domingo, 14 de maio de 2017

Crítica: Alien: Covenant

Prelúdio aprofunda problemas de Prometheus enquanto promove mistura dos elementos de diversos filmes da série.

Por Pedro Strazza.

Alien: Covenant surge a princípio como um filme de conciliações dentro da franquia. Misto assumido de sequência de Prometheus e prelúdio do original de 1979, o longa serve ao diretor Ridley Scott exatamente como um canal de processo para que este una suas ambições filosóficas sobre a criação ao clima de horror que consagrou ele e a série em seus primórdios, uma ponte capaz de unir o status atual do cinema do cineasta com os elementos que o identificaram no início. Tudo para clarificar, no fundo, um pouco mais das origens da criatura que é item central da marca, explicando como esta adquiriu a forma clássica.

É uma tentativa de reparação de casamento que se percebe logo no início pelos interiores da nave que dá nome à produção (o design é muito similar à da Nostromo) mas também no próprio tom da trama escrita por John Logan e Dante Harper, que abandona o viés epopeico do capítulo anterior para assumir de vez o conto de moral condenatória à curiosidade humana e o suplício sanguinolento que se segue. Depois de serem acordados antes do planejado por uma tempestade eletromagnética e perderem o seu capitão (James Franco, numa aparição bastante rápida), a tripulação da nave colonizadora Covenant decide por desviar de sua rota para investigar um estranho sinal captado em uma planeta da região, cujas condições parecem bastante propícias para receber a humanidade em plena expansão.

A promessa do paraíso sem surpresa se transforma em um inferno a ser vivido pelos personagens e os corpos mortos logo começam a aparecer, mas é justo nestes momentos de clímax que se percebe o quão distante está Scott daquilo ao qual ele se propõe realizar no filme. O que em Prometheus era um choque não planejado entre proposta e gênero se converte aqui numa cisão propriamente dita, com a ambição de seguir o debate de criador e criação percorrendo um caminho muito diferente do horror no qual este se situa. E esta ruptura fica ainda mais evidente na indecisão do diretor sobre qual dos lados se filiar, o que faz a produção entrar em verdadeiro parafuso narrativo.

Não demora muito, então, para que Alien: Covenant se solidifique como uma espécie de grande colagem da franquia, misturando os labirintos claustrofóbicos do original com o militarismo da sequência dirigida por James Cameron e a proposição aos questionamentos grandiloquentes de Prometheus. O filme parece disposto a agradar todos os tipos de públicos à partir desta mistura, mas não funciona porque Scott demonstra não estar afim de acrescentar algo de novo a ela: se a ação e o terror são burocratizados ao nível do desinteresse genuíno, com o primeiro realizado à base de cortes rápidos e planos escuros e o segundo relegado ao gore pós-ato de tripulantes indistintos - algumas mortes são escondidas pela câmera, como na cena do chuveiro -, o debate da criação é isolado do resto, o que torna suas insinuações ao horror um tanto quanto ridículas. Isso sem contar os desandamentos da narrativa, que amplifica a estupidez dos personagens (quem riu da burrice da tripulação de Prometheus vai se divertir bastante em Covenant) e aposta em reviravoltas ingênuas do fato de serem nada surpreendentes.

Se esta colagem mal planejada trai toda a versatilidade da série - que parece ter sobrevivido ao longo dos anos justo por causa de suas constantes transformações e incursões protagonizadas por diferentes cineastas -, o que ameniza todos estes problemas e se mantém como uma peça central para justificar todo o desastre em andamento é a figura de Michael Fassbender. Intérprete duplo dos androides David e Walter, o ator ocupa em Covenant um vácuo de protagonismo sentido nos personagens humanos - principalmente Katherine Waterston, prejudicada por um papel de sub-Ripley desimportante à trama, mas também Billy Crudup e Danny McBride - em simultâneo que dá legitimidade às ambições de Scott com estes prelúdios, até porque seus androides carregam a frieza temida e desejada por seus criadores humanos em sua eterna busca por respostas.

Mas o fato de Fassbender ser a essa altura o único a carregar nas costas a história é também um indício do quão fora da rota está Ridley Scott e a franquia, cuja temática central do horror sempre permaneceu intrínseca a questões maternais. Se o embate entre a Ripley de Sigourney Weaver com os xenomorfos (de certa forma carregado depois em Prometheus com Noomi Rapace) foi o motor que embalou os quatro primeiros Alien e permitiu suas consequentes metamorfoses, a figura masculina de David, por mais bem localizada que esteja em sua maleficência, tende a relativizar tudo o que foi proposto sem um elemento de contraste adequado no mesmo ritmo que Alien: Covenant se afunda na banalidade de seus atos, personagens e condenações.

Nota: 4/10

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