Refilmagem funciona como entretenimento simples, mas não vai muito além disso.
Por Pedro Strazza.
O primeiro Poltergeist é um filme que conseguiu se destacar por um conjunto de fatores. Além da suposta maldição acontecida nos bastidores e de ser lançado praticamente no início da explosão dos blockbusters, o longa escrito e produzido por Steven Spielberg chama a atenção por realizar bem seu papel como comédia de horror e ao mesmo tempo fazer uma crítica severa ao "american way of life" e o cinema que tão bem o propagandeava nas telonas e telinhas. Do conto sobrenatural vivido pela família Freeling em um conjunto imobiliário em plena expansão, Spielberg e o diretor Tobe Hopper expõem ao espectador as diversas hipocrisias da América típica dos anos 50, que tentou retornar como modelo de consumo durante os mandatos do presidente Reagan nos anos 80.
A força criativa de Poltergeist, portanto, tem muita base no momento histórico vivido, cujas características são tão únicas a ponto de dificilmente serem repetidas. Dessa maneira, uma refilmagem do filme já sai perdendo em comparação com outras por ter de lidar com uma variável que não lhe ocorrerá, e logo tem que se fazer funcionar por outros caminhos.
Esse é o grande desafio do diretor Gil Kenan, que inicia a versão 2015 de O Fenômeno já distanciando seus protagonistas dos do longa de 1982 não só em suas identidades e perfis, mas também em sua situação econômica. Os Estados Unidos, afinal, ainda vivem os efeitos da crise econômica de 2008, e os Bowen são a típica representação da família afetada por ela: Temos o pai e a mãe desempregados (Sam Rockwell e Rosemarie DeWitt), a filha adolescente rebelde e apegada em tecnologia (Saxon Sharbino) e as crianças alheias a tudo ao seu redor (Kyle Catlett e Kennedi Clements). Todos em busca de um lugar que os abrigue durante os tempos difíceis, e que os força a se realocar no subúrbio destruído pela quebra do sistema imobiliário.
Não há então algum tipo de otimismo cego que cegue os personagens do mundo neste contexto tão pessimista, e isso esvazia a produção de qualquer conteúdo real. Quando o personagem de Rockwell olha pelo retrovisor do carro e vê um estacionamento abandonado às moscas, percebe-se em sua aparência todo o desencanto com os caminhos tomados em sua vida - e, consequentemente, pelos EUA até aquele ponto. E depois de estabelecer uma posição tão desesperançosa, a aparição dos fantasmas do passado, no original vitais para dar contraponto a todo o falso sentimento de segurança, não tem motivos para existir nesta nova versão, soando como mais um lembrete gratuito dessa época de recessão.
Sem o parâmetro social-econômico, resta então a esse novo Poltergeist se comportar como filme de gênero purista, e Kenan erra na mesma medida que acerta. Se por um lado o responsável pelo bom A Casa Monstro consegue equilibrar o humor com o suspense sem deixar transparecer demais um ou outro, sua abordagem de desenvolvimento de personagens soa limitada quando a faz apenas nos momentos cômicos da narrativa. Separar nitidamente o riso do susto em uma estrutura de comédia de horror é uma opção difícil de ser executada e exige muito da produção, coisa que Kenan não consegue alcançar de fato aqui.
Por outro lado, o diretor é feliz ao realçar na refilmagem o lado de entretenimento simples que o original tão bem carregava. Ainda que se repita demais no processo de viajar pela casa com a câmera, Kenan consegue arrancar das cenas de tensão sustos que facilmente se encaixariam nas atrações de terror de um parque de diversão decadente.
E no final é essa analogia que melhor descreve o novo Poltergeist. Embora esteja obviamente deslocado de seu tempo e não funcione tão bem como antes, ele consegue ainda entregar aqui e ali bons momentos para seus pagantes, desde que estes entrem conscientes de sua condição. O cheiro de mofo incomoda? Sim. As engrenagens poderiam servir de algum reparo? Claro. As atrações precisam ser substituídas? Com certeza.
Mas está tudo bem, desde que alguém se divirta no processo.
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