Convoque Seu Buda marca a entrada de Criolo na música brasileira
Por Vinícius Lima
Criolo é de outro planeta. Não que ele seja uma espécie
de alienígena do rap nacional, mas ele é gênio, e sua cabeça compõe letras
que estão anos luz na nossa frente. Desde seu primeiro CD, o “Ainda Há Tempo”,
produzido sem recurso algum, o reconhecido “Nó Na Orelha”, que o revelou para
fora do Grajaú com a produção ilustríssima de Daniel Ganjaman e Marcelo Cabral,
e agora com seu mais novo disco, o “Convoque Seu Buda”, que conta com a mesma
produção.
Se você ouvir o novo CD do
Criolo de maneira descompromissada no ônibus ou na linha vermelha lotada, as
letras como “Cartão De Visita”, “Esquiva Da Esgrima”, “Fermento Pra Massa” e
“Pegue Pra Ela” soarão simples e superficiais, porém suas linhas e suas
palavras carregam um duplo sentido crítico, digno de ser comparado a qualquer
letra de um Chico Buarque ou Milton Nascimento na época da ditadura militar.
Criolo usa e abusa de suas referências diversas como Sabotage, Ogi, Black
Alien, Nietzsche, Ferréz e Perrenoud para fazer críticas a violência e
preconceito como em “Esquiva Da Esgrima”; cita os podres da classe média
camuflado numa batida animada e num refrão com a linda voz de Tulipa Ruiz
dizendo “parcela no cartão essa gente indigesta”; em Fermento pra Massa, num
samba Criolo, explicou como a população é apenas massa de manobra do governo,
fazendo comparação a uma padaria; e pra fechar as letras que mais me chamaram
atenção, em “Pegue Pra Ela”, Criolo faz uma forte critica a indústria cultural
que domina e molda os artistas em padrões para o lucro das empresas de
comunicação e de eventos, como se pode ver em frases como “toda indústria tem
no comércio o seu ponto de reprodução” ou “toda cultura vira comércio, é o ponto
de degradação.”.
Criolo não revolucionou em seu novo trabalho, e sim apenas o reformou. Mas fez uma bela reforma. Manteve a mesma formula do último CD “Nó Na
Orelha” (talvez pela mesma produção de Ganjaman e Cabral), com alternância de
estilos, samba, rap, rock; o que não é ruim, apenas um comentário. Talvez seja essa sua marca como artista. Nesse álbum, porém, ele convida artistas talentosíssimos para também compartilhar essa alegria com ele: Kiku Dinnuci, Rodrigo Campos e a já citada Tulipa Ruiz nos arranjos, Juçara Marçal e o próximo gênio do RAP
nacional, Neto (guardem esse nome) do Síntese.
Enfim, Criolo mostra nesse
CD um amadurecimento musical enorme e não acho exagerado dizer que talvez seja
o seu mergulho na história da música brasileira ao lado de grandes mestres.
Assim como Emicida em “O Glorioso Retorno De Quem Nunca Esteve Aqui”, creio que
Criolo com “Convoque Seu Buda”, quis dizer “não sou só rapper, não sei só fazer
rima em batida eletrônica, sou artista, e o rap é arte sim.”.
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