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segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Crítica: Chef

Aliado à gastronomia e a música, Jon Favreau fala sobre a própria vida em novo filme

Por Pedro Strazza

Até o momento, o caminho tomado pelo comediante Jon Favreau como diretor não saiu tanto dos moldes clássicos. Inicialmente dirigindo trabalhos para a televisão, o comediante fez sua estréia nas telonas com filmes de baixo orçamento como Crime Desorganizado e Um Duende em Nova York, e, progredindo com certo sucesso entre público e crítica, acabou sendo responsável pelos dois primeiros capítulos da franquia Homem de Ferro, blockbusters que jogaram seu nome para o estrelato. Mas Favreau, descuidado devido à fama, errou a mão feio no grotesco Cowboys & Aliens, e, massacrado por tudo e todos, teve que recomeçar sua carreira de direção com algo mais simples.
Sob este aspecto, Chef, o nome desse projeto de reinício, possui todos os elementos e clichês de uma produção com tais objetivos. De orçamento pequeno e com roteiro simples - escrito por Favreau, que também produz e protagoniza seu novo trabalho de direção -, a aparentemente leve comédia gastronômica apresenta porém uma fina segunda camada, escondida por um diretor que usa com inteligência desta para transformar a trama superficial em um desabafo sobre sua carreira até aqui, sem contanto esquecer do perfil raso da história a ser contada.
Não à toa, portanto, que a vida do personagem vivido por Favreau remeta tanto a do próprio ator: Além de viver do sucesso de um passado não tão distante e estar separado de sua mulher e filho, o chef Carl Casper trabalha em um restaurante onde suas habilidades criativas culinárias não são postas à prova em nenhum momento - e para o dono (Dustin Hoffman), estas nunca precisarão. Frustrado, o mestre cozinheiro tem seu rumo mudado quando um famoso crítico gastronômico (Oliver Platt) escreve uma péssima resenha sobre sua comida, fazendo com que ele, após sofrer uma explosão emocional na internet, tenha que mudar sua vida radicalmente.
Em Chef, Favreau estrutura o filme em duas partes visivelmente distintas: Na primeira, dedica-se a apresentar o protagonista, as pessoas que o circundam e seu amor pela gastronomia - prática esta fotografada com verdadeira admiração por Kramer Morgenthau. A culinária, por sinal, é um elemento que junto com a música marca presença na narrativa. Em pouquíssimas cenas não vemos um prato sendo preparado e desgustado ou uma música tocando no fundo.
A segunda metade do filme, por outro lado, se dedica em, à partir do formato de um típico road-movie e com a culinária como pano de fundo, explorar o protagonista e suas falhas como pessoa e pai a partir do relacionamento que tem com seu filho (Emjay Anthony). O desenvolvimento desta relação parental, entretanto, é retratada no longa com certa simplicidade, expondo em consequência todo o problema que o roteiro tem no desenvolvimento dos personagens secundários. Construção típica do humor de stand-up, esta superficialização dos coadjuvantes cria deficiência no relacionamento destes com o protagonista por subvertê-los aos desejos e vontades de Casper - algo muito estranho se pensarmos, por exemplo na ex-mulher vivida por Sofía Vergara e sua simpatia exagerada por Casper.
Mas mesmo com este grave problema de roteiro Chef encanta pela simplicidade e, ao mesmo tempo, pela profundidade. Com o humor orgânico de Favreau afiado e bem distribuído ao longo da história, o filme cria, em sua narrativa deliciosa e musicalmente elaborada, um belo retorno do diretor às comédias leves e sem muitas pretensões, ainda que agora contenham uma centralidade importante e disfarçada. O prato final pode ter errado em alguns ingredientes, mas acerta no resultado geral.

Nota: 7/10

domingo, 17 de agosto de 2014

Crítica: As Tartarugas Ninja

Reinício dos quelônios no cinema é marcado por erros

Por Pedro Strazza

Ainda que possuam um início esteticamente e narrativamente violento nos quadrinhos, as Tartarugas Ninja sempre possuíram em seu perfil uma veia cômica. A ideia para sua criação, ao invés de planejada desde o princípio, surgiu enquanto os criadores Kevin Eastman e Peter Laird - antes de começarem a desenvolver seriamente a mitologia e seus conceitos - riam da imagem de um animal lento e desajeitado (a tartaruga) ter habilidades e capacidades físicas dignas de um guerreiro (os ninjas), uma impossibilidade da natureza. Este lado humorístico do quarteto, ao longo dos anos, foi utilizado das mais diversas formas por várias produções em diferentes formatos, alcançando o seu ápice nos produtos dos anos 80-90 - A época, não por acaso, de maior sucesso dos quelônios.
Após este período, porém, as tartarugas não encontraram mais tanto espaço na cultura pop, tentando sucessivamente alcançar o mesmo posto de antes. E depois de dois desenhos animados e uma animação para os cinemas, os "filhos" de Mestre Splinter procuram voltar à luz dos holofotes com a ajuda de Michael Bay, o produtor deste remake live-action da franquia. Mas apesar estarem visualmente reinventadas e contarem com algumas estrelas na produção, os quelônios não escapam dos maneirismos e problemas da "síndrome de Bay", exponenciados por um diretor que, não sendo o responsável pela franquia Transformers, procura copiá-lo de maneira porca e genérica (se isto é possível!!!).
E esses defeitos mostram-se visíveis já na primeira parte do roteiro de As Tartarugas Ninja. Depois de realizar uma introdução elaborada e eficiente em informar as origens dos quelônios e as propostas básicas da trama, a história prefere, na primeira meia hora, focar suas atenções na desinteressante (e irritante em vários momentos) April O'Neil (Megan Fox, novamente ineficiente em quesitos de atuação) a seguir acompanhando seus protagonistas. A intrépida jornalista do casaco amarelo, por sinal, ganha aqui o seu maior destaque em toda sua existência, tornando-se precariamente o ponto central de uma narrativa em que tudo está conectado - formato este bastante similar a de filmes como os recentes O Espetacular Homem-Aranha e Batman Begins.
A centralidade do papel de Fox na trama não é, porém, o maior erro do roteiro do remake, mas sim sua necessidade em procurar explicar a todo momento o que está acontecendo. De cinco em cinco minutos, a história parece estacionar seu ritmo no intuito de deixar claro ao espectador quais são as intenções dos mocinhos e dos bandidos, mesmo que para isso tenha que criar incoerências claras em sua continuidade, defasada também na fotografia.
A direção de Liebesman é também outro ponto bastante negativo neste retorno do quarteto aos cinemas. Novamente empregando em demasia sua preferência por travellings e planos holandeses, o diretor parece não conseguir tanto encontrar aqui o melhor ângulo e recurso possível para filmar as frenéticas cenas de ação (que Bay talvez tenha imposto) como entender o espaço onde elas ocorrem, tornando-as essas sequências confusas e chatas - à exceção, talvez, do clímax no alto da torre, onde a liberdade espacial permite um uso razoável da câmera. E se na pancadaria Jonathan fracassa repetidas vezes, o que dizer então dos momentos de humor, em que literalmente denota o tempo aonde o público deveria rir?
Apesar de errar demais em vários aspectos técnicos, contudo, o filme encontra relativo sucesso em seu próprio chamariz. Além de estarem visualmente fantásticas - aplausos pela ousadia em diferenciar o quarteto entre si pelos objetos que carregam e seus formatos -, Leonardo (Pete Ploszek na captura de movimentos, Johnny Knoxville na dublagem), Michelangelo (Noel Fisher), Rafael (Alan Ritchson) e Donatello (Jeremy Howard) apresentam a mesma química invejável e amabilidade que possuem desde o desenho animado dos anos 80, e criam no filme os pouquíssimos momentos genuinamente divertidos (como a curta cena no elevador).
Contando ainda com alívios cômicos sofríveis e vilões de planos nada coerentes, As Tartarugas Ninja realiza mais erros grotescos que acertos calibrados em seu recomeço nas telonas. Estas escolhas precárias, porém, não são feitas nas pedras fundamentais da nova franquia e podem ser repensadas na já confirmada sequência. A esperança pelo menos é esta.

Nota: 3/10

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Crítica: The Rover - A Caçada

David Michôd analisa a dor de viver sem o próximo em western pós-apocalíptico australiano

Por Pedro Strazza

A maneira como o ser humano aborda o sentimento de perda pode variar de pessoa para pessoa, mas individualmente nunca muda. A partir do momento em que toma consciência de si mesmo, o homem é obrigado a conviver repetidamente com o falecimento de indivíduos a quem nutre um carinho profundo (sua família e seus amigos, por exemplo), tornando-se necessário nessas ocasiões a passagem por um procedimento de superação sobre aquilo - o luto. E mesmo que cresça, amadureça e envelheça, a humanidade nunca conseguirá alterar tão profundamente o jeito com o qual encara a morte, a certeza maior na vida de todo ser vivo.
Como lidar, então, com esse sentimento tão penoso e desgraçado, se ele continuará a voltar para nos atormentar? Este questionamento, no fundo, é o que faz girar a trama de The Rover - A Caçada. Em um mundo onde o apocalipse foi gerado por um colapso financeiro de proporções globais, o filme do diretor e roteirista David Michôd mostra, em vários momentos de sua história, o quanto as relações humanas foram reduzidas pela sociedade a um nível praticamente nulo, restrito apenas a necessidades básicas de sobrevivência. O motivo? No cenário tão árido e desolador em que vivem, os habitantes desse universo talvez queiram evitar qualquer sofrimento maior.
Como todos os outros, Eric (Guy Pearce) também se fechou. Procurando apenas sobreviver, o protagonista de The Rover tem seu carro roubado quando decide tomar um pouco de água em um estabelecimento local, fazendo com que ele, por apresentar uma inexplicável conexão sentimental com o veículo, decida perseguir os ladrões. Para isso, entretanto, Eric precisará da ajuda de Rey (Robert Pattinson), o irmão com problemas mentais de um dos membros da gangue que sabe aonde eles estão, e isso o obrigará a realizar, na sua visão, o pior ato possível: interagir com o outro.
É a partir desta forçada união de forças, então, que o filme desenvolve sua linha narrativa. A cada novo desafio ou obstáculo enfrentado pelos dois, o público é apresentado a novas faces destes personagens, entendendo cada vez mais suas ações atitudes em relação ao próximo. E este processo afeta também a maneira como encaramos a atuação do elenco: Se no ínicio as performances de Pearce e Pattinson parecem exarcebadas e caricatas, o espectador aos poucos vai compreendendo o porquê das personalidades de Eric e Rey serem tão desfiguradas - principalmente com o primeiro, que revela ser um homem despedaçado pelo próprio passado que o atormenta, como é possível observar, posteriormente, na cena no canil.
Mas se com o desenvolvimento de personagens The Rover é eficaz, na construção de seu universo e de sua história há falhas visíveis. Ambientado no poeirento e monocromático deserto australiano, o filme não faz questão de estabelecer em nenhum momento as regras que regem seu pós-apocalipse, e isso vem a ser um problema quando a trama, por exemplo, elabora a instituição dos militares como sobrevivente do desastre econômico-apocalíptico sem qualquer explicação aparente para sua permanência. O roteiro, por outro lado, usa e abusa de situações clichê para guiar a sua história, tornando o rumo de alguns acontecimentos previsíveis demais.
Ainda que aborde seu tema central com eficácia e se utilize bem da competência de seu elenco, The Rover - A Caçada falha em pontos vitais e básicos da narrativa, consequentemente tornando sua trama um tanto cansativa. Uma pena, visto a profundidade do assunto discutido.

Nota: 6/10

terça-feira, 5 de agosto de 2014

HEY, Eu Quero uma Segunda Opinião!: Guardiões da Galáxia

A expansão do Universo Marvel nos cinemas por meio de um filme divertidíssimo

Por Alexandre Dias


Depois de assistir Guardiões da Galáxia o que fica é o gosto de "quero mais". Divertido do primeiro ao último minuto, o filme é mais uma aposta arriscada (e certeira) da Marvel Studios, que expande o seu universo nas telonas por meio de uma equipe atípica de...perdedores!
Perdedores? Sim, perdedores, e são eles quem ganham totalmente o espectador: Peter Quill, o Senhor das Estrelas (Chris Pratt), é o líder totalmente oposto ao que seria o Capitão América: ladrāo, mulherengo e sem os princípios do Sentinela da Liberdade. Drax, O Destruidor (Dave Bautista, ótimo), é o brutamontes em busca de vingança; Gamora (Zoe Saldana) a letal assassina que mudou de lado; e, para completar, há as figuras peculiares do guaxinim, Rocket, e da árvore humanóide, Groot, dubladas de forma fantástica por, respectivamente, Bradley Cooper e Vin Diesel. E se Joss Whedon conseguiu juntar o super grupo dos vingadores, dando o tempo certo de cada integrante, o diretor e roteirista James Gunn realiza aqui o mesmo feitio junto da também roteirista Nicole Perlman.

Os vilões também merecem destaque: o líder dos kree, Ronan, O Acusador (Lee Pace), se assemelha ao Malekith, de Thor- O Mundo Sombrio, quanto aos objetivos e o próprio desenvolvimento do personagem; Nebula (Karen Gillan) também é ótima em ação e se sai bem no papel da filha renegada. Mas sem dúvida o maior impacto vilanesco é de Thanos (Josh Brolin), que nos poucos minutos em que aparece impõe toda autoridade que tem por meio do vozeirão e do visual evil, prometendo fazer história nos futuros filmes do estúdio.

Assim como a aparência de cada indivíduo é bem trabalhada (destaque para Rocket e Groot, que são uma mistura de CGI com captura de movimentos), o universo espacial também é digno de admiração. Cada detalhe de Xandar é magnífico e a aparição de Luganenhum é de tirar o folêgo pela extensão da estação espacial.

Todos os aspectos mencionados são agregados a uma diversão intensa: as cenas de ação são espetaculares e o humor é devidamente colocado para cada situação e personagem (um bônus para as awesome musics, que são apreciadas por Peter Quill e se transformam em piada várias vezes). Ainda vale afirmar que os poucos momentos dramáticos funcionam na medida certa.

Um filme repleto de efeitos especiais, com muito humor e que tem um roedor como protagonista pode parecer genérico. Não é o caso aqui, aonde a Marvel Studios é mais uma vez competente ao ampliar o seu mundo no cinema com as possibilidades que tem, afinal algumas figuras importantes dos quadrinhos como os X-Men e Homem Aranha estão na posse de outros estúdios. Os losers, como o Senhor das Estrelas os caracteriza, já não são mais tão losers.

Nota: 10/10

No quadro HEY, Eu Quero uma Segunda Opinião!, O Nerd Contra Ataca abre espaço para que outros críticos deem suas opiniões acerca de um filme já comentado pelo site.

sábado, 2 de agosto de 2014

Crítica: Guardiões da Galáxia

Uma introdução brilhante do universo espacial da Marvel

Por Pedro Strazza

Já fazia um bom tempo que a Marvel Studios não apostava tão alto em seus filmes. Depois de ter encerrado com excelência, em 2012, a sua primeira fase nos cinemas com Os Vingadores, o estúdio preferiu na segunda parte de seu planejamento desenvolver os seus heróis estabelecidos na telona ao invés de seguir introduzindo novos cenários e personagens de seu universo. No cronograma da empresa para a Fase 2, no entanto, surgiu como única novidade uma estranha e desconhecida (até para os fãs mais antigos!) equipe dos quadrinhos da Marvel: Os Guardiões da Galáxia.

Criados em 1969, o grupo de heróis que, no século 31, tomam como missão proteger a Terra de ameaças espaciais sofreu em seus quase cinquenta anos de existência diversas alterações e reformulações para alavancar a venda de seus gibis - e como nenhuma dessas mudanças não surtia efeito no mercado, eles foram com o tempo sendo relegados ao esquecimento pela editora da qual faz parte. O que parecia estar morto e enterrado, porém, revelou-se estar vivo e respirando (ainda que com a ajuda de aparelhos), e em 2008 a equipe voltou a dar as caras, agora completamente reinventada e anunciada de forma discreta nos efeitos do fim de mais uma mega-saga da Marvel.

E quando parecia que o time agora liderado pelo Senhor das Estrelas não receberia mais confiança de sua editora do que um título mensal (cancelado após algum tempo, por sinal), eis que a empresa nos surpreendeu novamente e anunciou um filme sobre àqueles personagens, colocando todas as suas fichas na concepção e divulgação da equipe e seus integrantes. E o mais curioso de todo este processo é saber que esta confiança exacerbada da Marvel provou-se ser um tiro certeiro.

Dirigido por James Gunn, Guardiões da Galáxia é um filme que se vale do humor e da homenagem aos anos 70 e começo dos 80 para conquistar o seu público - fórmulas de fácil acesso e uso por qualquer produção hollywoodiana. O que diferencia o roteiro escrito por Gunn e Nicole Perlman destas outros longas, no entanto, é a sabedoria da dupla em aplicar estes dois elementos a seu quinteto protagonista - o riso a todos, a nostalgia a Peter Quill (Chris Pratt) - ao invés de todo o universo, afastando assim sua história cômica-aventuresca da paródia fácil, boba e inofensiva. Os acontecimentos mostrados em Guardiões são tratados com seriedade por todos os personagens, mas o grupo de heróis (assim como o próprio filme) não hesitam em se divertir pelo caminho.

Nesse ínterim, o roteiro é sagaz no uso dos anos 70 e 80. Da trilha sonora repleta de hits da época às referências interminavéis de Quill, a nostalgia é empregada pelo filme não só em aspectos mais superficiais como também construtivos: A fita carregada pra lá e pra cá pelo Senhor das Estrelas, por exemplo, é ouvida pelos personagens em diversos momentos da narrativa e tem um valor emocional grande para o protagonista humano - é de sua falecida mãe, afinal, a escolha da lista de músicas.

O desenvolvimento dos Guardiões é também um ponto bastante acertado pela produção. Com tempos de tela equilibrados e interagindo entre si de forma hilária e natural (duas características já habituais da Marvel Studios), cada um dos cinco protagonistas apresenta, além de um determinado tipo e tempo de humor, um passado problemático e que envolve de alguma forma a família. Seus pesados dilemas pessoais, porém, são espertamente abordados com sutileza e sem banalizações pelo filme em determinados momentos da narrativa, de forma a não interferir no ritmo desta. Assim, dramas como o de Drax (Dave Bautista, inacreditavelmente excelente na composição emocional de seu papel) com a perda de sua mulher e filho ou de Gamora (Zoe Saldana) e sua relação com seu "pai" Thanos não precisam ganhar destaque óbvio no filme para que o  espectador entenda seus sofrimentos particulares, e a trama consegue progredir de forma orgânica.

E esta eficiência do roteiro não se restringe apenas aos protagonistas. Gunn e Perlman não fazem questão nenhuma de complicar sua trama, mas sim de explicar com clareza suficiente as intenções de cada personagem no enredo - incluindo aí o próprio vilão Ronan, o Acusador (Lee Pace), que nos primeiro minutos já divulga seus objetivos primários para o público, e coadjuvantes terciários como Yondu (Michael Rooker) e a tropa Nova. O uso da força policial espacial no filme, por sinal, é inteligente ao "desenvolver" alguns integrantes quaternários para que o espectador sinta medo por eles nas grandes batalhas do clímax.

Nenhuma dessas características, entretanto, funcionariam tão bem sem uma elaboração visual do universo em que se passa a história. Consciente desta necessidade, os departamentos de design de produção e maquiagem desempenham seus papéis com excelência, concebendo cenários e habitantes únicos e multicoloridos para tornar a ambientação palpável ao público. E os efeitos visuais do longa, além de fortalecerem esta relação visual público-filme, é vital para a composição física de Groot e Rocket (que recebem ainda um trabalho de dublagem brilhante por parte de Vin Diesel e Bradley Cooper), tornando-os suficientemente reais para o público a ponto deste vibrar e torcer por eles.

Leve e divertido nas medidas certas, Guardiões da Galáxia é um filme que é capaz de introduzir uma nova parte do universo Marvel ao mesmo tempo em que, assim como os recentes Círculo de Fogo e Os Vingadores, consegue trazer de volta ao espectador a sensação feliz e satisfatória que só um blockbuster aventuresco e descompromissado - tão raro na Hollywood dos dias de hoje - pode oferecer. Neste aspecto, a alta aposta inicial da Marvel Studios rendeu seu melhor fruto até aqui, e os Guardiões com isso conseguiram enfim ganhar algum espaço na concorrida e disputada cultura pop.

Nota: 10/10

domingo, 27 de julho de 2014

Crítica: A Era de Ultron

Muito futuro e pouco presente na história de viagem no tempo

Por Pedro Strazza

Apesar de já terem enfrentado e vencido inimigos de poderes quase divinos, os Vingadores (seja qual fosse a formação) sempre temeram a ameaça de Ultron. Mesmo não sendo a criatura mais poderosa do Universo Marvel, a inteligência artificial maléfica criada pelo cientista Hank Pym é capaz de fazer de tudo para aniquilar a espécie humana e se vingar da super-equipe, tornando-o um adversário perigoso e imprevisível. Seu objetivo, afinal, não encontra um obstáculo no grupo fundado por Tony Stark e seus amigos; eles são de fato o alvo dos planos do robô.
Mas se a meta de um indivíduo é a vitória sobre outro, o que acontece a seguir? É sob este aspecto que o roteirista Brian Michael Bendis dá o pontapé inicial para a saga A Era de Ultron: Depois de anos de derrotas consecutivas, o vilão finalmente conseguiu subjugar os maiores heróis da Terra e dominou o planeta, iniciando um apocalipse tecnológico por consequência. Acuados e procurados pela I.A., os integrantes remanescentes dos Vingadores procuram na viagem do tempo uma solução capaz de anular o antagonista de uma vez por todas, mas desencadeiam com isso um processo que pode mudar as leis do universo para todo o sempre (de novo).
Ainda que seja experiente em roteiros de grandes sagas na Marvel (das quais destacam-se as ótimas Dinastia M, O Cerco e a ainda recente Vingadores vs. X-Men), Bendis falha bruscamente em A Era de Ultron por focar seus esforços criativos na maneira como os acontecimentos mostrados aqui afetarão o universo da editora - e não em como contar uma boa história. Assim, à cada edição, a trama minimiza progressivamente Ultron e suas maquinações em prol da viagem no tempo, que, mesmo sendo parte essencial no plano dos mocinhos, não teve seus princípios e conceitos básicos bem utilizados pelo autor e os próprios personagens - Algo que fica evidente na segunda parte da saga, onde Wolverine e a Mulher Invisível resolvem mexer na linha temporal com um jeito semelhante ao de um elefante agitado em uma vidraçaria.
Mesmo que sendo mal utilizada pelo roteirista, a viagem no tempo é ainda responsável pelos poucos melhores momentos de A Era de Ultron por justamente mostrar os efeitos das passagens de Logan e Sue pelo passado - E quando na nona edição bota em discussão este processo, proporciona à sua trama um salto de qualidade visível. As duas realidades alternativas apresentadas na história podem não apresentar aqui os seus motivos para existirem (principalmente na Era de Le Fay, que mostra um universo onde magia e tecnologia se confrontam) ou características suficientemente aprofundadas, mas impressionam o leitor por sua complexidade e suas diferenças com o universo original.
Independente da qualidade narrativa, a saga também traz pontos positivos no uso de seus desenhistas ao longo das edições. Enquanto Bryan Hitch reproduz em seu traço um pouco da opressão tecnológica proporcionada por Ultron no futuro distópico das primeiras cinco edições, Brandon Peterson e Carlos Pacheco carregam visualmente bem a trama nas outras cinco, tornando a mudança de ilustrações suave e sem incômodos. E a última edição, por mais confusa e anti-climática que seja - além de servir como propaganda descarada, claro -, apresenta, graças ao elenco de ilustradores convidados, desenhos claros e esclarecedores (na medida do possível) da situação que se desenrola ali.
Pesando demais as suas consequências para o futuro do universo Marvel em detrimento do roteiro, A Era de Ultron oferece mais promessas do que acontecimentos relevantes em sua premissa confusa e em muitos momentos cansativa, fatores facilmente desapontadores para qualquer leitor de quadrinhos. Ultron, pelo visto, vai ter que esperar mais um tempo para desempenhar sua vingança contra a humanidade.

Nota: 4/10

terça-feira, 22 de julho de 2014

Crítica: Transformers - A Era da Extinção

A Era do Exagero, segundo Michael Bay

Por Pedro Strazza

O processo pelo qual o ser humano aprende a contar histórias é sempre o mesmo. Quando crianças, gostamos de partir logo para o que interessa e criar cenários de brigas épicas ou romances melosos, mas sem pensar muito em como essas situações foram geradas e satisfazendo apenas a si mesmo. À medida que crescemos, no entanto, essa tendência ao imediatismo é substituída pelas noções básicas da narrativa, e aprendemos progressivamente o quão bom é construir um enredo para gerar a catarse coletiva que buscávamos quando pequenos. E no fundo é isso o que a grande maioria das equipes criativas do universo do entretenimento querem: reproduzir no outro (o público) a mesma sensação que obtiveram com aquilo.
Esse desenvolvimento, porém, parou ainda na primeira parte para Michael Bay. Amado por alguns e odiado por muitos (mesmo!), o diretor, como uma criança mimada de cinco anos, sempre coloca a satisfação pessoal antes da dos outros em suas produções, mas tenta apresentar um mínimo de coerência nestas para que o público volte aos cinemas para arcar com suas caríssimas despesas - Um de seus filmes mais baratos, Sem Dor, Sem Ganho, custou 26 milhões, por exemplo.
Esta particular relação diretor-espectador, entretanto, não é a mesma com Transformers. Sucesso de bilheteria e constantemente bombardeada pela crítica, a franquia baseada nos bonecos da Hasbro tornou-se com o tempo para Bay uma espécie de playground milionário onde ele poderia exercer seus desejos cinematográficos superficiais sem qualquer risco de fracasso. E a cada novo capítulo da saga de combates entre robôs esta tendência só cresceu, culminando agora neste A Era da Extinção, que serve como uma espécie de recomeço para a série.
Passado cinco anos depois dos acontecimentos de O Lado Oculto da Lua, o quarto capítulo da franquia toma como ponto de partida a batalha de Chicago do último filme, usada como justificativa pelo departamento de segurança clandestina do governo estadunidense para caçar os alienígenas, sejam eles Autobots ou Decepticons. Procurado pelas autoridades e severamente ferido, o líder Optimus Prime (Peter Cullen) acaba sendo encontrado e acolhido pelo fracassado cientista Cade Yager (Mark Wahlberg) e sua família. A calmaria não dura muito tempo, porém, e logo Optimus, Yager e suas respectivas famílias estão sendo perseguidos pelo governo e por Lockdown (Mark Ryan), um Transformer caçador de recompensas.
O simples início de enredo de Transformers 4, entretanto, logo se envereda por uma série de conspirações - que incluem até inteligências artificiais, um assunto recorrente em Hollywood ultimamente -, que revelam uma trama ainda mais... simples. Ao contrário de seu último trabalho na franquia, Bay e o roteirista Ehren Kruger não procuram (apesar de conseguirem em alguns momentos) complicar demais a história de A Era da Extinção para evitar maiores (e complicadas) explicações. Como crianças, a dupla quer aqui é emendar cenas de ação em cima de mais cenas de ação, fazendo com que suas criaturas digitalmente caiam na porrada enquanto proferem frases de efeito.
Neste ponto é até possível enxergar algum progresso na franquia. Ao contrário dos outros três filmes da franquia - que privilegiavam os protagonistas Optimus e Bumblebee em detrimento de seus companheiros -, houve em A Era da Extinção um maior cuidado na concepção visual dos Autobots secundários. Ainda que apresentem perfis estereotipados, os designs robóticos e a maior presença de tela de Hound (John Goodman), Drift (Ken Watanabe) e Crosshairs (John DiMaggio), além do trabalho de voz de seus respectivos dubladores, possuem diferenças entre si suficientes para que o espectador os diferencie nos sucessivos combates.
A necessidade pungente de Bay em só filmar ação, porém, paga o preço em A Era da Extinção justamente pelo exagero usado na película. Interessado exclusivamente por agradar a si mesmo, o cineasta leva ao extremo aqui todas as suas características e maneirismos, distribuindo-os em 165 minutos de intensidade altíssima e, erroneamente, constante - algo que rapidamente desprende o espectador dos acontecimentos e torna a experiência cinematográfica do filme em algo um tanto chato. E como não trabalha um pouco as situações apresentadas ou sequer cria pausas para respiro, nem mesmo a tardia aparição dos Dinobots (sem dúvida o grande chamariz da produção) consegue mais chamar a atenção do público, exausto de tantas cenas de ação mal filmadas e alívios cômicos irritantes.
Outro erro gravíssimo (são vários, mas alguns se destacam) de Bay é o núcleo humano. Esperto em não trazer novamente os dramas repetitivos do Sam Witwicky de Shia LaBeouf, o diretor nem se dá ao trabalho de apresentar um protagonista humano interessante na figura de Yager, tornando os dramas que envolvem ele, sua filha Tessa (Nicola Peltz) e o "futuro" genro Shane (Jack Reynor) desinteressantes e incômodos - Além de incoerentes, como é possível identificar em vários momentos do longa. E se nem nos protagonistas humanos houve algum cuidado, o que dizer do restante, dominado pelos estereótipos mais preconceituosos possíveis (e que incluem até um Steve Jobs genérico personificado por Stanley Tucci???)?
Previsível em sua trama, genérico em suas lições de moral, cansativo por essência, Transformers - A Era da Extinção é um verdadeiro festival de erros e exageros, orquestrados por um Michael Bay infantil que se orgulha de conseguir a divertir a si mesmo. A grande pergunta que se chega após o fim da sessão, contudo, não é como ele ainda consegue alcançar altas bilheterias com uma franquia de qualidade questionável (pessoalmente, vou apenas pela diversão gerada pelos seus erros), mas sim a que ponto ele terá de chegar para que as pessoas parem de ir no cinema para vê-lo brincar.

Nota: 3/10

terça-feira, 8 de julho de 2014

Crítica: O Grande Hotel Budapeste

Uma grande brincadeira de uma criança extremamente perfeccionista

Por Pedro Strazza

Poucos são os diretores que possuam uma obsessão visual tão forte com seus filmes quanto Wes Anderson. Embora soe extremamente repetitiva na carreira do cineasta, a estética "casa de bonecas" utilizada em suas produções é genérica o suficiente para que possa abordar qualquer tema e contexto de seu interesse com uma visão diferente - Algo que pode ser visto na fuga romântica e juvenil de Moonrise Kingdom ou nos esforços de sobrevivência de O Fantástico Sr. Raposo, seus longas mais recentes.
De vez em quando, porém, o maneirismo visual de Anderson consegue encontrar um encaixe perfeito na trama em que é aplicado, como é o caso deste O Grande Hotel Budapeste. O filme, primordialmente sobre as disputas hereditárias sobre as riquezas de uma rica viúva (Tilda Swinton, irreconhecível), usa da aparência mecânica e parada do diretor para complementar a sua posição de escárnio com a etiqueta e os costumes clássicos (ultrapassados já no começo do século XX, onde se passa a história principal) que o concierge Gustave (Ralph Fiennes) segue para comandar o hotel do título.
O tratamento estético do cineasta, por sinal, encontra nesta produção um de seus ápices: Do formato da tela (usado aqui para denotar o momento temporal em que se passa a trama) às maquetes miniaturizadas, passando até pela composição dos personagens e da atuação do elenco, todas as características habituais do diretor encontram-se realçadas e aperfeiçoadas, denotando um comprometimento surpreendente até para os seus padrões. Anderson está mais do que engajado com sua proposta visual de simplificar a realidade e tornar seu principal cenário (o hotel) em um coadjuvante para sua história.
O mais interessante de O Grande Hotel Budapeste ocorre, porém, a partir do momento em que conta essa história - Mais precisamente, na maneira como a banaliza. Adotando um formato narrativo parecido com uma matrioshka (as bonecas russas que cabem uma dentro da outra), o longa se inicia no presente para já alertar, à medida que volta no tempo, da insignificância dos eventos narrados no passado e de suas motivações supérfluas, reforçando esta tendência de forma sutil (um quadro estranhamente fixado na parede da recepção, por exemplo) conforme a trama avance.
O que sobra então de uma história considerada como fútil pelo próprio roteiro? De fato esta é a grande questão trazida pelo filme (e talvez até de nossa própria existência), e sua resposta surge em sua dupla protagonista. Conforme a trama do longa avança, Gustave e Zero (Tony Revolori) realizam uma jornada por algo que representa não só a salvação para o lugar em que vivem e trabalham, como também pela chance de manter aceso o momento feliz vivido inconscientemente. Não por acaso, portanto, que a solução do mistério principal aos poucos perca a importância no decorrer do roteiro, pois sua relevância é zero para os principais personagens.
Ainda que apresente diversos personagens de única função na história (A Sociedade das Chaves Cruzadas, por exemplo, desaparece tão rápido quanto surge) e distancie o espectador dos protagonistas, O Grande Hotel Budapeste traz interessantes propostas narrativas e um perfeccionismo visual surpreendente por parte de seu diretor. O cuidado de Wes Anderson com suas histórias, mesmo que aqui sejam consideradas pelo próprio como irrelevantes, ainda trazem um fascínio pouco visto na História do cinema.

Nota: 8/10