quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Crítica: O Lobo de Wall Street

A loucura proporcionada pelo dinheiro, na visão de Martin Scorsese

Por Pedro Strazza

Logo nos primeiros minutos de filme, Jordan Belfort (Leonardo DiCaprio) se apresenta ao público dizendo que, no ano de seu 26° aniversário, ele fez 49 milhões de dólares com sua própria firma. Ele lamenta por isso em seguida, justificando sua insatisfação com o fato de "só" ter ganho em média cerca de 3 milhões por semana.
A quebra da quarta parede e a arrogância de Belfort com seu espectador são uma pequena amostra inicial da história que Martin Scorsese conta a seu espectador em O Lobo de Wall Street. Bastante conhecido por seus filmes de máfia, o diretor mais uma vez explora o mundo da criminalidade, só que agora pelo ponto de vista do perigoso mundo financeiro, baseando-se no livro auto-biográfico de Jordan. E ao longo de três horas, Scosese acompanha e explora a ascensão e queda de Belfort nesse universo, mostrando desde seus problemas matrimonias com suas duas esposas - a cabeleireira Teresa (Cristin Milioti), nos tempos mais pobres, e a modelo Naomi (Margot Robbie), nos mais ricos e luxuriosos - aos exageros e absurdos que ocorrem dentro sua firma, sejam estas nas festas ou no próprio dia-a-dia.
Esses momentos de "êxtase total" na empresa são os momentos mais controversos da produção. Regradas a álcool, drogas e muito dinheiro, os exageros tomados por Belfort e seus empregados tem sido bastante criticados por algumas pessoas por, teoricamente, "glamorizar" a conduta desses personagens e tornar estes ideais a serem seguidos. O objetivo de Scorsese, entretanto, é outro, e eis que sua genialidade entra em cena: Ao invés de condenar claramente as atitudes tomadas por esse grupo, o diretor prefere testemunhar suas ações ao máximo, subindo uma trilha sonora agitada e ressaltando as cores do ambiente, para evidenciar a loucura ali apresentada. E não demora muito para o público começar a rir daquelas situações, que chegam muitas vezes no nível do ridículo. Quando uma secretária se sujeita a perder todo o cabelo em troca de alguns milhares de dólares, por exemplo, a câmera foca não no show que se desenrola depois do escapelamento, mas sim na própria, que sai humilhada e despercebida do recinto - claro, com o dinheiro na mão.
A personalidade de Belfort é a que mais se encaixa nessa tendência. Inicialmente um jovem esforçado e sedento por dinheiro e sucesso (visando, claro, melhorar sua condição financeira), Jordan rapidamente se corrompe ao adentrar nesse mundo de loucura e pura especulação, tornando-se um viciado em diversas drogas e constantemente alcoolizado. E quanto mais riquezas e vitórias ele acumula, mais vazio e patético se torna, chegando a momentos de pura auto-humilhação.
Essa mudança que ocorre no interior do corretor - interpretado magnificamente por DiCaprio - é clara quando observamos sua relação com as duas mulheres de sua vida, ambas muito bem trabalhadas por Milioti e Robbie. Quando Jordan é casado com Teresa, em sua fase de crescimento financeiro, vemos ali um amor afetivo e honesto, apesar das constantes traições carnais dele; Por outro lado, o amor de Belfort por Naomi é puramente sexual - viciante como uma droga, segundo o próprio -, e suas "puladas de cerca" acabam por se nivelar com o relacionamento do protagonista em termos de prazer e importância, mesmo que este insista em os diferenciar.
E Jordan não é o único a enlouquecer por completo nesse mundo, pois todos que o acompanham se sujeitam ao mesmo processo depreciativo. Principalmente Donnie (Jonah Hill), seu fiel escudeiro que, já transtornado, enlouquece por completo com as várias possibilidades e poderes oferecidos pelo dinheiro. A sua discussão com Brad no estacionamento é o maior exemplo disso, pois Donnie prefere humilhar o cúmplice por não ter entendido sua brincadeira - tarefa esta fácil para Hill, que vem das comédias adultas para dar um show de atuação.
Tudo isso é culpa, claro, do dinheiro, o maior de todos os vícios segundo Jordan. Capaz de enlouquecer homens, as "verdinhas" são constantemente o motor da trama, guiando Belfort e seus camaradas pelos mais diversos caminhos da falta de razão e pagando todas as suas aventuras. E como estes não possuem a maturidade para pararem, não demora muito para o dinheiro começar a traí-los.
Mas, ao contrário dos gangsteres de Os Bons Companheiros ou Os Infiltrados, não há um final de derrota para os homens do colarinho branco. Eles são muito poderosos para isso, e não coisa material que o dinheiro não possa comprar. Por isso, não é estranha a cena em que o agente Denham (Kyle Chandler, bastante competente), voltando para casa, contempla o vagão do metrô onde está com um certo ar de abatimento, pois seus inimigos, apesar de derrotados, sobreviveram e desfrutam dos mais belos prazeres da vida, porém não com a mesma intensidade prévia.
Com personagens desmedidos de bom-senso e uma direcionamento bem feito, O Lobo de Wall Street é interessante retrato da loucura e ambição, testemunhando sem julgamentos o destino de uma pessoa vazia que, com a ajuda de um bem material, vive de excessos e luxúria. O verdadeiro amor de Belfort é, afinal, pelo dinheiro, e nada o faz parar para ficar com ele.
Nota: 10/10

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