Final explosivo e hilário coroa reverência ao espião idealizado.
Por Pedro Strazza.
O passado, porém, tende a deixar o ser humano saudoso dos "velhos tempos", e Matthew Vaughn tem esse sentimento com o espião "que me amava". É de nostalgia, afinal, que é feito Kingsman - Serviço Secreto, o quinto trabalho do cineasta na direção, e Vaughn não perde tempo para tanto homenagear como satirizar o agente secreto charmoso, mas obsoleto da era passada.
Adaptação da graphic novel homônima escrita por Mark Millar e desenhada por Dave Gibbons, o longa acompanha Eggsy (Taron Egerton), um jovem rebelde e pobre de Londres que certo dia acaba livre da prisão graças à ajuda de Harry Hart (Colin Firth), um cidadão cavalheiresco que lhe oferece a oportunidade de entrar no Kingsman, uma sociedade secreta disposta a proteger o mundo (não me diga!). A partir daí, Eggsy não só precisa passar por uma verdadeira transformação social digna de My Fair Lady ou Uma Linda Mulher para se tornar um superespião como também tem o dever de evitar que os planos maléficos do bilionário Valentine (Samuel L. Jackson) e de sua parceira Gazelle (Sofia Boutella) se concretizem.
A trama óbvia e clichê descrita acima já evidencia tanto a maior qualidade quanto o maior defeito da obra adaptada para as telonas por Jane Goldman e o próprio Vaughn. Se por um lado o diretor é eficaz em reproduzir os lugares-comum do roteiro de uma maneira divertida para evitar que o resultado final seja maçante para o espectador, o filme sofre em seus dois primeiros atos com a falta de riso daquilo que mostra, demonstrando preocupação excessiva em homenagear o passado do gênero. O universo habitado por Eggsy e o agente Hart parece querer ter o mesmo grau de realidade e dramaticidade dos dias de hoje, mas também o tom cômico da espionagem de Moore - e o único que se salva dessa contradição é o vilão Valentine, tratado desde o princípio com todo a comicidade e absurdo da figura do personagem por L. Jackson.
Essa problemática, entretanto, desaparece no terceiro ato, quando o filme se solta da obrigatoriedade da reverência e abraça efusivamente o ridículo. Do clímax explosivo na base secreta do antagonista ao seu desfecho, Kingsman aceita rir dos clichês que tanto enalteceu e faz isso sem dó alguma, abusando da paleta de cores berrantes e trocadilhos exagerados (Rei Artur, Sherlock Holmes, Jack Bauer, ninguém escapa) presentes em toda a narrativa. E isso inclui todos os preconceitos e suposições da época, como bem esclarece a piada anal que encerra o longa ou a sequência espacial feita sem muito acabamento.
Mas se há problemas nesse antagonismo entre comédia e veneração, na elaboração técnica Vaughn prova de novo seu talento. Sua direção é elegante e prática, capaz tanto de criar cenas de ação muito bem montadas e executadas (o angulamento feito pelos óculos do espião é caricatural na medida certa) quanto a de tornar Colin Firth, um ator conhecido pelos papéis dramáticos e serenos, em uma figura de ação sem que o público estranhe esta transformação drástica.
Divertido e caricato, Kingsman - Serviço Secreto é mais uma reverência óbvia que uma risada descarada de escárnio na maneira como o cinema retratava a espionagem no passado. Sua capacidade de virar de cabeça pra baixo essa afirmação no encerramento, porém, não só mostra o seu potencial como comédia exagerada, mas também traz um contraste interessante com todo o panorama atual de um gênero cada vez mais realista e menos despreocupado.
Nota: 7/10
Gostou? Assista Também:
- Top Secret! - Superconfidencial/Austin Powers - O Agente Nada Misterioso: Escárnio e homenagem ao espião do século XX na mesma medida.
- O Homem Mais Procurado: O espião dos dias de hoje.
0 comentários :
Postar um comentário