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segunda-feira, 29 de junho de 2015

Crítica: Minions

Falta conteúdo na aventura solo dos ajudantes de Gru.

Por Pedro Strazza.

O caminho da Illumination Entertainment nestes seus primeiros anos tem sido instável. Fundada em 2007, o estúdio de animação parceiro da Universal mostrou-se promissor com Meu Malvado Favorito, seu adorável filme de estreia, mas não conseguiu repetir o mesmo feito com seus trabalhos seguintes. A bem da verdade, a empresa sugere a cada nova produção estar mais interessada no lucro comercial - tarefa esta bem executada, a exemplo dos resultados de bilheteria de Meu Malvado Favorito 2 - que entregar produtos mais significativos, como bem indica a dominância de protagonistas exageradamente fofos em seus longa-metragens.
Nenhum deles alcançou, porém, o sucesso de público dos Minions, que encheram os cofres do estúdio como coadjuvantes nas aventuras protagonizadas pelo vilão Gru e agora ganham um filme de origem próprio. Dirigido por Kyle Balda e Pierre Coffin, a trama segue a trajetória dos pequenos seres amarelos antes de conhecer seu atual mestre, indo de seu estado embrionário até os anos sessenta, e foca em sua missão de servir a criatura mais diabólica possível. Seus esforços em cumprir tal tarefa, entretanto, acabam por os levar ao exílio e sem ninguém para lhes dar ordens, e os minions Kevin, Stuart e Bob se voluntariam para encontrar um novo líder.
O que se busca nessa separação dos três de seu bando é simples, mas difícil de ser executado. Além de criar protagonistas de fácil identificação para sua jornada (é muito mais fácil usar apenas alguns minions ao invés de todos), o roteirista Brian Lynch procura diminuir dos personagens o seu caráter único de alívio cômico, presente desde o primeiro Meu Malvado Favorito e mantida intacta na sequência. A uniformidade das criaturas, até então uma vantagem para os realizadores, torna-se um obstáculo no derivado, que quer justamente diferenciar um dos outros para conseguir contar uma história.
A medida chega a servir seus propósitos em alguns momentos, mas não se faz plena pela própria necessidade da trama em entregar comédia (aqui com poucos altos e muitos baixos) com regularidade. Enquanto os três principais se divertem com os costumes e hábitos da Inglaterra dos anos sessenta, os outros minions continuam a funcionar como muleta de humor em suas aventuras próprias, e a trama acaba esvaziada. É perceptível em Minions a falta de um real protagonista que seja capaz de guiar a história e todo o seu humor em um arco pessoal, coisa que Kevin, Stuart e Bob não conseguem por ainda estarem ligados à sua origem criativa.
Por outro lado, o filme também perde por não possuir um antagonista minimamente interessante. Como Victor Perkins e El Macho, Scarlett Overkill (Sandra Bullock no original, Adriana Esteves na versão dublada) e seu namorado Herb (Jon Hamn/Vladimir Brichta) são vilões pouco convincentes, que falham tanto para criar oposição aos mocinhos como para entregar boas cenas de humor. E no caso de Overkill as coisas desandam ainda mais pelo seu contexto de formação, apoiado em valores moralistas demais para uma franquia que prega a inocência.
Dessa forma, Minions se firma em uma posição não muito favorável. Apesar de ser mais honesto que seu antecessor na questão do humor (os minions pelo menos desta vez assumem terem se tornado figuras centrais), o derivado está longe de encantar na mesma proporção que o primeiro Meu Malvado Favorito, se rendendo demais ao propósito financeiro de sua produção. E embora as situações vividas pelos seres amarelos crie alguns sorriso aqui e ali, a sensação de "faltar algo" expressada pelo próprios personagens ao longo da narrativa se reflete de maneira inequívoca no público ao assistir suas aventuras. Uma pena.

Nota: 5/10

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Crítica: Lugares Escuros

Filme sofre por elementos internos e externos, mas traz qualidades próprias.

Por Pedro Strazza.

É complicado assistir Lugares Escuros sem lembrar pelo menos uma vez ou duas de Garota Exemplar. Ambas adaptações de livros escritos por Gillian Flynn, o primeiro se assemelha muito ao segundo em estrutura, temas e até viradas, culpa em parte do fato de ser o antecessor imediato do best-seller de 2012 e de sua versão cinematográfica chegar pouco menos de um ano depois do lançamento do longa dirigido por David Fincher. As consequências de tal decisão se fazem imediatas, e o filme comandado por Gilles Paquet-Brenner sofre por essas comparações.
A história acompanha Libby Day (Charlize Theron na fase adulta, Sterling Jerins quando criança), única sobrevivente do assassinato de sua família que ficou conhecido na mídia como o "Massacre do Kansas" e que tem como culpado seu irmão Ben (Corey Stoll no presente, Tye Sheridan no passado). Sem rumo na vida e com dinheiro faltando, ela aceita o convite de um garoto chamado Lyle (Nicholas Hoult) para ajudar em sua sociedade de investigadores amadores, que acredita na inocência de Ben e busca solucionar a identidade do verdadeiro assassino.
Embora a produção não tenha envolvido Flynn na transposição do livro para a telona, é possível enxergar traços da autora por toda a narrativa. Os flashbacks, a protagonista detestável, o clima derrotista oriundo do reflexo da crise dos Estados Unidos... tudo em um estágio mais primário, que se usa de engrenagens mais simples e por vezes mais dada a falhas. Quem bem atesta isso é o próprio personagem de Lyle, que assume na narrativa desenvolvida por Paquet-Brenner um caráter simplório de fio condutor da trama.
A grande diferença entre Lugares Escuros e Garota Exemplar, na verdade, reside na instituição da qual o longa se dispõe a desconstruir. Enquanto que na obra de Fincher era o casamento o objeto de crise, o filme usa do mistério em mãos para expor as mazelas da família tradicional, principalmente pelo núcleo de personagens presentes nos flashbacks que do princípio mostram este contexto de fragmentação. Seja no pai ausente, no filho problemático ou nas dificuldades para manter a fazenda em posse, a família Day mostra ao longo de seu último dia de vida uma conjuntura de sinais de desabamento, e não chega a surpreender que a matriarca Patty (Christina Hendricks), grande pilar de sustentação do grupo, seja a única a perceber isso.
Mas por mais que seja uma crise de padrão global, é interessante ver como Flynn a transpõe mais uma vez para o próprio contexto estadunidense, algo que Paquet-Brenner compreende e reproduz com relativo sucesso. Nesse ponto, a história dos Day consegue criar uma distância mais clara da dos Dunne por possuir um maior pessimismo, pois Lugares Escuros não traz o antigo por uma ótica nostálgica como Garota Exemplar: privilegia-se tanto no passado quanto no presente uma valorização da decadência e do vazio (quando não tomado pela bagunça do consumismo, a exemplo da casa onde a Libby adulta vive), e não há qualquer sinal de esperança em nenhum dos horizontes que não seja considerado por todos uma bobagem infantil.
Se não fosse a proximidade com seu sucessor literário e sua trama tão oscilante - a resolução da investigação no terceiro ato frustra pela infantilidade e abusa de um deus ex machina dos mais absurdos -, Lugares Escuros talvez ganharia maior destaque pela profundidade temática ao qual se dispõe a realizar. Seus problemas, porém, são tão visíveis quanto seus méritos, e isto acaba por se tornar simultaneamente em sua maior vantagem e desvantagem.

Nota: 7/10

sábado, 20 de junho de 2015

Crítica: Lava

Curta erra a mão no sentimentalismo e soa piegas.

Por Pedro Strazza.

Chega a ser curioso que a Pixar alcance tanto o auge quanto o fundo do poço em uma mesma projeção de Divertida Mente. Enquanto o longa-metragem de Pete Docter brilha com suas ideias criativas dentro da consciência de uma criança, o curta Lava, que antecede a exibição do filme, se perde em meio ao show água com açúcar que propõe e entrega uma das piores experiências propostas pelo estúdio em seus quase 30 anos de existência.
Dirigido pelo estreante James Ford Murphy, o filme conta a história de Uku (Kuana Torres Kahele), um vulcão havaiano que vive solitário em uma ilha onde todos os casais animais se encontram para se apaixonar. Apesar de levar uma vida tranquila e ficar feliz de servir para um propósito tão bonito, Uku se sente triste em nunca encontrar um par para si. Mas tudo muda quando uma "vulcoa" chamada Lele (Napua Greig) começa a nascer no fundo do oceano.
Contado em milhares de anos, Lava soa do começo ao fim piegas. A canção que dá título ao curta e entoada pelos dois personagens é genérica a ponto de em muitos momentos lembrar a versão em ukelele de "Somewhere Over the Rainbow", arrancando do instrumento havaiano todo e qualquer tipo de sentimentalismo barato. Para piorar, o conto não traz nada muito criativo, pois se restringe a emular clichês do gênero para dar tom à concepção fofinha da produção.
Embora seja bastante parecido em objetivo e execução a O Guarda-Chuva Azul, curta que antecedeu as exibições de Universidade Monstros, Lava se sai muito pior à história de amor entre guarda-chuvas por querer criar algo dez vezes mais meloso. A Pixar já provou que sabe contar histórias sobre quaisquer tipos de objetos e seres, mas aqui demonstra que nem tudo pode se tornar interessante em suas mãos.

Nota: 3/10

Crítica: Divertida Mente

Imaginário torna-se realidade em novo filme da Pixar.

Por Pedro Strazza.

Assim como em todas as outras as artes, o cinema é feito de simbolismos. Em suas histórias, sejam estas as mais rasas ou as mais complexas, sempre se traz disfarçado por meio de situações e personagens uma carga interior, uma mensagem que os responsáveis pela obra cinematográfica buscam passar para seu público. É um processo que na maioria das vezes é realizado de maneira silenciosa, sendo desenvolvido no plano subjetivo para tornar esse processo de compreensão muito mais fácil e acessível para qualquer espectador.

No caso da Pixar, porém, o procedimento se faz ao contrário. A maioria dos contos infantis do estúdio (e de seus vários cineastas, em consequência) se fazem de uma simbologia física e propositalmente escancarada, sem medo de soarem fáceis por saberem que a representação não precisa se limitar ao abstrato para alcançar seus objetivos. Caso máximo dessa tendência adotada pela empresa é Divertida Mente, filme que leva ao limite do imaginável essa relação objeto-representação.

Porque se até então os filmes do estúdio haviam empregado ratos para representar a marginalização do indivíduo ou robôs para provar o prejudicial isolamento populacional, aqui o diretor e roteirista Pete Docter (responsável também por Up - Altas Aventuras e Monstros S.A.) se usa de uma efígie muito mais próxima do ser humano para abordar uma temática diretamente implícita a ela: seus sentimentos. Protagonistas do longa, as emoções da garota Riley (Kaitlyn Dias) são retratadas desde o início do longa como figuras reais, habitantes da consciência da menina de 11 anos com gostos, sonhos e objetivos pessoais - todos, claro, relacionados em prol da menina.

Dessa maneira, o espectador é com velocidade introduzido a dois planos de trama em Divertida Mente. No primeiro, ele acompanha o cotidiano de Riley, cuja rotina é virada de cabeça para baixo quando seus pais (Diane Lane e Kyle MacLachlan) se mudam com ela do estado de Minnesota para a cidade de São Francisco; no segundo, o das emoções da garota, que liderados por Alegria (Amy Poehler) controlam suas reações ao mundo em uma sala de controle visando o melhor para ela e precisam agora auxiliar a garota nesse processo de adaptação. Mas quando Tristeza (Phyllis Smith) e a própria Alegria acabam fora da central após uma sucessão incomum de eventos, torna-se vital que as duas voltem para seus lugares antes que a menina cometa um erro sem volta sob o controle de Raiva (Lewis Black), Nojinho (Mindy Kaling) e Medo (Bill Hader).

Adotando do princípio essa estrutura narrativa, o longa passa então a construir a personagem de Riley, que passa por um arco universal a todos os seres humanos. A aceitação da mudança, transfigurada na trama em seu formato mais literal possível, é também usado por Docter em conjunto dos roteiristas Meg LeFauve e Josh Cooley como metáfora da própria passagem do tempo e da entrada na puberdade, sendo realizados com transparência ao longo da história e sem maiores complexidades.

O caráter simples de tal ritual, porém, torna-se intricado quando se é abordado pelo ponto de vista da consciência de Riley, e é aí que o filme encontra sua genialidade. Antropomorfizadas, os sentimentos protagonizam crises e situações que de forma direta ou indireta circulam sobre o momento vivido pela menina, e com isso se transformam em figuras complexas fascinantes. Principalmente Alegria e Tristeza, personagens centrais que trazem em sua relação um profundo drama de aceitação (seja a do próximo ou a de si mesmo) que encontra perfeita sincronia com o tema do longa e das próprias produções da Pixar - para efeitos imediatos de comparação, um momento similar pode ser encontrado no flashback trágico vivido por Jessie em Toy Story 2.

E enquanto tudo isso se desenrola, o filme ainda encontra espaço suficiente para criar um universo extremamente criativo e colorido para povoar a mente de uma criança. Levando ao pé da letra conceitos da psicologia (a localização do subconsciente é um de meus preferidos), Divertida Mente concebe representações físicas para explicar diversos traços da cabeça do ser humano, e vai de concepções racionais a irracionais em um passo. Amigos imaginários, lembranças, sonhos... nada escapa aos olhos da produção, que ainda dá toques de humor em sua abordagem.

É justo nesta mistura que Divertida Mente se faz de fato. Dramático e cômico, simples e ao mesmo tempo complexo, o 15° longa-metragem da Pixar é uma confluência de ideias bem executadas e que conversam muito com as outras produções do estúdio, e juntas do tempero emocional certo fazem desta uma obra única. E que grande ironia, toda esta grandiosidade acontece na cabeça de uma menina de 11 anos de idade.

Nota: 10/10

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Crítica: Jurassic World - O Mundo dos Dinossauros

Reinício da franquia refaz os passos do original em tom de homenagem.

Por Pedro Strazza.

É preciso conhecer um pouco da história que se passa por trás da trama Jurassic Park e de suas duas primeiras sequências antes de buscar entender os erros e acertos de Jurassic World - O Mundo dos Dinossauros. Não apenas querendo traçar verossimilhanças com o filme de 1993 para reintroduzir a franquia às novas gerações, o quarto capítulo da série sobre dinossauros aposta na repetição da estrutura simbológica do consagrado longa baseado na obra de Michael Crichton, pois acredita que este é o único caminho possível para realizar os mesmos feitos do original.
Suas crenças não são infundadas. Ainda que seu sucesso imediato seja fruto de uma combinação de fatores, Jurassic Park marcou sua época por trazer em seu cerne uma discussão muito bem trabalhada sobre os riscos do avanço da humanidade, travestido na história sob a forma de um conto de deslumbramento com o horror. O retorno dos dinossauros ao planeta pelas mãos da ciência e seu uso para fins mesquinhos, afinal, trazem no fundo uma identificação natural com as descobertas da humanidade, e o posterior descontrole do parque para as forças naturais solidifica o teor da mensagem passada por Spielberg no filme - coisa que as duas continuações seguintes infelizmente não conseguiram levar adiante por estarem muito mais interessadas em dar prosseguimento à trama com ênfase no destino de seus personagens.
Consciente disso, Jurassic World segue pelo caminho mais óbvio: aproveitar de seu caráter de recomeço da série e traçar os mesmo caminhos do original. Estão lá os personagens símbolo e marcados pelo estereótipo, as reviravoltas de cunho de terror, a formação da família em meio ao caos... o longa dirigido por Colin Trevorrow - alguém que já provou saber fazer bem o arroz-feijão de gênero no fraco Sem Segurança Nenhuma - guia-se bastante na adaptação do livro de Crichton, e aqui e ali atualiza alguns de seus elementos mais temporais e insere mudanças com resultados distintos.
Na trama, o parque dos dinossauros finalmente foi aberto ao público e garantiu sucesso absoluto em seus primeiros anos de funcionamento. Atrás de novas maneiras de aumentar a renda e o interesse dos pagantes (agora muito mais acostumados com a presença dos animais), a equipe de pesquisa liderada pela administradora do parque Claire (Bryce Dallas Howard) e o doutor Henry Wu (B.D. Wong) criam o Indominus rex, primeiro dinossauro que é fruto da combinação genética de várias criaturas jurássicas. Mas o ser escapa de seu cativeiro, e começa a criar um rastro de destruição e morte por onde passa na ilha.
É logo nesse prenúncio que se percebe a principal adição feita por Trevorrow à franquia. Agora, além de servirem como símbolo das forças naturais, os dinossauros também são representação do próprio ser humano na figura do grande e letal antagonista, que por onde passa só gera a matança e a perturbação na ordem natural das coisas. A alegoria é básica, mas funciona no roteiro escrito a quatro mãos, que consegue conduzir seu crescimento até um explosivo e extremamente satisfatório clímax no terceiro ato.
Mas se nas atrações há novidades, nos humanos as regras do primeiro longa prevalecem. Culpa em parte da própria estratégia de repetição, Jurassic World não se arrisca em trazer novos temas em seus personagens, que se bastam em refazer as discussões do filme de 93 e cumprir seus papéis representativos, seja este o do olhar infantil sobre a criação ou do poder destrutivo da cobiça. As únicas mudanças que o diretor faz aqui são circunstanciais, como denotar mais a quebra da família nos tempos modernos (os pais das crianças estão se separando), dar força masculinizante de liderança ao teorista do caos - o Owen Grady de Chris Pratt é no fundo uma repetição do Ian Malcolm de Jeff Goldblum - ou mudar o gênero do personagem em fuga de seu relógio biológico - algo que se com um homem passava pouco desapercebido, com uma mulher definitivamente emite um machismo involuntário.
De resto, Jurassic World é um filme bastante reverencialista, inserindo desde a fotografia aos cenários os mais variados tipos referências à franquia e seus elementos mais marcantes - Pessoalmente, o que mais interessou foi a presença do livro de Malcolm na mesa do personagem de Jake Johnson. Uma atitude honesta, vale dizer, já que estar consciente da importância do original e respeitar suas fundações é um bom começo para quem busca o reinício da franquia como uma criança em visita às ruínas de um parque abandonado pelo tempo.

Nota: 8/10

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Crítica: A Espiã que Sabia de Menos

Filme questiona machismo sem esquecer de divertir.

Por Pedro Strazza.

O humor funciona muito bem como elemento questionador de valores presentes nas histórias mais tradicionais, e os filmes de espionagem parecem ter voltado com tudo à pauta deste processo de desconstrução. Depois de Kingsman realizar sua homenagem paródica aos clássicos, é a vez de Paul Feig empregar a sua filosofia do "girl power da chacota" para demolir de vez em A Espiã que Sabia de Menos os pilares que sustentam o mundo dos espiões cinematográficos.

Mas enquanto o longa de Matthew Vaughn se basta em reverenciar com um sorriso o espião do passado, Feig não demonstra o mesmo respeito e vai na jugular do machismo inerente a essas histórias, característica presente no subgênero desde sua gênese. Nas aventuras vividas por James Bond e outros agentes secretos, afinal, há uma glorificação quase exagerada da figura masculina e uma consequente depreciação da feminina, relegada quase sempre à posição de bela secretária ou interesse amoroso superficial.

Assim, não chega a ser surpresa que A Espiã que Sabia de Menos apresente como protagonista uma antítese desse perfil, a pouco atraente e invisível Susan Cooper (Melissa McCarthy). Agente da CIA que trabalha atrás das mesas, ela cumpre sua função de "olhos e ouvidos" do galante e bem sucedido espião Bradley Fine (Jude Law) quase de maneira submissa, auxiliando-o em suas missões e resolvendo seus problemas domésticos sem pedir nada em troca. Mas quando Fine é morto na tentativa de resgate de uma ogiva nuclear e nenhum agente de campo pode cumprir a tarefa, é Cooper que assume o trabalho e sai de sua condição de inexistência para salvar o dia, tendo que enfrentar na mesma medida perigosos criminosos e a resistência de seus colegas.

É justamente desse choque com o sistema que o filme tira o humor da produção. Dos combates e perseguições às humilhações vividas por Susan, o longa usa do arco de crescimento vivido pela personagem para debochar das presunções do subgênero e da própria sociedade, retratando como imbecis rasos os agentes idealizados - papéis de Law e Jason Statham, este último acertadamente caricato para compor seu herói das lendas nunca vistas - e passando o protagonismo verdadeiro às mulheres. E essa mudança de papéis não é feita sem o prazer da descoberta, como bem indica as sucessivas surpresas do tipo "Uau, eu também posso fazer isso?" que as personagens femininas de McCarthy, Mirand Hart e Rose Byrne descobrem ao longo da história.

A comédia que o diretor e roteirista propõe fazer, porém, encontra problemas na própria escatologia. Ainda que esteja controlado, o humor gráfico de Feig ainda não encaixa como deveria na sua proposta, e soa por vezes artificial na sua execução - especialmente nos combates, onde surge para encerrar a cena apenas para dar maior ênfase cômica às situações apresentadas.

Nos dois primeiros trabalhos de sua parceria (Missão Madrinha de Casamento e As Bem Armadas), Feig e McCarthy ainda não entendiam muito bem como alinhar a sua história de viés feminista com a comédia por equivocadamente acreditar que o humor de tipos - o gordo é engraçado pela sua fisiologia, a mulher solteira é ranzinza, etc. - seria o caminho certo. Em A Espiã que Sabia de Menos, a dupla parece ter achado um rumo mais certo, pois encontra no subgênero ao qual ri tão descaradamente um material mais amplo e espaçoso para trabalhar sua questionadora inversão de gêneros, sem esquecer de entregar um bom entretenimento no processo.

Nota: 7/10

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Não Perda!: Maio/2015

Homens detestáveis, ganhadores de festivais curiosos e peixes fora d'água na praça.

Por Pedro Strazza.

O mês acabou, e está na hora de ver aqueles lançamentos legais que ninguém viu porque "Não deu tempo..." ou "Não quis arriscar minha grana suada com isso!"... mas deveria ter visto. No Não Perda! de maio de 2015, também conhecido como "O mês que nos fez amar Mad Max - Estrada da Fúria", temos:

  • Cala a Boca Philip

Acompanhar personagens detestáveis em filmes não é uma tarefa fácil, mas pode trazer recompensas extremamente prazerosas, e este Cala a Boca Philip se faz como prova contundente desta afirmação. O novo longa do diretor Alex Ross Perry, ainda um cineasta a ser descoberto, trabalha com a figura detestável de Philip, um escritor que nas vésperas de publicação de seu segundo livro resolve realizar algumas mudanças em sua vida. Mas os efeitos dessas decisões, assim como a própria trajetória do protagonista na história, não são exploradas na maioria do tempo pelo seu ponto de vista e sim pelo das pessoas que o cercam, abrindo espaço para que Ross Perry trabalhe o egoísmo de nossas relações com maiores possibilidades.  

Filme de Segunda Guerra Mundial brasileiro, A Estrada 47 é um filme que encanta por dois caminhos. No primeiro, temos a inevitável recriação histórica, que apresenta ao espectador a participação brasileira no conflito armado; no segundo, mérito do diretor Vicente Ferraz, é o questionamento da entrada do país em uma guerra que não lhe diz nome, ressaltando a própria incoerência dos pracinhas em um território tão distinto. Existe uma previsibilidade em meio a isso, mas nada que prejudique a força de uma produção tão bem cuidada.

  • Últimas Conversas

Eduardo Coutinho foi um dos maiores documentaristas da História do cinema brasileiro, e estava trabalhando em um novo filme quando faleceu no início de 2014. A obra inacabada, lançada pouco mais de um ano depois de sua morte, é uma série de entrevistas feitas com jovens estudantes cariocas de classe C e D, que entre outras coisa contam a Coutinho suas duras histórias de vida, seus maiores medos e sonhos. É um choque duro de realidade que Últimas Conversas proporciona a seu espectador, e serve como mais um atestado da genialidade de um homem que partiu de maneira tão abrupta.

Vencedor do Leão de Ouro no Festival de Veneza de 2014, o novo filme do sueco Roy Andersson continua a desenvolver o peculiar método de humor de seu cineasta. Questões existencialistas se delineiam na sucessão de esquetes apresentados, que filmados de maneira quase teatral pelo diretor apresentam situações inusitadas e divertidas por essência. É um filme que nos faz pensar, mesmo que do jeito menos normal o possível.

Se Andersson reflete rindo, o turco Nuri Bilge Ceylan o faz de maneira mais tradicional. Com longas e arrastadas três horas de duração, o vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes em 2014 é uma análise de um personagem pouco amável, um depressivo dono de um hotel localizado na fria Anatólia. No inverno rigoroso, ele enfrenta algumas situações difíceis, que vão dos negócios ao próprio casamento infeliz. E nos longos diálogos travados para salvar sua situação atual, ele submete o espectador a uma dura noção de uma realidade complicada que a humanidade, seja nas regiões mais inóspitas do mundo, é obrigado a encarar.

Não Perda Também!: Fevereiro - Março - Abril

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Crítica: Trocando os Pés

Conto fantástico fracassa sobre indecisão entre comédia e drama.

Por Pedro Strazza.

Mesmo que tenha sido vendido desde o início como mais uma das comédias indies que Adam Sandler protagoniza ora ou outra, Trocando os Pés acaba por se assemelhar mais com um trabalho típico da Happy Madison Productions do ator. O humor raso e pouco eficaz de tais produções certamente está ausente no longa escrito e dirigido por Thomas McCarthy, mas de resto tudo soa a comédias como Um Faz de Conta que Acontece ou Click.
Na trama, Sandler vive Max, dono de uma pequena sapataria em Nova York que está insatisfeito com a vida que leva. Obrigado a assumir o negócio da família desde jovem por causa do desaparecimento do pai (ele é a quarta geração, lembra em conversas), o sapateiro diariamente precisa lidar com os calçados e desaforos de outros para cuidar de sua mãe doente (Lynn Cohen) e manter de pé o estabelecimento. Um dia, porém, Max descobre no porão uma máquina de costura que dá aos sapatos remendados por ela a capacidade de assumir a identidade do dono por quem calçá-los, e começa a usar em seu favor o poder mágico que tem em mãos.
A base de realismo fantástico tem potencial, mas não chega a ser alcançada de fato em nenhum ponto do filme. Isso porque Trocando os Pés várias vezes mostra indecisão entre qual caminho narrativo seguir, e por fim segue por nenhum: Enquanto o drama cotidiano encarado pelo protagonista e aqueles que o cercam ganha aprofundamentos em questões mais imediatas (o último desejo, a derrota dos malvados) e nunca chega a grandes questionamentos, o lado mais cômico se mostra contido como a atuação de Sandler, ganhando destaque somente nas transformações de caráter vivida pelas pessoas que Max se passa por - mérito talvez exclusivo da atuação de Method Man, único que tem a chance de mostrar os dois perfis na película.
Para piorar, há na produção a questão do moralismo, tema que persegue Sandler mesmo em seus trabalhos mais "autorais" e cujo peso interfere demais na fluidez da narrativa estabelecida por McCarthy. Embora seja um filme sobre aceitar o papel imposto pela sociedade, contribuir com a sociedade e viver da melhor maneira possível com as condições apresentadas, o longa se delonga demais no tema por meio dos coadjuvantes, insistindo em se repetir por personagens como Jimmy (Steve Buscemi) e Carmen (Melonie Diaz). Tal estratégia faz a história ser contada num ritmo arrastado, prejudicial ao conto fantástico ao qual se propõe a realizar.
E se não fosse o bastante toda a estrutura frágil elaborada, esta ainda se fragmenta no péssimo terceiro ato, que abandona a lógica desenvolvida para trazer personagens e situações inadequadas por completo à trama do filme. Assim, o real fantástico torna-se irreal para o espectador quando este é obrigado a assistir um arco de redenção mal elaborado e recheado de vigilantismo, feito à base de revelações e reviravoltas sem sentido como a real identidade de certos personagens, golpes muito mal explicados e até uma sociedade secreta presente desde o início dos tempos - mas não do filme.
Com alguns bons momentos aqui e ali para tentar compensar todos os erros cometidos, Trocando os Pés é um desperdício de uma boa ideia por infelizmente não saber o que fazer com esta. Sua execução, entretanto, não é péssima o suficiente para despertar o ódio do público, mas tão pouco é razoável para tornar sua experiência minimamente interessante, tornando sua passagem nula para quem quer que opte por vê-lo.

Nota: 4/10