertura da obra, no qual traz a doméstica com o filho do patrão num momento tipicamente maternal, é crucial por expor a inconsistência do próprio ato e apontar uma das maiores consequências destes deslocamentos regionais - e que, como o filme bem lembra mais adiante, ainda existem no país.
Com isso em mente, é incômodo perceber que Muylaert abra mão de figuras mais complexas e adote em seus personagens o ar caricatural, cuja força acaba dependente demais do talento individual dos atores em realizar tal construção. Assim, enquanto Casé, uma atriz experiente em tipos sociais parecidos com o da protagonista, tira de letra seu papel e dá uma vivacidade fascinante a ela, a família interpretada por Teles, Lourenço Mutarelli e Joelsas acaba preso a estereótipos não muito interessantes da elite como a mãe frígida, o pai em crise de meia-idade ou o filho playboy que insiste em usar a camisa dos Ramones para denotar sua rebeldia. Márdila, por outro lado, faz à mercê de uma corrente de simbolismos uma Jéssica bastante funcional, capaz de atrair o espectador a seus dramas e sua posição insubmissa ao sistema.
É de um equilíbrio sagaz, porém, que Que Horas Ela Volta? se consagra, tanto no gênero (a comédia e o drama encontram espaços confortáveis para se sustentar) quanto na estrutura de sua história, elaborado com a mesma delicadeza no plano simbólico e no desenvolvimento dos arcos vividos por seus personagens. Em um filme que busca humanidade em tipos estilizados, Muylaert constrói uma obra sobre famílias despedaçadas em meio às regras duras do jogo social, feito incapaz de reconhecer seus danos ao indivíduo. E quando este último percebe a tolice da hierarquia à qual pertence, nada é melhor para celebrar que um mergulho na piscina do patrão.

Nota: 8/10

domingo, 30 de agosto de 2015

Crítica: Corrente do Mal

As consequências do desejo.

Por Pedro Strazza.

Já se entende que algo está muito errado na realidade proposta por Corrente do Mal quando aparentemente há uma ausência quase total de adultos nas cercanias da região onde os jovens protagonistas vivem suas vidas de subúrbio. A falta de uma figura mínima de autoridade para comandar a juventude em uma direção pretendida, um fato por si só aterrorizante para qualquer pessoa, é um indício de que o mundo retratado aqui sofreu uma grande perda, e seus efeitos desde então afetam seus moradores por meio de um temor que não é possível de ser explicado ou combatido.
Esse tipo específico de medo é o que melhor explica o monstro do filme, uma entidade misteriosa cujo método, como o título original bem resume, é o de seguir. A passos lentos e de certa maneira tranquilos, ele persegue o último elo de uma grande corrente de pessoas, que passam o fardo umas as outras pelo sexo e que tem como mais nova representante a jovem Jay Height (Maika Monroe). Assustada e temendo pela vida, ela parte junto de sua irmã Kelly (Lili Sepe) e os amigos Paul (Keil Gilchrist), Yara (Olivia Luccardi) e Greg (Daniel Zovatto) em uma jornada em busca de uma solução para sua maldição.
Essa incerteza sobre os acontecimentos, na verdade, é ao mesmo tempo a grande arma e o grande defeito de Corrente do Mal, porque é enquanto os protagonistas - e, por tabela, o espectador - permanecem na dúvida sobre a natureza do que persegue Jay que o longa consegue de fato aterrorizar com seu nevoeiro de perguntas. A sequência de abertura, no qual traz uma garota em fuga sem qualquer tipo de explicação e termina em um plano terrível, funciona justamente por deixar o público no escuro, apostando apenas no terror demonstrado pela moça e na aparente ameaça invisível que a segue.
Nesse quesito, o filme escrito e dirigido por David Robert Mitchell é bastante feliz em suas escolhas técnicas. Enquanto a fotografia paletada de azul de Mike Gioulakis funciona por do início prender a atenção do espectador ao que acontece no fundo de cena, forçando a sensação de agorafobia em planos abertos e introduzindo a criatura misteriosa muito antes da ação acontecer (algo similar em proposta com o recente Annabelle), a trilha sonora à base de sintetizadores de Rich Vreeland (creditado Disasterpeace) encanta por criar uma atmosfera pesada sem apelar para agudos, que relembra a todo momento do momento desgraçado vivido por esta realidade. A retratação do monstro (capaz de assumir várias formas) também é um ponto forte da narrativa, pois sempre se utiliza de aspectos incômodos do cotidiano - a nudez, a lembrança hospitalar, as roupas íntimas - que marcham reto em direção à sua vítima.
E esse clima de desolação não poderia ser mais adequado, já que a realidade proposta por Robert Mitchell se aproveita do período de incertezas que é os Estados Unidos da recessão. Como em Amantes Eternos e Garota Exemplar, Corrente do Mal transfigura todos os medos e receios provocados pelos efeitos físicos da crise econômica (não à toa, Detroit é palco dos eventos mostrados) em uma figura de terror, que aqui persegue a juventude sem responsabilidades e inconsequente dos erros cometidos no passado. O sexo, esse desejo de consumo supremo dessa fase da vida, torna-se portanto um mal impossível de ser evitado, cujas consequências são impossíveis de se escapar.
O problema dessa construção elaborada é que não sobra muita coisa sem o mistério. Conforme o nevoeiro de incertezas se dissipa e as dúvidas são respondidas, o filme acaba por se revelar um slasher um pouco mais sofisticado e não muito consciente de tal condição, entregue a clichês do subgênero que se acumulam consoante ao avanço da narrativa. O terceiro ato, por exemplo, soa bobo e até risível por carregar essa ingenuidade do roteiro, mesmo que seja muito bem construído do ponto de vista simbólico.
Ainda que ora ou outra caia na tentação do susto fácil - o close no buraco da porta na cena da praia é lamentável - e perca força ao explicar um pouco da natureza da ameaça, Corrente do Mal é inventivo em suas maneiras de gerar medo e na apropriação de seu contexto temporal. Sua eficiência técnica e teórica, porém, poderiam ser muito mais interessantes se este reivindicasse sua posição no gênero e trabalhasse a partir daí todo o seu mistério.

Nota: 7/10

sábado, 29 de agosto de 2015

Crítica: Ted 2

Comédia refaz os passos do original e denota esgotamento da fórmula de criador.

Por Pedro Strazza.

No que consta a Seth MacFarlane, é interessante perceber como seu estilo de comédia encontra-se não apenas desgastado no formato mas também mais datado. Desde sua bem sucedida estreia no cinema com Ted, o criador de Uma Família da Pesada vem perdendo força tanto comercialmente quanto artisticamente ao optar por não procurar trazer novidades à estrutura construída à base de esquetes e referências, presentes em sua carreira na televisão e no cinema. Dessa falta de arrisco provém um teor repetitivo, que a cada filme se faz mais forte e mais prejudicial para o humorista.
É essa sensação de repetição, vale dizer, que marca a continuação de Ted, lançada pouco mais de três anos depois do lançamento do original. Além da narrativa denotar essa tendência, a própria trama do segundo capítulo parece fazer de tudo para refazer os passos de seu antecessor, e realiza aqui e ali pequenas alterações no intuito de despistar o espectador de sua estratégia. O problema é que essas mudanças não são suficientes, e a sequência soa no fim como uma versão piorada do primeiro.
Dessas modificações, a principal é a inversão de protagonismo entre Ted (mais uma vez dublado por Seth MacFarlane) e John Bennett (mais uma vez interpretado por Mark Wahlberg). Se antes era o último que liderava o arco de amadurecimento na narrativa, é agora o urso de pelúcia quem desempenha a função, já que tem seus direitos humanos ameaçados por sua condição original de produto quando resolve ter um bebê com sua esposa Tami-Lynn (mais uma vez interpretada por Jessica Barth). Para evitar a perda de sua condição e a execução de um plano maligno empreendido pela Hasbro e seu nêmesis Donny (mais uma vez interpretado por Giovanni Ribisi), Ted terá que provar sua existência no judicial, e contará com o auxílio de seu amigo de trovoada e uma bela advogada júnior (mais uma vez interpreta... quer dizer, Amanda Seyfried).
Essa é uma trama que funciona muito bem em condições normais, mas que em Ted 2 se perde com velocidade principalmente porque o personagem envolto no arco de crescimento adotado não se interessa em torná-lo real. Tratado no primeiro filme como elemento antagonista na formação humana de Bennett, o urso de pelúcia não consegue assumir de fato na continuação a figura de protagonista por ser no âmago uma figura puramente cômica, e continua a sê-la sem arriscar. Incapaz de mudar sua personalidade ou aprender qualquer lição, os atos e a mentalidade de Ted são as mesmas no início e no fim do longa.
Assim, a história é esvaziada de sentido maior, e deixa vulnerável a estrutura cômica de MacFarlane, que mais do que nunca está às vistas. Escrito como sempre em parceria de Alec Sulkin e Wellesley Wild, o diretor assume por completo no roteiro a sua plataforma televisiva, criando piadas que saem da narrativa apenas para fazer rir. E se elas não funcionam, como é o caso na maioria das vezes aqui, sobra apenas a carcaça na imagem, exposta de maneira embaraçosa ao espectador.
A sorte do filme é que quando seu diretor acerta no humor ele o faz bonito. Mais apelativo do que nunca às referências a cultura pop, Ted 2 consegue ainda arrancar boas risadas do cotidiano e do cinema, a exemplo das cenas no tribunal ("Vocês devem estar achando muito estranho ter um urso de pelúcia no banco de testemunhas sem ter uma criança apontando para ele e dizendo aonde que o adulto tocou nele, né?") e na road trip, momento onde arranja melhor espaço para situar seu tipo de humor desbocado e esquemático. O esgotamento da fórmula de MacFarlane, porém, alcança níveis críticos ao evidenciar o quão parado no tempo está, e nada mais gritante que sua estereotipação ultrapassada do nerd aliado a um verdadeiro exército de merchans nos momentos passados na Comic Con de Nova York.

Nota: 4/10

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Crítica: Homem Irracional

Woody Allen faz mais do mesmo sem dar ar de graça.

Por Pedro Strazza.

Existe uma cena em Homem Irracional que além de fundamental para o encaminhamento da história serve também para entender o espírito geral do filme. Nela, os dois protagonistas da história, interpretados por Joaquin Phoenix e Emma Stone, discutem questão existencialistas em um restaurante quando, desgastados pela conversa, passam a escutar o diálogo dramático que acontece na mesa ao lado e envolve a disputa pela custódia de um filho e a posição desumana adotada pelo juiz titular no processo.
Esse aparente desinteresse pelos dramas vividos pelos personagens principais parece acompanhar desde o início até o fim da trama deste novo trabalho de Woody Allen. Equilibrado em uma história de propósitos já muito conhecidos do cinema, o longa usa sem qualquer inspiração de seus clichês em um ritmo aborrecido, como se estivesse pronto para se encerrar mesmo antes do fim do primeiro ato. As consequências, claro, são bastante negativas, mas isso não impede que a obra inclua uma boa ideia em algum momento da narrativa.
Escrito e dirigido por Allen, o filme conta a história de Abe Lucas (Phoenix), aclamado professor de filosofia que, envolto em uma depressiva crise existencial capaz até de influenciar em suas performances sexuais, começa a dar aulas em uma pequena universidade. Com um ar depressivo e pessimista, ele se envolve romanticamente com uma outra professora do campus (Parker Posey) e uma de suas alunas, a jovem Jill (Stone) em busca de alguma solução para seu problema sem alcançar qualquer sucesso. Tudo muda, porém, quando ele entra em um restaurante com Jill e acaba no momento descrito acima.
Sem surpresas, Allen repete aqui muitos elementos, temas e discussões que já abordou em outros filmes, mas dessa vez sem maior inspiração. O debate sobre os prazeres do racional e do irracional, central à obra, parece uma mistura dos questionamentos levantados em Magia ao Luar e no fraco Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos sem acrescentar nada ao mostrado nestes longas, e isso repercute em toda a estrutura adotada. Não à toa, o alter-ego da vez do cineasta soa genérico em essência, quase um vazio criativo comparado a outros personagens no qual ele incorporou sua personalidade - que Phoenix, claro, nada pode fazer para ajudar.
Por outro lado, Homem Irracional traz em sua mediocridade um olhar minimamente interessante sobre construção de personagem na narrativa elaborada, justo nesta cena em que escuta a conversa no restaurante. A virada pela qual Abe, o dito protagonista da trama, promove em sua vida parte de um ato que não veio a seu encontro e sim foi vazado de um terceiro, e seus esforços em razão do evento são direcionados para esse desconhecido. Sua felicidade provinda daí, decisiva para que ele consiga ganhar o gosto pela vida mais uma vez e tenha algum objetivo nesta, portanto, vem de uma ação típica de uma figura coadjuvante, e põe em questão toda a sua centralidade no roteiro. Consciente desse viés, Allen (com a ajuda do diretor de fotografia Darius Khondji) mostra interesse em ora ou outra apresentar o professor numa posição de distância, rodeado por uma natureza que parece o engolir em sua beleza.
Dominado por arcos que parecem dar voltas e voltas para chegar a lugar algum (o vivido pela personagem de Stone de longe sendo o pior), Homem Irracional não é nem de perto uma abominação ou um trabalho execrável de Woody Allen. O filme, entretanto, prova ser o longa mais desinteressante do diretor, já que é incapaz de fazer algo mais elaborado de uma história no fim tão previsível e sem graça.

Nota: 5/10

sábado, 22 de agosto de 2015

Crítica: Exorcistas do Vaticano

Filme não consegue se encaixar ao subgênero, mas traz ideias interessantes a ele.

Por Pedro Strazza.

No geral, filmes sobre exorcismo são capazes de apavorar o espectador por ser o subgênero do terror a chegar mais perto de retratar ao público o medo inerente do fim do sistema organizacional, que rege o cotidiano com mãos de ferro. Este viés pode ser encontrado, por exemplo, em O Exorcista, clássico do tema cuja estrutura já é seguida por outras produções há anos: A partir de um símbolo da inocência, o demônio vem para desorganizar a ordem humana, fazendo pouco de suas instituições e evidenciando as incoerências sistemáticas dessa - no caso da obra de William Friedkin, a razão que apela para a fé quando em apuros ou o padre descrente. E para corrigir todo esse caos só mesmo a figura sacerdotal máxima, que aparece no fim disposto a restaurar a humanidade a seu estado servil e salvar o sistema, mesmo que pelo sacrifício.
Em Exorcistas do Vaticano, este esqueleto é mais uma vez empregado, mas ganha um olhar diferente nas mãos do diretor Mark Neveldine. Anárquico por essência, o cineasta conhecido por sua parceria com Brian Taylor (com o qual fez Gamer, os dois Adrenalina e Motoqueiro Fantasma 2) questiona as noções fundamentais do subgênero e faz de sua primeira incursão solo na posição um verdadeiro atestado contra a ordem imposta. Não por acaso, as figuras de autoridade presentes no roteiro de Chris Morgan e Christopher Borrelli são representadas como ameaçadoras, com um olhar e postura sempre sugerindo a sua posição duvidosa no esquema a ser desenrolado.
Na trama, acompanhamos a trajetória de Angela (Olivia Taylor Dudley), uma moça de traços físicos e pessoais exageradamente puros - "Ela não seria capaz de fazer mal a uma mosca" admite o namorado interpretado por John Patrick Amedori - que é possuída por uma entidade maléfica, para desespero de seu amado e seu pai (Dougray Scott, em um papel quase oposto ao resto de sua carreira). Enviada a um hospital psiquiátrico, ela se torna cada vez mais poderosa e letal, e acaba por atrair a atenção do Vaticano, que temendo que ela esteja sob controle de uma força satânica antiga manda o cardeal Bruun (Peter Andersson) para exorcizá-la.
Já se percebe na descrição acima a inversão de valores que Neveldine dará à história de possessão, que põe a instituição como ameaça e o mal como figura de insubordinação. Pela câmera do diretor, autoridades como padres (Djimon Hounsou praticamente traz a aparência clássica do diabo com seu cavanhaque), policiais e médicos se tornam antagonistas por estarem menos dispostos em salvar Angela e mais em preservar o sistema, e vão às últimas consequências para tal. No hospital, por exemplo, nota-se no momento posterior à invasão da garota ao berçário uma posição quase de repulsa a ela por parte do corpo administrativo, que se apressa em taxá-la de perigosa à sociedade.
O demônio, por outro lado, surge com uma rebeldia típica dos adolescentes que o cinema habituou-se a fazer de mocinho, e por isso torna-se uma das peças mais interessantes do tabuleiro montado por Morgan e Borrelli e executado por Neveldine. Pois se esta mesma entidade é representada em outros exemplares do subgênero como uma força desmoralizante e de puro mal, em Exorcistas do Vaticano ele é empregado no extremo oposto, uma única esperança para derrubar a ordem antiga estabelecer uma nova e sem leis. Nesse ponto, o desfecho apresentado é o que o filme mais apresenta de assustador ao espectador, porque faz do caos uma realidade.
O problema é que, se essa materialização é o mais aterrador da obra, não sobra muito para assustar, e as tentativas do diretor em corrigir isso fracassam de forma vexaminosa. Mesmo na hora do exorcismo, que ocupa com naturalidade o terceiro ato e é quando o subgênero mais prova seu potencial de terror, Neveldine se mostra incapaz de conduzir a história ao horror, e isso esvazia a trama de uma força maior. E em alguns momentos os esforços empreendidos são risíveis, como bem exemplifica a cena dos ovos - e tentar não lembrar de Leslie Nielsen e Apertem os Cintos... O Piloto Sumiu! nesse momento prova-se ser uma tarefa bastante complicada.
Assim, Exorcistas do Vaticano tem um resultado peculiar. Embora tenha uma interessante linha de raciocínio embasada em princípios anárquicos e faça algo diferente em seu nicho, ele não cumpre com as metas exigidas pelo gênero, tornando sua experiência cinematográfica pouco funcional. O que Neveldine e sua equipe tem de visão teórica faz falta na execução, e isso se torna o maior golpe contra o longa.

Nota: 5/10

domingo, 16 de agosto de 2015

Crítica: Missão: Impossível - Nação Secreta

Crise do espião chega ao mundo globalizado em ação pelo espetáculo.

Por Pedro Strazza.

"Você é ele, né? Eu ouvi suas histórias" pergunta uma agente do IMF para o protagonista Ethan Hunt pouco antes deste conhecer sua próxima tarefa, logo no início de Missão: Impossível - Nação Secreta. É uma pergunta simples e direta, mas que, junto aos eventos ocorridos imediatamente após esta ação, serve para reforçar ao espectador o caráter lendário que o personagem interpretado por Tom Cruise criou em torno de si mesmo ao longo dos anos. Sua imagem, agora, é muito mais que a de apenas mais um espião; é a simbologia máxima do agente secreto, cujos atos são enxergados com admiração por outros.

E quem melhor do que a figura idealizada para entrar em conflito direto com o próprio sistema que representa?

Presente em Missão: Impossível desde o primeiro capítulo, este conflito entre indivíduo e organização toma enfim o centro do palco neste quinto capítulo da franquia, sendo representado por verdadeiras instituições em ambos os pólos. De um lado temos Hunt e sua equipe, que em seus integrantes encaixa todas as funções e estereótipos universais da espionagem para apoiar da melhor maneira possível seu herói nos esforços de salvar o mundo; no outro está o Sindicato, uma organização terrorista global que liderada por Solomon Lane (Sean Harris) se aproveita do caráter marginal para conseguir a derrocada do sistema e alcançar o controle político total, atuando da mesma forma que uma soberania em expansão.

É um combate maniqueísta e de certa forma um "Davi e Golias" clássico que o diretor e roteirista Christopher McQuarrie realiza aqui, mas potencializado por uma aproximação da realidade dos nossos tempos. Pois ao desvincular de vez a figura do agente da representatividade de uma nação e fazê-lo colidir com a mesma (Hunt não só precisa enfrentar o Sindicato mas também é perseguido pela CIA), o filme no fundo acende a questão do para quem o espião trabalha no mundo de hoje, marcado pela globalização e o esvaziamento de um nacionalismo racional. Talvez seja por isso que o Sindicato, uma instituição ascendente que age como uma verdadeira empresa transnacional, seja tão temerária à CIA e ao MI6, agências secretas cujos líderes são retratados no filme como peças ingênuas de um tabuleiro maior e muito mais sofisticado em relação ao passado.

Então aonde fica o espião nesse conflito macroestrutural? Sua lealdade está com quem? Qual é a sua missão nesse grande esquema das coisas? São perguntas que Hunt desesperadamente busca encontrar uma resposta enquanto tenta cumprir a missão da vez mesmo quando consciente da falta de importância que tem como ser humano nesse jogo de interesses disfarçado de gato-e-rato. Quem resume bem isso é Ilsa Faust (Rebecca Fergunson, excelente na primeira agente feminina da série a de fato ter uma participação maior na trama), outra agente em crise nesta questão de que "Sempre existirá um Solomon a ser derrotado e sempre haverão agentes como nós".

A solução encontrada por McQuarrie para esse dilema tão complexo é concentrar no objetivo humano, que posto em segundo plano neste conflito essencialmente político serve tanto para deixar ainda mais claro o reflexo de realidade do espelho fantástico como também põe em perspectiva qual o verdadeiro ponto de toda a disputa e da espionagem. Não à toa, o clímax do terceiro ato envolve primordialmente salvar uma vida e não aniquilar uma organização, que serve ainda para atestar a maior urgência do primeiro em relação ao segundo.

Mas se Missão: Impossível 5 é eficaz nessa abordagem mais política, ele também encanta por executar com excelência a ação descompromissada necessária ao gênero. Afinal, Nação Secreta traz em mãos o maior confronto entre vilão e mocinho da franquia nas figuras de Hunt e Lane, as idealizações máximas desse mundo complexo de espionagem que lutam com todas as forças para destruir o outro. Nesse ponto, a presença recorrente da cabine de fumaça se faz como lembrete literal do esquecimento consequente da derrota aqui, capaz de apagar da memória todos os grandes feitos realizados.

Além disso, McQuarrie é sagaz em fazer deste duelo existencial um verdadeiro espetáculo. Do embate de snipers na ópera em Viena à perseguição de motos no Marrocos, passando pelos planos mirabolantes empregados por Hunt e sua equipe, o diretor sabe conduzir a tensão decorrente sem se perder em exageros, e parece sempre disposto a entregar ao espectador tudo o que ele precisa saber para se entreter - e para sua sorte ele conta com Tom Cruise, um ator que vê nesse objetivo a maior de suas metas, no papel principal desse show de acrobacias.

É assim, nesta combinação sublime de atração e reflexão, que Nação Secreta se consagra como o capítulo mais interessante da série. Capaz de tornar as crises do agente dos Missão: Impossível de Brian De Palma e J.J. Abrams meros exercícios teóricos e de levar ao extremo o "mirabolantismo" das sequências de ação vistos nos episódios dirigidos por John Woo e Brad Bird, o quinto filme da franquia se usa de todos os elementos que consagraram a saga de Ethan Hunt para criar uma aventura completa, perfeita para tirar indivíduos cansados da mesmice burocrática e de seus videogames pouco imersivos.

Nota: 10/10

sábado, 15 de agosto de 2015

Crítica: A Escolha Perfeita 2

Continuação acerta o passo, mas continua a tropeçar pela herança do primeiro capítulo.

Por Pedro Strazza.

Percebe-se no humor empregado por Rebel Wilson para viver sua Fat Amy em A Escolha Perfeita 2 um resumo de algumas das principais diferenças que separam a sequência do original. Enquanto que no filme de 2012 a moça fazia da comédia auto-depreciativa sua principal bandeira para criar riso e conseguia com isso pouca coisa além de momentos embaraçosos (marcados pelo emblemático "Oi, meu nome é Amy, mas você pode me chamar de Fat Amy"), na continuação a personagem parece ter abandonado essa preocupação em avisar todos de seu orgulho com o corpo e concentra maiores esforços em tirar riso das situações, apesar de aqui e ali ainda cair na tentação.
Essa súbita mudança, mesmo que sutil, tem grandes efeitos na aplicação da fórmula que a agora franquia adotou como sua. Antes um guilty pleasure assumido que encantava o público por esta "honestidade", A Escolha Perfeita assume em seu segundo capítulo um tom menos escrachado, procurando dotar sua trama de redenção de um significado maior. Ao mesmo tempo, o longa dirigido por Elizabeth Banks e roteirizado por Kay Cannon repete a estrutura do primeiro com ajustes, em busca de um molde mais clássico de comédia ocasionado talvez pelo medo natural de qualquer continuação do gênero em se perder neste ato de recorrência.
É uma estratégia que funciona, ainda que com problemas. Pouco experiente no comando atrás das câmeras (este é seu longa-metragem de estreia na posição), Banks realiza sem maiores dificuldades o arroz e feijão do gênero se usando principalmente da trama romântica, construção de roteiro primária que é aplicada em duas das três protagonistas (Wilson e a novata interpretada por Hailee Steinfeld). Essa execução do básico também leva em conta a própria redenção, que ao contrário do original entrega no fim a catarse necessária - os Das Sound Machine liderados pelos personagens de Birgitte Hjort Sørensen e Flula Borg, afinal, são melhor trabalhados como antagonistas que os Treblemakers no primeiro.
O grande acerto de Banks, na verdade, acontece no tratamento dado ao humor e em seu direcionamento aos objetivos temáticos do filme. Além de corrigir o timing cômico de Fat Amy e de outros personagens - inclusive o da protagonista Anna Kendrick, cujos encontros com os inimigos alemães são terrenos de boas risadas - e criar uma linha sarrista com a própria seriedade das competições de acapella (a introdução é excelente nesse ponto), a diretora alinha esse desenvolvimento com sua lição de união feminina, de início promovendo um desequilíbrio de esquetes entre as integrantes das Barden Bellas para na virada do segundo ato ressaltar a importância do esforço sinergético do grupo, algo arriscado se considerar a consequente inconstância humorística do primeiro terço da obra.
O tom cômico da narrativa, porém, é algo que também prejudica A Escolha Perfeita 2, pois, embora este busque se distanciar do original, sua escolha pela repetição estrutural se faz prejudicial. Não só pelas figuras estereotipadas que marcam presença no grupo - ao contrário dos comentaristas interpretados por Banks e John Michael Higgins, que ainda são as melhor parte da franquia por sua clara e ridícula linha de pensamento preconceituosa, as piadas feitas pela mexicana interpretada por Chrissie Fit soam apenas xenófobas - como também pelos próprios papeis adquiridos pelas Bellas no arco de último trabalho, equivocado por fazer das personagens pessoas completamente despreocupadas do futuro.
Mesmo que continue a não aproveitar o potencial das competições musicais que apresenta (pessoalmente continuo crente de que os face offs musicais deveriam ganhar maior espaço) e exagere nos trocadilhos com acapella, A Escolha Perfeita 2 se sai melhor em relação ao antecessor ao encontrar no coletivo um personagem principal muito mais funcional que a Beca de Kendrick. Mas é ao abordar um caminho mais tradicional em sua estrutura que a produção acerta o ritmo, mantendo uma constância capaz de tornar seus erros vindos do original menos evidentes em prol de suas renovações.

Nota: 6/10

domingo, 9 de agosto de 2015

Crítica: Quarteto Fantástico

Releitura da equipe erra a mão ao ignorar seus elementos fundamentais.

Por Pedro Strazza.

Primeira equipe de super-heróis criada nas páginas da Marvel pela dupla Stan Lee e Jack Kirby, o Quarteto Fantástico ganhou fama nos quadrinhos por trazer em seu alicerce criativo a combinação quase antagônica entre ciência e família. No fundo frutos oriundos respectivamente da razão e da emoção, a combinação destes dois elementos é notável na trajetória do grupo, que tem nos líderes cientistas Reed Richards e Sue Storm a instituição do casamento, fundamental para a gênese familiar.
Encontrar e traduzir esse equilíbrio delicado dos quadrinhos para o cinema, porém, parece ter se tornado uma tarefa bastante complicada. Enquanto as versões dirigidas por Tim Story em 2005 e 2007 se mantiveram ao lado família para criar uma comédia de aventura pouco substancial, o reboot comandado agora por Josh Trank se concentra mais na área científica e obtém resultados similares. Pois por mais sério que procure parecer, a nova versão do Quarteto consegue comete um mesmo número de erros de seu antecessor.
A diferença aqui é que enquanto os outros dois filmes não mostravam quase nada interessante para entreter em seu esforço hercúleo de descontração, o remake tem ideias e conceitos promissores. Com clara base no universo Ultimate dos quadrinhos (onde houve um esforço notável para mudar o grupo), o longa traz nas jovens versões de Reed Richards (Miles Teller), Sue (Kate Mara) e Johnny Storm (Michael B. Jordan) e Ben Grimm (Jamie Bell) uma forte conexão ao descobrimento humano e suas consequências, um tema bastante conhecido do terror científico. É nesse subgênero, inclusive, que o diretor procura adequar sua história, encontrando na maneira como os seus personagens ganham seus poderes a mais pura forma de horror, e o apavorante momento em que Grimm toma consciência da monstruosidade que se tornou é prova cabal disso.
Não é à toa, portanto, que o real protagonista do filme seja Richards, que carrega em seus óculos de armação grossa a figura do jovem sedento pelo progresso. Central no roteiro escrito por Simon Kinberg, Jeremy Slater e Josh Trank, Reed não chega a encarnar de fato o cientista louco e cego pelos louros consequentes de seu objetivo (sua busca não é pelo sucesso, ele bem diz), mas seu arco - bem trabalhado por Teller na medida do possível - caminha muitas vezes próximo a esse perfil graças ao sofrimento com os erros cometidos de forma imprudente, atitude típica da do adolescente instável pela fase adolescente. Essa insensatez dos atos juvenis, por sinal, é um tema bastante presente nos meninos super-poderosos de Poder Sem Limites, longa anterior de Trank como diretor.
Os problemas de Quarteto Fantástico começam, porém, quando o protagonista sai de cena horrorizado com suas ações e a história a partir daí abandona por completo suas ideias. O ato, por mais característico que seja de seu gênero, é usado com infantilidade como ponto de virada pelo roteiro para encaminhar a obra aos clichês dos quadrinhos de super-herói e o esvazia de seu sentido original. A segunda metade, inclusive, parece pertencer a um produto completamente diferente, na medida que se faz tão leviano e exagerado tal qual os filmes de Story.
Mas isso não seria tão problemático se Trank não concentrasse tanto sua atenção apenas em Richards, e essa decisão acaba por tirar força da unidade que torna a equipe tão famosa. Relegados ao segundo plano, Sue, Johnny e Ben são trabalhados de forma unidimensional de forma que os três funcionem somente como apoio para a construção de seu futuro líder, em figuras conhecidas e pouco interessantes: Enquanto os dois últimos ressaltam o desperdício de potencial ao fazerem caminhos sem inspiração na história (o Coisa tem seu drama de transformação submetido ao arco de cobaia militar, o futuro Tocha Humana sai da identificação rebelde apenas para desejar a submissão ao governo), a Mulher Invisível de Mara frustra por ocupar uma posição de fundo tão similar à da versão de Jessica Alba. E se até os mocinhos são mal-utilizados, não sobra muito para o Victor Von Doom de Toby Kebbell senão a caricatura de traços maniqueístas.
Reinado por resoluções infantilizadas (o conflito criado na relação entre Reed e Ben é interrompida sem motivo aparente) e um clímax hilário por seu ridículo, Quarteto Fantástico é uma decepção na maneira como joga fora suas ideias e seu ótimo elenco em uma trama que vai a lugar nenhum. O mais complicado, porém, é perceber como Trank e seu filme não capazes de captar a sinergia e os elementos do grupo que transpõe para as telas, cegos talvez pelo esforço em querer conceber uma nova visão da equipe. Este esquecimento, em última análise, é o que destrói qualquer sustentação plausível da produção.

Nota: 4/10

sábado, 1 de agosto de 2015

Review: Wet Hot American Summer - First Day of Camp - 1° Temporada

Prelúdio a cultuada comédia de 2001 encontra na auto-referência e na TV um maior espaço para trabalhar.

Por Pedro Strazza.

Existem dois momentos distintos de Wet Hot American Summer - First Day of Camp que definem bem tanto o seu tipo de humor quanto a sua auto-consciência do quão absurdo é sua existência. No primeiro, a jornalista Lindsay (Elizabeth Banks), de 24 anos, consegue provar à redação aonde trabalha que é capaz de se passar por uma adolescente de 16 anos apenas prendendo uma parte do cabelo para trás; no segundo, uma garotinha chamada Abby corre para um banheiro por estar tendo a primeira menstruação e, quando sai do box, a atriz infantil que a representava é substituída por uma adulta (Marisa Ryan) pessimamente disfarçada de criança somente porque ela é agora "uma mulher", nas palavras das monitoras que a recebem.

Além de trazerem mulheres em situações cômicas que cheiram à naftalina dos anos 80, esses dois esquetes ressaltam ao espectador o ridículo que é a situação de fazer um prelúdio sobre uma comédia adolescente feito há quase 15 anos com um elenco agora envelhecido. Mesmo que atrizes como Ryan e Banks continuem estonteantes depois de tanto tempo - especialmente a última, ainda capaz de fazer o papel de jovem com 41 anos-, a série anterior aos eventos do inexplicável filme cult Mais um Verão Americano tem em mãos um paradoxo temporal exagerado, impossível de ser solucionado até pelas mãos do roteirista mais brilhante. Um luxo que, óbvio, ela não tem aqui.

Resta então aos criadores David Wain e Michael Showalter abraçar o descompromisso com a realidade, algo muito fácil se considerar que a base é um besteirol dos mais enlouquecidos. A diferença, porém, é que se no longa-metragem o humor desconectado da dupla com velocidade se tornava tedioso de assistir, no formato Netflix de seriado - onde temporadas inteiras são liberadas de uma vez e, assim, agrupa os episódios em filmes de mais de 5 horas - eles encontram uma espécie de "consagração" para sua história.

O problema é que essa glória não chega a ser real porque, no fundo, o prelúdio só é superior ao filme por ter mais tempo para realizar o mesmo tipo de comédia. Como uma metralhadora, o roteiro dos oito episódios escritos por Wain e Showalter dispara para todos lados afim de em algum momento acertar o espectador e fazê-lo rir, e em vários momentos eles alcançam seu objetivo. Mas para chegar a uma boa piada First Day of Camp precisa fazer pelo menos umas cinco ruins, e dessas cinco pelo menos uma sai como uma crítica política antiquada (o próprio Showalter interpreta um vilanesco presidente Reagan, afinal) e outras duas soam mais como ofensa que qualquer outra coisa.

A sorte da série é que o elenco, ao contrário de seus criadores, evoluiu bastante desde 2001 e conta com ótimas adições. Com maior tempo de tela, o time de estrelas liderados por Paul Rudd (sem explicação plausível o novo protagonista da trama) e que conta com nomes como Amy Poehler, Bradley Cooper, Jason Schwartzman, Christopher Meloni - talvez o melhor em cena, pois quase sempre tira de seu cozinheiro/ex-militar paranoico as melhores piadas - e a própria Banks é capaz de envolver o seu público com seus personagens caricatos, mais adequados ao formato televisivo por justamente terem o perfil de figuras escrachadas de uma típica sitcom. Mais exagerados e também hilários são as participações que pipocam ao longo da história, como o agente assassino interpretado por Jon Hamm (que, como em Unbreakable Kimmy Schimdt, prova mais uma vez ter um timing cômico invejável) ou Weird Al Yankovic, apenas mais uma dessas figuras vindas de um passado quase fantasmagórico para assombrar o seriado.

É da auto-referência, porém, que Wet Hot American Summer - First Day of Camp tira seus melhores momentos. Seu escárnio com a diferença claras de idade do elenco para seus papéis ("Sua liderança vai ser tão boa que até o fim do verão todos nós teremos rejuvenescido 15 anos" diz alguém no fim de um dos episódios) e os absurdos cometidos durante a sequência de eventos (a cena envolvendo os personagens de Hamm, Meloni e Janeane Garofalo no finale, por exemplo) provam que Wain e Showalter estão sabendo da baixa qualidade do material que criaram, mas isso não os impede de se divertir na mediocridade.

Rir de si mesmo, entretanto, não necessariamente esconde a própria mediocridade do produto.

Nota: 5/10