terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Crítica: O Hobbit - A Batalha dos Cinco Exércitos

Capítulo final evidencia tanto erros quanto acertos de toda a trilogia

Por Pedro Strazza

Há um tempo (mais exatamente no final dos anos 90), o cineasta George Lucas e sua Lucasfilm anunciaram que Star Wars enfim ganharia mais uma trilogia, passada antes dos eventos dos três primeiros filmes. A notícia atingiu o mundo de maneira brutal, e a grande legião de fãs foi assistir A Ameaça Fantasma com uma empolgação absurda, almejando ver na telona uma história de proporções similares aos longas dos anos 70/80. O resultado chocou: Além de trazer no primeiro capítulo uma trama simples, Lucas deixou claro no filme a preferência pelo arroubo visual que permearia a nova trilogia, investindo muito mais em cenários exuberantes e batalhas de impacto que em um roteiro de personagens e situações complexas.
De certa forma, a escolha tomada por Lucas lá atrás não é tão diferente da feita por Peter Jackson neste começo dos anos 2010 com O Hobbit. Responsável por adaptar com excelência a trilogia de livros O Senhor dos Anéis para a grande tela, Jackson resolveu dividir a história de 300 páginas em três filmes de mais de duas horas cada, visando na teoria acrescentar à aventura de Bilbo vários contos de J.R.R. Tolkien e conseguir maior arrecadação nas bilheterias para custear a sua mais nova e ambiciosa produção. Na prática, o que se viu em cena nos dois primeiros filmes foi uma dedicação homérica de tentar encantar mais pela ação que pelos eventos, um desbalanceamento claro do equilíbrio entre trama e espetáculo da primeira trilogia - algo irritante, óbvio, para fãs da franquia.
Mas se em Uma Jornada Inesperada e A Desolação de Smaug viu-se certo acanhamento do diretor nessa questão, em A Batalha dos Cinco Exércitos é evidente que ele enfim resolveu fazer da história apenas um espetáculo. Como bem indica no título, o terceiro capítulo de O Hobbit gira primordialmente em torno de um conflito gigantesco, gerado pela derrocada do dragão Smaug (Benedict Cumberbatch) e a questão de quem assumirá o comando da Montanha Solitária. Anões, humanos, elfos, orcs... todas as raças da Terra-Média estão envolvidas na disputa, e uma guerra de grandes dimensões se instaura no local.
E com tanto tempo disponível (são duas horas e vinte cinco minutos de duração), o que se vê na produção é justamente isso: um épico. Aliado à fotografia de Andrew Lesnie, bastante balanceada entre o deslumbramento dourado de Uma Jornada Inesperada e o clima sombrio de A Desolação de Smaug, e os efeitos visuais da sempre eficaz Weta Digital, Jackson enquadra a batalha e seus combatentes com precisão, e se utiliza de todo o seu aprendizado nos outros cinco filmes - o estilo de luta característico de cada facção, os planos aéreos, a ação em duas frentes - para gerar uma verdadeira exibição de cenas de grande porte. Não à toa, o que se vê no terceiro O Hobbit é uma sucessão de ações super-humanas semelhante à continuidade de um show, em que cada evento parece merecedor de aplausos.
O desenvolvimento da ação visual, porém, não esconde de A Batalha dos Cinco Exércitos os seus problemas graves na trama. O roteiro elaborado por Fran Walsh, Philippa Boyens, Guillermo Del Toro e Jackson parece não se incomodar mais em deixar mal explicado várias passagens e acontecimentos, e até deixa em aberto vários desfechos de personagens, como os de Tauriel (Evangeline Lilly) ou de Saruman (Christopher Lee), denotando clara dependência do longa na trilogia do Senhor dos Anéis - algo que novamente remete aos trabalhos de Lucas, cuja nova trilogia só funciona com os três Star Wars originais vistos. É evidente o erro de esticar o conto em três capítulos cinematográficos, pois mais do que nunca falta conteúdo em um filme baseado em uma obra de Tolkien.
Outro ponto grave na narrativa são os personagens, que além de aparecerem e desaparecerem ao bel-prazer da história - e alguns são incluídos sem qualquer necessidade, como é o caso de Alfrid (Ryan Gage) - são elaborados sem nenhum fundamento. Só observar, por exemplo, a trajetória final de Thorin (Richard Armitage), que varia seu humor sem qualquer motivo por causa da "doença do dragão" (outro ponto muito mal explicado e usado sem pretexto algum) e chega a absurdos como ir da alegria à raiva em um take. E sem essa substância, as boas atuações do vasto e primoroso elenco são bastante prejudicadas.
Com certa ironia, é curioso pensar que O Hobbit - A Batalha dos Cinco Exércitos reflete em seu conteúdo toda a trilogia elaborada por Peter Jackson nesses últimos três anos. É um trabalho visualmente arrebatador, com efeitos deslumbrantes e ação bastante eficiente, mas ao mesmo tempo possui um interior vazio, gerado por personagens mal desenvolvidos por um roteiro apoiado exclusivamente no emocional de uma trilogia, essa sim, brilhante. Para Jackson, assim como Lucas, vale muito mais no prelúdio um espetáculo impressionante que um filme bem trabalhado. Uma pena? Sim, claro.
Mas que é um baita de um espetáculo...

Nota: 9/10

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