sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Crítica: Whiplash - Em Busca da Perfeição

Damien Chazelle questiona ensino e obsessão a partir do mundo do jazz.

Por Pedro Strazza.

Com diferentes níveis de intensidade no ser humano, "ser o melhor" é uma necessidade inexplicável. Destacar-se dos outros pelos próprios méritos, afinal, parte basicamente da mesquinharia de nosso ego, que presume seu indivíduo como algo diferenciado, superior àqueles que o cercam por causa de habilidades ou de um intelecto supostamente únicos e insubstituíveis. Para alcançar o topo, porém, se faz necessário não um "dom" ou uma "dádiva dos deuses", mas sim a prática e a disciplina, que combatem com todas as forças o problemático orgulho de nossos "Eu"s.

Mas o exercício regular também pode ser tão danoso quanto a soberba, e o diretor e roteirista Damien Chazelle busca mostrar este caminho em Whiplash - Em Busca da Perfeição, seu segundo trabalho na direção. O filme acompanha Andrew (Milles Teller), um jovem baterista que, estudante do principal conservatório do país, sonha em ser um dos maiores músicos de jazz da História. Para isso, ele com muito esforço consegue lugar na banda comandada pelo mítico maestro Fletcher (J.K. Simmons), responsável por criar grandes profissionais do ramo em suas aulas. Em menos de uma aula, entretanto, Andrew percebe da pior forma possível que o professor usa de métodos nada corretos para ensinar, e após seguidas humilhações ele entra em um ciclo auto-destrutivo de aprendizado para alcançar seus objetivos.

Desse momento em diante, a relação tumultuosa que se desenvolve entre mestre e aluno é filmada por Chazelle com tons de exagero. Dos cortes rápidos que destacam o uso dos instrumentos pelos músicos aos closes nervosos de câmera no rosto dos personagens, o diretor aos poucos concebe no ambiente uma espécie de campo de batalha musical, onde seus dois protagonistas batalham por diferentes motivos: Enquanto Andrew busca uma inalcançável aprovação de seu professor, Fletcher procura a todo custo levar ao limite seu aluno para tirar dele a genialidade vista somente em mestres como Charlie Parker ou Louis Armstrong. E conforme a trama avança, fica claro que essa disputa sem pé nem cabeça exercida pelos dois os levará à lugar nenhum...

[A partir daqui há leves SPOILERS sobre o filme. Leia por sua própria conta e risco.]

... Ou será que não? Ao final, o grande tema de Whiplash de fato é o do limite em que a prática faz bem ao estudante, e o longa oferece caminhos para as duas respostas possíveis. Se por um lado a metodologia de Fletcher acaba com a vida de Andrew e de outros alunos ao forçá-los a se dedicar exclusivamente à música, ela também parece ser a única capaz de transformar bons profissionais em excepcionais músicos e possíveis lendas, e seus pupilos reconhecem isso - e seria muito estranho se não reconhecessem, dado as torturas aos quais se submetem. Como bem afirma o maestro em determinado ponto, parece não haver palavras mais danosas ao trabalho de um músico que "bom trabalho", pois elas o inibem de se esforçar a ser melhor.

Questionamentos à parte, é interessante perceber como o filme evita facilidades e constrói seus personagens principais com profundidade. Enquanto Teller cria um Andrew que mesmo sendo o herói da narrativa possui um perfil social fragmentado e uma arrogância nada sutil - capaz até de terminar um relacionamento antes de seu início para poder se dedicar seus objetivos -, J.K. Simmons é feliz ao transformar seu Fletcher em um monstro feroz com leves toques de humanidade, importantes para tanto conferirem ao antagonista uma leve esfericidade não existente a outros tiranos do cinema (o Sargento Hartman de Nascido Para Matar ou até o J.J. Jameson interpretado pelo próprio Simmons na trilogia Homem-Aranha, por exemplo) quanto darem dúvidas ao espectador sobre suas reais intenções.

Prejudicado um pouco pelo mal uso de seus coadjuvantes (passam desapercebidos os companheiros de banda e o interesse romântico de Andrew, por exemplo), Whiplash - Em Busca da Perfeição é um retrato interessante e bem montado da obsessão que nos toma quando queremos ser aquele "algo a mais", e evidencia com propriedade a questão do ensino e seus objetivos. Chazelle realiza um ótimo trabalho na direção, e não há prova maior disso que o explosivo encerramento, capaz de refletir todos os temas do filme com pouquíssimas palavras.

Nota: 8/10

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