Comédia dramática problematiza menos e brinca mais com alienação progressiva da sociedade atual.
Por Pedro Strazza.
Esse evento sobrenatural, típico de obras como a do falecido José Saramago, é o pontapé inicial de Entre Abelhas, e sua falta de sentido é o que conduz a narrativa desenvolvida pelo diretor Ian Sbf, que assina ao lado de Porchat o roteiro do filme. É uma doença, uma consequência do stress, um defeito do cérebro? Nenhuma interpretação racional dos fatos consegue trazer para a realidade a condição de Fabio, que dia após dia vê menos a sociedade a seu redor e começa até a não enxergar mais amigos, parentes e pessoas próximas.
Usada sem maiores elaborações como crítica ao alienamento do ser humano nos tempos atuais, o mistério da "cegueira humana" é desenvolvida aos trancos na comédia dramática, sendo muito mais utilizada para fins cômicos que qualquer outra coisa. Explica-se assim a estrutura esquemática da produção, feita para facilitar a construção das cenas humorísticas encadeadas uma atrás da outra, e a sensação de incompletude criada no desfecho da história. Falta ao longa uma maior ambição, que não subestime o potencial de sua curiosa premissa e capaz de levá-la para caminhos inusitados ao espectador.
A sorte de Entre Abelhas é que quem o conduz seu humor, tanto pelo lado técnico quanto de atuação, tem experiência no assunto. Assim como em seus trabalhos no Porta dos Fundos, Ian e Porchat sabem bem como evitar o uso simples do exagero e do estereótipo típicos da comédia nacional, e emprega-os de maneira inteligente nas situações concebidas no filme. Exemplos claros disso são os personagens de Davi e Nildo (Luis Lobianco): Enquanto o primeiro diverte pela caricatural postura preconceituosa e não pelos impropérios que dispara, o atendente de pizza não é motivo de risos pela aparência ou a condição social (algo que com certeza seria usado em mãos menos cientes), mas pelas loucuras ao qual é obrigado a passar para ajudar a curar o protagonista.
Enquanto isso, Porchat encanta pela maneira sóbria com a qual interpreta Bruno. Muitas vezes exagerado nas comédias que participa, aqui o humorista faz um personagem de poucos sorrisos, sem esperanças nas mudanças abruptas ocorridas em pouco tempo e incapaz de perceber a existência do próximo, fisicamente ou emocionalmente. Sua participação cômica nunca é estourada, e depende quase sempre dos diálogos protagonizados.
No fim, não chega a ser surpresa que Entre Abelhas se revele uma simples história de amor. Com poucas pretensões no tema que problematiza e muito mais interessado em questões de gênero cinematográfico, o filme frustra aqueles atrás de uma reflexão maior na trama contada por sua simplicidade, mas entretém o suficiente para que essa decepção passe tão desapercebida quanto a sociedade para o protagonista.
Nota: 6/10
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