sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Crítica: Mistress America

Noah Baumbach realiza a obra mais debochada de si mesmo.

Por Pedro Strazza.

Tornou-se um hábito meio enfadonho dos filmes de Noah Baumbach que sua temática principal seja sobre jovens adultos que resistem a todo custo ao amadurecimento. Essa refusa em aceitar a vida adulta, acompanhado de um tom de inevitabilidade em obras como Frances Ha e (principalmente) Enquanto Somos Jovens, ocorre sempre em personagens pertencentes à geração Y, cuja adolescência já passou e sofre agora com os efeitos da tão temida crise dos 30 anos. Em Mistress America, porém, Baumbach e sua parceira, roteirista e atriz Greta Gerwig deixam de realizar a refusa em crescer para abraçá-la e começar a batalhar por ela.
É uma mudança simples e pouco perceptível, mas que faz toda a diferença no longa. Em um primeiro momento, ele permite que a história sobre irmãs torne seus personagens mais humanos e não se entregue a pessimismos artificiais; mas mais pra frente, ele abre espaço para o diretor fazer o exercício da autocrítica, em lances de sarcasmo com seus trabalhos anteriores. E se existe algo que funciona em qualquer situação no cinema, este é o rir de si mesmo.
Na trama, acompanhamos Tracy (Lola Kirke), uma caloura universitária que certo dia fica sabendo que "ganhará" uma irmã graças à sua mãe (Kathryn Erbe), prestes a se casar pela segunda vez. Querendo saber mais sobre sua nova mana, ela marca um encontro com a moça que revela ser Brooke (Gerwig), uma jovem adulta em busca de estabilidade na vida e que tenta no momento abrir um restaurante em Nova York. Rapidamente amigas, Tracy começa então a acompanhar e escrever sobre os esforços da irmã em realizar seu sonho, com todo o tipo de julgamento comum nessa idade da vida.
De certa forma, Mistress America ainda é um típico filme de Baumbach, mas com elementos pequenos que alteram todo o seu modus operandi. Os jovens hipsters responsáveis pelo núcleo central da história, por exemplo, ainda encontram no coming of age o principal dilema de suas vidas, mas já o encaram com maior otimismo. Os diálogos dos personagens vividos por Matthew Shear e Jasmine Cephas Jones com o grupo de mulheres grávidas de Mamie-Claire (Heather Lind), exercidos em segundo plano na narrativa, são a prova definitiva disso: por mais que continuem infantilizados e resistentes às tarefas da fase adulta ("Essas grávidas são inteligentes" exclama Shear, quase como se sentisse em outro mundo), o casal não exibe na relação com a gravidez a repulsa que a protagonista de Frances Ha tinha com o trabalho, e até dão leves indícios de assumirem esse papel.
O mais curioso do roteiro de Baumbach e Gerwig, entretanto, é eles tirarem dessa positividade uma verdadeira piada com sua visão anterior sobre o tema. A protagonista Tracy, que escreve sobre a irmã com toda a idolatria possível (o título de seu conto, o mesmo do filme, é uma alusão direta à sua reverência) e representa o pessimismo juvenil com o crescer, vira motivo de chacota dos amigos e da própria Brooke ao ter seu trabalho lido, justamente por neste ato de adoração ela fazer mais críticas que elogios. E é aí que a dupla brinca com seus próprios clichês em clima de socos diretos, sem contudo chegar a um verdadeiro ápice para toda a estrutura satírica.
Mistress America vem sido recebido pelos fãs do diretor com menos entusiasmo que Frances Ha e com surpresa pelas pessoas antipáticas a seu trabalho em geral. É um reflexo direto dessa propensão auto satírica da obra e de seu realizador, que mostra sinais de abandono em relação ao fatalismo da inevitabilidade do amadurecimento. Resta saber se este filme será considerado daqui a uns anos como de transição para a carreira de Baumbach ou apenas de reafirmação, uma pontualidade irônica a toda a sua trajetória até o momento.

Nota: 8/10

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