domingo, 23 de outubro de 2016

Crítica: A Criada

Diretor de Oldboy faz mais uma obra de perversidade, agora de significações mais complexas.

Por Pedro Strazza.

De início, A Criada é um filme que ensaia combinar temas complexos. O novo trabalho de Park Chan-wook situa-se, afinal, na Coréia dos tempos de ocupação japonesa, um cenário histórico por si só de amplas possibilidades, e sua trama de romance entre duas mulheres tende a ocupar esse espaço político de rivalidade com naturalidade. Mas como qualquer obra de Chan-wook que se preze, essa estrutura esconde algo que vai muito além das aparências.

Baseado no livro homônimo de Sarah Waters, o longa acompanha a história de Sook-Hee (Tae Ri Kim), uma experiente e pobre vigarista coreana que é enviada por seu superior (Ha Jung-woo) para ser criada de Lady Hideko (Kim Min-hee), herdeira de uma grande riqueza. O plano é simples: criando intimidade com sua senhora, ela facilitaria os planos do golpista - disfarçado sob o nome de Conde Fujiwara - de dar o golpe do baú na mulher, casando-se com ela para depois trancá-la no hospício e ficar com o dinheiro. Sook-he, porém, começa a se apaixonar por Hideko, simpatizando com sua tristeza por estar isolada da sociedade pelo tio (Jo Jin-woong), que também planeja se casar com ela por motivos financeiros.

A partir deste ponto não vale a pena entrar em maiores detalhes da trama, até porque o filme se faz bastante em cima das sucessivas reviravoltas que produz. O que pode ser dito é que Chan-wook realiza aqui mais uma obra de intenções lúdicas, que se estrutura em cima de uma dinâmica repleta de perversidades sexuais e constantemente brinca com flashbacks e noções de duplos - no primeiro ato isso fica menos evidente, mas está presente no viés de O Príncipe e o Mendigo lésbico da amizade entre Sook-Hee e Hideko - para desestabilizar o público.

O ambiente é bastante propício ao diretor, cujo cinema já é conhecido por obras que tem no choque seu principal chamariz, mas A Criada acaba por sofrer abalos justo nisso que é seu ponto mais forte. Preocupado em traduzir para a tela a sua complexa rede de intrigas e traições, o longa não dá conta de manter em foco as temáticas manifestadas nas relações de dominação (seja sexual ou política) dos personagens, o que esvazia a trama de um impacto simbólico e a torna refém de suas viradas. A preocupação em não deixar ponto sem nó é tão grande que no fim ele se dedica somente a isso.

Não que A Criada se faça como um filme efetivamente vazio, de puro ludismo disfarçado de falsos significados; Chan-wook sabe manter o básico da coerência das questões propostas, até porque elas estão inseridas em seu jogo de perversidades e potencializam sua proposta - a relação das duas protagonistas, por exemplo, não deixa de emular a situação política da época nos momentos mais, vamos dizer, intensos. A dúvida é se a produção tem consciência do desenvolvimento natural dessa mecânica no roteiro (e portanto se deixar guiar por ela como forma de aumentar o impacto) ou se ela a possui como mero acessório de luxo.

Nota: 7/10

0 comentários :

Postar um comentário