sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Crítica: Jogos Vorazes - A Esperança - Parte 1

Narrativa é prejudicada pela ausência do 3° ato, mas tem na protagonista o calor necessário

Por Pedro Strazza

A divisão do capítulo de uma franquia em duas partes é ainda uma estratégia recente em Hollywood, e portanto tem os benefícios e malefícios de seu uso muito evidenciados. Por um lado, a quebra da história em dois filmes em teoria permite que a produção consiga alcançar um maior detalhamento dos acontecimentos mostrados e traz aos cofres o dobro do lucro original; por outro, ela facilmente quebra todo o ritmo da trama se esta for baseada em um material único com três atos bem definidos, como um livro. Em planos gerais, a medida agrada fãs e produtores, mas pode não ser eficaz para o público geral - e os últimos dois filmes da franquia Harry Potter, o grande criador desta tendência, são exemplos claros disso.
Mas a metodologia pegou no mercado, e agora todos os estúdios querem aplicá-la a suas séries cinematográficas de maior sucesso. A mais nova a seguir essa nova moda do mercado é Jogos Vorazes, a franquia adolescente do momento, que para a alegria de sua imensa legião de admiradores optou por dividir a adaptação de seu último livro base, A Esperança, em duas partes. E com tanto tempo para desenvolver os acontecimentos da história, a equipe dirigida por Francis Lawrence optou nesta primeira metade por focar em seus personagens e prepará-los para o grande conflito, que será mostrado apenas no próximo e último filme.
Dessa forma, A Esperança - Parte 1 concentra suas atenções em Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) e os rebeldes, que lutam para derrubar a Capital e seu opressivo sistema do medo. A protagonista, inclusive, sofre aqui com problemas muito mais sérios e políticos que nos dois primeiros capítulos, mesmo não precisando mais participar de uma competição perigosa e letal: involuntariamente o grande símbolo da resistência ao governo, ela busca no longa apenas salvar seu grande amor Peeta (Josh Hutcherson) das garras do presidente Snow (Donald Sutherland), e para isso contará com a ajuda dos "radicais" liderados pela presidente Coin (Julianne Moore).
O macguffin que guia os personagens, assim, é a busca pelo companheiro de Katniss, mas o tema a ser tratado pelo filme é a guerra, algo muito claro na mudança radical do design da produção. O cenário colorido e repleto de extravagâncias dos dois primeiros longas dá lugar à sobriedade e à paleta fria de cores, e os dois lados lidam com um verdadeiro conflito de propaganda para convencer a população a juntar-se à sua posição. Nesse quesito, os rebeldes e a Capital respectivamente dependem muito da protagonista e seu amado, queridos pela sociedade graças à sua participação nos Jogos, e o roteiro de Peter Craig e Danny Strong faz questão de evidenciar a importância do casal no confronto por meio das peças publicitárias filmadas ao longo da trama.
A maneira como Craig e Strong realizam esse processo, porém, peca ao querer subjugar a briga a um maniqueísmo irreal, tornando a primeira parte em uma verdadeira batalha de mocinhos e bandidos. A dualidade da presidente Coin e de Plutarch Heavensbee (Philip Seymour Hoffman), por exemplo, é escondida como possível para facilitar a aproximação do espectador com esse núcleo, mas falha por ser desnecessária (o público, afinal, segue apenas a protagonista) e não conseguir ocultar da liderança dos rebeldes os mecanismos pelo qual guia seus aliados, idênticos aos usados pela Capital. Esta semelhança só é mencionada de maneira subjetiva no final, e já aponta que ela será um dos grandes temas do quarto capítulo.
Enquanto isso, A Esperança - Parte 1 sofre com o ritmo arrastado, decorrente da divisão da adaptação da obra em dois. Sem um terceiro ato para apresentar, a trama do longa se demora em sequências e diálogos expositivos, criando gorduras que poderiam ser resolvidas com maior velocidade e sem a necessidade de detalhes maiores, como o drama vivido por Finnick (Sam Claflin) ou o aprofundamento na personalidade de Snow, já bem esclarecido nos dois primeiros capítulos como antagonista de Katniss. Essas gorduras, claro, agradam os fãs mais apaixonados, mas soam dispersos e poderiam ter sido limados na montagem.
A lentidão dos acontecimentos, entretanto, é eficaz quando se aborda a protagonista e seu drama pessoal. Em meio a um conflito de interesses pesado, Katniss é mostrada no filme como uma peça importante do tabuleiro político, mas também como uma pessoa, vítima dos caminhos tomados e interessada somente no destino daqueles que ama, e ela demonstra essas duas faces em cenas como em que sai da segurança para salvar sua irmã Prim (Willow Shields) ou na sua passagem por um hospital repleto de feridos.
Contando também com atuações muito bem trabalhadas de todo o seu extenso elenco, Jogos Vorazes - A Esperança - Parte 1 sofre de problemas muito graves em sua estrutura narrativa, escolhida por uma causa financeira. A maneira como trabalha sua protagonista e o cenário que a cerca, porém, oferecem um respiro muito bem vindo na enrolação proporcionada. Falta o calor e ritmo vistos em Em Chamas, mas dá para se entreter na guerra e na preparação desta para seu iminente clímax.

Nota: 7/10

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