domingo, 9 de agosto de 2015

Crítica: Quarteto Fantástico

Releitura da equipe erra a mão ao ignorar seus elementos fundamentais.

Por Pedro Strazza.

Primeira equipe de super-heróis criada nas páginas da Marvel pela dupla Stan Lee e Jack Kirby, o Quarteto Fantástico ganhou fama nos quadrinhos por trazer em seu alicerce criativo a combinação quase antagônica entre ciência e família. No fundo frutos oriundos respectivamente da razão e da emoção, a combinação destes dois elementos é notável na trajetória do grupo, que tem nos líderes cientistas Reed Richards e Sue Storm a instituição do casamento, fundamental para a gênese familiar.
Encontrar e traduzir esse equilíbrio delicado dos quadrinhos para o cinema, porém, parece ter se tornado uma tarefa bastante complicada. Enquanto as versões dirigidas por Tim Story em 2005 e 2007 se mantiveram ao lado família para criar uma comédia de aventura pouco substancial, o reboot comandado agora por Josh Trank se concentra mais na área científica e obtém resultados similares. Pois por mais sério que procure parecer, a nova versão do Quarteto consegue comete um mesmo número de erros de seu antecessor.
A diferença aqui é que enquanto os outros dois filmes não mostravam quase nada interessante para entreter em seu esforço hercúleo de descontração, o remake tem ideias e conceitos promissores. Com clara base no universo Ultimate dos quadrinhos (onde houve um esforço notável para mudar o grupo), o longa traz nas jovens versões de Reed Richards (Miles Teller), Sue (Kate Mara) e Johnny Storm (Michael B. Jordan) e Ben Grimm (Jamie Bell) uma forte conexão ao descobrimento humano e suas consequências, um tema bastante conhecido do terror científico. É nesse subgênero, inclusive, que o diretor procura adequar sua história, encontrando na maneira como os seus personagens ganham seus poderes a mais pura forma de horror, e o apavorante momento em que Grimm toma consciência da monstruosidade que se tornou é prova cabal disso.
Não é à toa, portanto, que o real protagonista do filme seja Richards, que carrega em seus óculos de armação grossa a figura do jovem sedento pelo progresso. Central no roteiro escrito por Simon Kinberg, Jeremy Slater e Josh Trank, Reed não chega a encarnar de fato o cientista louco e cego pelos louros consequentes de seu objetivo (sua busca não é pelo sucesso, ele bem diz), mas seu arco - bem trabalhado por Teller na medida do possível - caminha muitas vezes próximo a esse perfil graças ao sofrimento com os erros cometidos de forma imprudente, atitude típica da do adolescente instável pela fase adolescente. Essa insensatez dos atos juvenis, por sinal, é um tema bastante presente nos meninos super-poderosos de Poder Sem Limites, longa anterior de Trank como diretor.
Os problemas de Quarteto Fantástico começam, porém, quando o protagonista sai de cena horrorizado com suas ações e a história a partir daí abandona por completo suas ideias. O ato, por mais característico que seja de seu gênero, é usado com infantilidade como ponto de virada pelo roteiro para encaminhar a obra aos clichês dos quadrinhos de super-herói e o esvazia de seu sentido original. A segunda metade, inclusive, parece pertencer a um produto completamente diferente, na medida que se faz tão leviano e exagerado tal qual os filmes de Story.
Mas isso não seria tão problemático se Trank não concentrasse tanto sua atenção apenas em Richards, e essa decisão acaba por tirar força da unidade que torna a equipe tão famosa. Relegados ao segundo plano, Sue, Johnny e Ben são trabalhados de forma unidimensional de forma que os três funcionem somente como apoio para a construção de seu futuro líder, em figuras conhecidas e pouco interessantes: Enquanto os dois últimos ressaltam o desperdício de potencial ao fazerem caminhos sem inspiração na história (o Coisa tem seu drama de transformação submetido ao arco de cobaia militar, o futuro Tocha Humana sai da identificação rebelde apenas para desejar a submissão ao governo), a Mulher Invisível de Mara frustra por ocupar uma posição de fundo tão similar à da versão de Jessica Alba. E se até os mocinhos são mal-utilizados, não sobra muito para o Victor Von Doom de Toby Kebbell senão a caricatura de traços maniqueístas.
Reinado por resoluções infantilizadas (o conflito criado na relação entre Reed e Ben é interrompida sem motivo aparente) e um clímax hilário por seu ridículo, Quarteto Fantástico é uma decepção na maneira como joga fora suas ideias e seu ótimo elenco em uma trama que vai a lugar nenhum. O mais complicado, porém, é perceber como Trank e seu filme não capazes de captar a sinergia e os elementos do grupo que transpõe para as telas, cegos talvez pelo esforço em querer conceber uma nova visão da equipe. Este esquecimento, em última análise, é o que destrói qualquer sustentação plausível da produção.

Nota: 4/10

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