terça-feira, 8 de julho de 2014

Crítica: O Grande Hotel Budapeste

Uma grande brincadeira de uma criança extremamente perfeccionista

Por Pedro Strazza

Poucos são os diretores que possuam uma obsessão visual tão forte com seus filmes quanto Wes Anderson. Embora soe extremamente repetitiva na carreira do cineasta, a estética "casa de bonecas" utilizada em suas produções é genérica o suficiente para que possa abordar qualquer tema e contexto de seu interesse com uma visão diferente - Algo que pode ser visto na fuga romântica e juvenil de Moonrise Kingdom ou nos esforços de sobrevivência de O Fantástico Sr. Raposo, seus longas mais recentes.
De vez em quando, porém, o maneirismo visual de Anderson consegue encontrar um encaixe perfeito na trama em que é aplicado, como é o caso deste O Grande Hotel Budapeste. O filme, primordialmente sobre as disputas hereditárias sobre as riquezas de uma rica viúva (Tilda Swinton, irreconhecível), usa da aparência mecânica e parada do diretor para complementar a sua posição de escárnio com a etiqueta e os costumes clássicos (ultrapassados já no começo do século XX, onde se passa a história principal) que o concierge Gustave (Ralph Fiennes) segue para comandar o hotel do título.
O tratamento estético do cineasta, por sinal, encontra nesta produção um de seus ápices: Do formato da tela (usado aqui para denotar o momento temporal em que se passa a trama) às maquetes miniaturizadas, passando até pela composição dos personagens e da atuação do elenco, todas as características habituais do diretor encontram-se realçadas e aperfeiçoadas, denotando um comprometimento surpreendente até para os seus padrões. Anderson está mais do que engajado com sua proposta visual de simplificar a realidade e tornar seu principal cenário (o hotel) em um coadjuvante para sua história.
O mais interessante de O Grande Hotel Budapeste ocorre, porém, a partir do momento em que conta essa história - Mais precisamente, na maneira como a banaliza. Adotando um formato narrativo parecido com uma matrioshka (as bonecas russas que cabem uma dentro da outra), o longa se inicia no presente para já alertar, à medida que volta no tempo, da insignificância dos eventos narrados no passado e de suas motivações supérfluas, reforçando esta tendência de forma sutil (um quadro estranhamente fixado na parede da recepção, por exemplo) conforme a trama avance.
O que sobra então de uma história considerada como fútil pelo próprio roteiro? De fato esta é a grande questão trazida pelo filme (e talvez até de nossa própria existência), e sua resposta surge em sua dupla protagonista. Conforme a trama do longa avança, Gustave e Zero (Tony Revolori) realizam uma jornada por algo que representa não só a salvação para o lugar em que vivem e trabalham, como também pela chance de manter aceso o momento feliz vivido inconscientemente. Não por acaso, portanto, que a solução do mistério principal aos poucos perca a importância no decorrer do roteiro, pois sua relevância é zero para os principais personagens.
Ainda que apresente diversos personagens de única função na história (A Sociedade das Chaves Cruzadas, por exemplo, desaparece tão rápido quanto surge) e distancie o espectador dos protagonistas, O Grande Hotel Budapeste traz interessantes propostas narrativas e um perfeccionismo visual surpreendente por parte de seu diretor. O cuidado de Wes Anderson com suas histórias, mesmo que aqui sejam consideradas pelo próprio como irrelevantes, ainda trazem um fascínio pouco visto na História do cinema.

Nota: 8/10

0 comentários :

Postar um comentário