sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Crítica: Venom

Venom é tosco, mas, sem hipocrisia, permanece fiel às origens do personagem.

Por Alexandre Dias.

O mercado do cinema de super-heróis está passando por uma fase semelhante a que os quadrinhos viveram pós Watchmen e O Cavaleiro das Trevas. Não é mais uma novidade, então há uma saturação natural, e o modo de pensar dos produtores se assemelha muito à indústria dos gibis nos anos 90; pensar que características adultas, muito visual ou, como é o caso, foco nos vilões e anti-heróis sejam uma espécie de subversão, sendo assim o caminho, segundo estes sujeitos. 

Esquadrão Suicida provou isso ao não apenas colocar vilões na posição de heróis, mudando a essência dos personagens, como por reciclar os vícios e tendências do momento (“Ah vamos fazer o nosso Guardiões da Galáxia”). Venom tem praticamente todos esses aspectos preguiçosos, porém se salva por não ser um projeto hipócrita, criando o mínimo de respeito para com os seus próprios elementos e o espectador, que em nenhum momento é enganado sobre o que está diante dele. 

O motivo da existência do simbionte está totalmente atrelado ao Homem-Aranha, portanto um longa solo dele não teria razão de acontecer. De fato, não tem. E sim, a sua nascença só ocorreu porque a Sony não tem mais como trabalhar com o universo do Cabeça de Teia , ao qual lhe pertence. Estaríamos em paz sem essa produção? Sim. Contudo, já que ela foi concebida, o sentido desse novo mundo está relacionado com a sua proposta e o seu material. Ambos são minimamente bem colocados.

A química de Eddie Brock (Tom Hardy) com o alienígena justifica tudo com o seu jeito caricato de ser. O ridículo (às vezes além da conta) é proposital, o que acaba por tornar aceitável uma falta de complexidade e até de lógica. É um parasita gigante que encontra o seu hospedeiro ideal em um fracassado. E pronto. Não há rodeios, logo o bizarro que é a zombaria que um faz com o outro, ou mesmo o apego dos dois, passa a se transformar no trunfo do filme, com alguns deslizes exagerados espalhados, é claro.

Vejamos o roteiro de Jeff Pinkner, Scott Rosenberg e Kelly Marcel. É a mesma linha tradicional e clichê da história de origem, sem nada muito significante a ser notado. Entretanto, consegue-se compreender porque Venom escolheu Brock e Riot concentrou-se em Carlton Drake (Riz Ahmed). No final, a bobeira não é cercada de uma bagunça, como ocorreu com os vilões da DC em 2016. Nem por isso a atração principal deixa de ser o simbionte, o resto é mais do que esquecível: a ex que volta à cena – é impossível, até para quem conseguiu aceitar a galhofa, decidir se aquele beijo foi uma boa decisão ou não -, o empresário ganancioso, os coadjuvantes amiguinhos, etc.

Inclusive, muito deste tom excêntrico se deve ao diretor Ruben Fleischer. Acostumado com a comédia, ao exemplo de Zumbilândia, ele varia entre o sarcasmo e o humor tradicional dos blockbusters. Dessa forma, o cineasta acaba forçando a barra em alguns pontos, mas sem precisar se prestar a uma determinada obrigação, como uma referência a Peter Parker ou algo do tipo. Tom Hardy é igual. O Brock dele é (pasmem) um cara simpático no início, mas é surreal o modo que ele encarna a dupla personalidade com o monstro, tanto pelo bem como pelo mal.

A ação também sofre desse extremismo que depende de uma possível aceitação. Quase inteiramente cercadas de CGI, há uma cara de trash onde o tosco é a salvação. Riot e suas habilidades bizarras são a prova viva disso. Percebe-se que não estamos vendo algo bonito, porém há uma beleza nesse entulho, não observada em Deadpool 2, por exemplo – ver Venom, com todo o seu poder, em ação é muito mais legal do que Cable ou Colossus. 

Um projeto como Venom só poderia dar certo se fosse algo muito ousado e fora dos padrões do gênero. Só o fator de ser PG 13 (classificado como para maiores de 13 anos nos Estados Unidos) já indica um pouco que não é isso. No entanto, mesmo com esse molde genérico, o longa-metragem do simbionte tem uma identidade caricata viva, que já o põe em uma posição interessante como um filme de vilão. A possível sequência com o Carnificina e outros projetos de tal seguimento, como a futura origem do Coringa, dificilmente conseguirão se estabilizar na indústria com ideias que funcionam aos trancos e barrancos dessa maneira, mas, pela primeira vez, acredito que alguma coisa
possa sair desse mato sem cachorro.

Nota: 6/10

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