domingo, 22 de fevereiro de 2015

Crítica: Um Santo Vizinho

Bom elenco salva narrativa mal estruturada.

Por Pedro Strazza.


Um Santo Vizinho é um filme um tanto quanto indeciso. Embora possua em grande parte de seu primeiro ato uma forte tendência ao humor ao apresentar o protagonista, seu miolo e encerramento pouco procuram cair para o lado cômico e até chegam a tocar em dramas sérios do cotidiano. É quase uma colagem de duas histórias completamente diferentes, como se o diretor Theodore Melfi quisesse fazer de sua estréia em longa-metragens uma compilação de dois curtas distintos, mas que usam dos mesmos personagens - que de maneira óbvia atuam somente em cima de um principal.

O protagonista, nesse caso, é Vincent (Bill Murray), um senhor idoso ranzinza que tem uma vida de limites. Atolado em contas e devedores para pagar, ele passa os dias bebendo no bar, transando com a prostituta Daka (Naomi Watts) e apostando em corridas de cavalo. Mas essa sua rotina autodestrutiva muda quando a mãe solteira Maggie (Melissa McCarthy) torna-se seu vizinho e logo o encarrega de cuidar do filho Oliver (Jaeden Lieberher). E assim como em todo filme indie do gênero, a relação entre a criança e o idoso afetará ambos, alterando suas pessoas aos poucos e etc.

É essa previsibilidade da trama que afeta bastante os rumos do longa. Embora tenha escrito um roteiro que aos poucos revela uma carga dramática interessante, em nenhum momento Melfi parece perceber o tom progressivamente mais pesado de sua história ou consegue esconder do espectador a sensação de auto-ajuda, e com isso a narrativa em pouco tempo torna-se instável e um tanto arrastada. Não bastasse isso, Melfi ainda sofre de uma síndrome de inconstância: se em determinadas passagens ele flerta com o drama de seus personagens para construí-los, em outras ele prefere manter o máximo de superficialidade possível.

Mas se o diretor comanda o roteiro sem muita mão, com os atores e atrizes à disposição ele age muito bem. Muito bem escalado por Laura Rosenthal e formado em sua maioria por astros da comédia (além de Murray e McCarthy há também Chris O'Dowd como o padre Geraghty), o elenco fornece a seus personagens uma sensação interessante de decadência, que contribui de forma decisiva para compor a visão dos EUA pós-crise de 2008 oferecida pelo filme. A predominância de comediantes, inclusive, é vital para construir esse lado pessimista da produção, pois cria no espectador a sensação de que aqueles personagens já foram mais felizes e que agora estão condenados à uma dura e nada esperançosa realidade.

O grande destaque do elenco, porém, fica mesmo para Murray, que sendo o único a possuir um papel mais profundo consegue fazer de seu Vincent um ser multifacetado e atraente ao público na sua rabugice. Tão feliz na interpretação são também o estreante Lieberher, capaz de escapar da obviedade para elaborar um Oliver pautado no resultado das rusgas entre sua mãe e pai no passado, e Watts, que em alguns instantes consegue trazer algum destaque para a prostituta Daka por meio do humor.

Apesar dos erros graves em sua estrutura e em seu roteiro, Um Santo Vizinho é capaz de em alguns momentos escapar da auto-sabotagem de seu diretor e entregar cenas interessantes, geradas por boas atuações de um casting muito bem construído. Se estivesse em mãos melhores, é muito provável que o filme teria obtido maior sucesso e visibilidade que o atingido.

Nota: 5/10

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