Pseudociência dá lugar a protagonista e ação na produção francesa
Por Pedro Strazza
Um exemplo recente desse talento raro de Besson é este Lucy, que mesmo partindo de um mito tão batido nos dias de hoje consegue criar uma boa diversão ao público em seus curtos 89 minutos de duração. A pseudociência do "você só usa 10% de sua capacidade cerebral", afinal, serve apenas de pretexto para que o diretor (também responsável pelo roteiro aqui) emende cenas de ação em mais cenas de ação com uma agilidade e tensão impecáveis.
Esta velocidade narrativa de Lucy é atingida pelo cineasta francês a partir de duas bases sólidas e bem construídas por todo a produção: O uso de recortes e a atuação de Scarlett Johansson. Ao passo que Besson aplica a primeira em diversos momentos do longa para fazer crescer a tensão de certas cenas - principalmente na abertura do filme, na qual o diretor realiza uma interessante comparação entre a situação apresentada e o predastismo animal -, a atriz protagonista abraça seu papel, progredindo em sua interpretação conforme sua personagem, inicialmente apresentada como ingênua, vai se tornando mais poderosa e menos humana. Desta forma, Johansson não só prova com Lucy sua capacidade em protagonizar uma produção do gênero como também evidencia, alinhando suas recentes participações em Ela, Sob a Pele e Capitão América 2, um talento adaptável a qualquer tipo de papel ou projeto cinematográfico.
Essas qualidades técnicas do filme não escondem do espectador, porém, os vários defeitos narrativos presentes no roteiro de Besson. Afora a protagonista, verifica-se no longa um excesso problemático de personagens rasos e sem importância, cuja importância na trama torna-se nula após eles cumprirem sua única função. Este é o caso, por exemplo, do policial e do chefe da máfia interpretados respectivamente pelo egípcio Amr Waked e o sul coreano Min-sik Choi: Enquanto o primeiro em apenas um momento mostra algum motivo real para estar ajudando a protagonista, o último deixa claro sua inutilidade depois de sua primeira e primordial participação na trama.
Além disso, o longa seguidas vezes interrompe o andamento da história para se dedicar na explicação de alguns acontecimentos, apoiando sua argumentação em fatos claramente pseudocientíficos, e consequentemente cria com frequência diálogos expositivos e desnecessários - dos quais o cientista interpretado por Morgan Freeman, que parece repetir seu papel feito em Transcendence, participa na maioria das vezes. E quando Lucy se deixa focar somente na seriedade de um assunto obviamente ridículo (como é o caso de seus últimos 15 minutos), todo o esforço em criar aquela agilidade narrativa é desperdiçado.
Como filme pipoca, entretanto, o filme no geral tem um resultado positivo. Com tantos motivos criativos para ser péssimo, Lucy diverte graças à união de um cineasta e uma atriz de qualidade em prol de um longa entretivo, que com surpresa entrega uma protagonista feminina forte e interessante. Se tivesse valorizado mais este lado e deixado a seriedade em torno de um assunto tão bobo para trás, a produção possivelmente teria estas qualidades ainda mais realçadas.
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