domingo, 21 de setembro de 2014

Crítica: Um Milhão de Maneiras de Pegar na Pistola

Seth MacFarlane faz novos aprendizados em faroeste cômico

Por Pedro Strazza

Originário da televisão e de suas famosas séries animadas voltadas para adultos, Seth MacFarlane é um humorista que contraria em alguns pontos a lógica de humor estabelecida pelo mainstream da comédia estadunidense recente. Apesar de possuir o mesmo gosto pela autorreferência (MacFarlane, afinal, é um nerd convicto), o criador de Uma Família da Pesada prefere manter seu foco cômico na loucura da vida cotidiana a analisar com maior atenção as relações humanas, como vários de seus contemporâneos do riso bem gostam de fazer em seus filmes.
O mais curioso, porém, é perceber o quão metódico o humorista pode ser em suas criações. Da série protagonizada pela família Griffin ao sucesso de bilheteria Ted, MacFarlane sempre faz questão de, por exemplo, incluir uma espécie de alter-ego para que possa refletir sobre sua personalidade e os próprios defeitos pela comédia. Através desta prática, o comediante parece transmitir ao público a mensagem de que sua pessoa é tão falha quanto à da humanidade, e que ele é portanto tão risível quanto a própria.
Em Um Milhão de Maneiras de Pegar na Pistola, seu primeiro filme de gênero, esta prática não é diferente, mas apresenta uma novidade. Além de produzir, escrever (junto dos habituais colegas Alec Sulkin e Wellesley Wild) e dirigir, Macfarlane deixa de apenas emprestar sua voz e interpreta desta vez o protagonista de sua própria obra, aqui o covarde fazendeiro Albert que quer reconquistar o suposto amor de sua vida, a bela Louise (Amanda Seyfried), com a ajuda de Anna (Charlize Teron). Mas ainda que esteja pela primeira vez no controle absoluto de seu alter-ego o comediante exibe o mesmo traço sarcástico e pessimista de todos as suas outras identidades cinematográficas.
E esta repetição não se restringe ao aspecto pessoal da comédia "macfarleana". Da mesma forma que Ted, American Dad e Uma Família da Pesada, Um Milhão de Maneiras de Pegar na Pistola apresenta o formato de uma típica sitcom de 20 minutos com todas as características cômicas do diretor, estendida agora para um filme de quase duas horas de duração e carregando todas as qualidades e defeitos deste. O problema, porém, é que o longa erra a mão com maior frequência nas piadas e esquetes apresentados, e o ritmo da comédia perde força em vários momentos por causa disso.
Mas mesmo errando mais que o habitual o humor de MacFarlane continua afiado. Repleto de autorreferências - incluindo uma especialmente divertida sobre De Volta para o Futuro - e participações especiais (pisque e você perderá personalidades como Ryan Reynolds e Ewan McGregor em cena), o filme faz rir com gosto quando acerta, e encontra espaço para que todos os personagens desenvolvam suas características cômicas com fluidez. Neste ponto, as gags recorrentes mostram força e geram alguns dos momentos mais divertidos do longa - como por exemplo o peculiar "drama" vivido pelos personagens de Giovanni Ribisi e Sarah Silverman.
Ainda que possua uma trama extremamente previsível e evidencie o desgaste da fórmula de comédia de MacFarlane, Um Milhão de Maneiras de Pegar na Pistola serve a seus intentos aos dois lados em sua reverência ao faroeste (o Velho Oeste é fotografado pela produção com uma impressionante beleza plástica). Para o público, é uma boa comédia que diverte e entretém razoavelmente; para o humorista, é um importante aprendizado sobre gênero cinematográfico - e, principalmente, como fazer graça deste.

Nota: 6/10

0 comentários :

Postar um comentário