Sexto capítulo da série enfim acerta o tom, mas recorre de novo ao passado.
Por Pedro Strazza.
Talvez seja por isso que X-Men - Apocalipse, sexto episódio de uma história já com nove longas, sirva a Singer (pela quarta vez no comando de uma produção da série) e o roteirista Simon Kinberg (em sua terceira participação) ao mesmo tempo como uma espécie de recomeço e última tentativa na franquia, uma forma de tentar impor de uma vez por todas às histórias dos mutantes um tom pelo qual estes possam ser conduzidos satisfatoriamente agora e no futuro. A solução encontrada pela dupla foi a de recorrer aos quadrinhos, e o resultado, pelo menos no que consta a essa questão, é bastante agradável.
Já se percebem as pequenas mudanças na proposta da grande ameaça a ser enfrentada pela escola de seres extraordinários de Charles Xavier (James McAvoy), o todo-poderoso Apocalipse (Oscar Isaac) do título. Na trama, depois de voltar à vida, o vilão ancestral quer destruir o mundo e retomá-lo, e para isso escolhe quatro mutantes - Magneto (Michael Fassbender), Tempestade (Alexandra Shipp), Psylocke (Olivia Munn) e Anjo (Ben Hardy) - para serem seus cavaleiros. Com Xavier sequestrado pelo ser e seus asseclas, resta a Mística (Jennifer Lawrence), Fera (Nicholas Hoult) e a agente Moira Mactaggert (Rose Byrne) liderar o restante do grupo nos esforços de derrotar o primeiro mutante.
Singer e Kinberg não escondem aqui que bebem bastante do tipo de narrativa usado e consagrado por Chris Claremont em sua extensa fase com os mutantes nos quadrinhos, incorporando o didatismo intercalado em múltiplos núcleos do autor para conseguir proporcionar o espaço necessário a todos os envolvidos em sua trama de ambições grandiloquentes. O lado bom disso é que nessa abordagem o diretor também parece assemelhar bem o porquê de Claremont propor tal dinâmica nos gibis, que é o de levar a ligação entre personagem e espectador/leitor como objetivo central das histórias.
Nesse ponto, em que a elaboração e o desenvolvimento dos personagens se faz tão vital, o filme encontra seus melhores momentos apesar dos tropeços ocasionais. Existe no longa um equilíbrio bastante delicado e preciso entre os arcos daqueles que já foram apresentados e seguem seu curso natural - os testes de fé de Xavier, o conflito emocional de Magneto, a sensação de não pertencimento a lugar nenhum de Mística - e os que estão sendo apresentados - a dinâmica dos jovens e excluídos Ciclope (Tye Sheridan), Jean Grey (Sophie Turner) e Noturno (Kodi Smit-McPhee), a melhor parte deste capítulo - que soa inédito e funciona muito bem como motor central da história. O diretor aqui deixa de lado uma visão dos mutantes como simples peças de um espetáculo superpoderoso (seu norte em suas outras três incursões pela série) para abraçar os perfis individuais de cada um, privilegiando as relações entre os elementos em detrimento do maravilhamento do público com seus dons. Um bom exemplo dessa tendência é o crescimento da participação de Mercúrio (Evan Peters), que mesmo protagonizando de novo mais uma (fantástica) cena de exibição de suas habilidades com velocidade ganha toques dramáticos em sua jornada em busca do pai.
Mas se por um lado o longa revigora a franquia na visão sobre os personagens, a maneira como ele os usa no plano geral não poderia estar mais desgastada. Embora ofereça um tipo diferente de ameaça no papel, Singer repete com Apocalipse a mesma alegoria dos mutantes como judeus e o Holocausto que já trata desde o primeiro X-Men, agora sob uma ótica religiosa que não se justifica de forma plena e dá a sensação de uma repetição enfadonha. As interações entre Magneto e o vilão, por exemplo, são usadas por Kinberg como interessante elemento central da evolução da trama e da pretensa relação entre Deus e homem, mas soa antagônico com o objetivo de aproximar espectador da história por soar desconexo por completo da realidade do público ao qual tanto busca se encaixar. A História do mundo dos X-Men avança a passos largos, mas ainda tem-se a necessidade de recorrer à mesma cena de Magneto, seus pais e o portão entortado de Auschwitz para reforçar um trauma superado por todos os envolvidos.
Essa falta de conciliação entre o antigo e o novo são o que levam o filme a se fragmentar, mesmo este sendo capaz de evitar o piripaque e manter tudo mais ou menos unido até o fim. O curioso são as discrepâncias ocasionais, algo do qual X-Men vive no cinema agora como algo comum: a destruição apocalíptica do mundo que em nada se equivale ao teor do clímax concentrado do terceiro ato (e lembra bastante Cavaleiros do Zodíaco na forma como põe mocinhos e vilões para se enfrentar), a macroescala que em nada se conecta com a micro, o drama dos mutantes que soa distante e ocasionalmente palaciano ao restante dos humanos... se em Primeira Classe e Dias de um Futuro Esquecido estes eram problemas rasos, Apocalipse os aprofunda em suas metas de buscar mais das relações e dos arcos em evidência.
E isso não é um problema, a bem da verdade. Os objetivos de Singer em X-Men - Apocalipse são nobres e bastante benéficos neste afã de (parafraseando o antagonista da vez) desbloquear o potencial dos personagens como reflexo da realidade e fonte de boas histórias, mas mais do que nunca está evidente o quão necessário é a iniciativa de realizar essa busca e, em simultâneo, o quão presa no passado a franquia se encontra no momento. Com Apocalipse, os mutantes estão efetivamente prontos para o mundo de hoje e seus temas. O que falta agora é dar o primeiro passo.
Singer e Kinberg não escondem aqui que bebem bastante do tipo de narrativa usado e consagrado por Chris Claremont em sua extensa fase com os mutantes nos quadrinhos, incorporando o didatismo intercalado em múltiplos núcleos do autor para conseguir proporcionar o espaço necessário a todos os envolvidos em sua trama de ambições grandiloquentes. O lado bom disso é que nessa abordagem o diretor também parece assemelhar bem o porquê de Claremont propor tal dinâmica nos gibis, que é o de levar a ligação entre personagem e espectador/leitor como objetivo central das histórias.
Nesse ponto, em que a elaboração e o desenvolvimento dos personagens se faz tão vital, o filme encontra seus melhores momentos apesar dos tropeços ocasionais. Existe no longa um equilíbrio bastante delicado e preciso entre os arcos daqueles que já foram apresentados e seguem seu curso natural - os testes de fé de Xavier, o conflito emocional de Magneto, a sensação de não pertencimento a lugar nenhum de Mística - e os que estão sendo apresentados - a dinâmica dos jovens e excluídos Ciclope (Tye Sheridan), Jean Grey (Sophie Turner) e Noturno (Kodi Smit-McPhee), a melhor parte deste capítulo - que soa inédito e funciona muito bem como motor central da história. O diretor aqui deixa de lado uma visão dos mutantes como simples peças de um espetáculo superpoderoso (seu norte em suas outras três incursões pela série) para abraçar os perfis individuais de cada um, privilegiando as relações entre os elementos em detrimento do maravilhamento do público com seus dons. Um bom exemplo dessa tendência é o crescimento da participação de Mercúrio (Evan Peters), que mesmo protagonizando de novo mais uma (fantástica) cena de exibição de suas habilidades com velocidade ganha toques dramáticos em sua jornada em busca do pai.
Mas se por um lado o longa revigora a franquia na visão sobre os personagens, a maneira como ele os usa no plano geral não poderia estar mais desgastada. Embora ofereça um tipo diferente de ameaça no papel, Singer repete com Apocalipse a mesma alegoria dos mutantes como judeus e o Holocausto que já trata desde o primeiro X-Men, agora sob uma ótica religiosa que não se justifica de forma plena e dá a sensação de uma repetição enfadonha. As interações entre Magneto e o vilão, por exemplo, são usadas por Kinberg como interessante elemento central da evolução da trama e da pretensa relação entre Deus e homem, mas soa antagônico com o objetivo de aproximar espectador da história por soar desconexo por completo da realidade do público ao qual tanto busca se encaixar. A História do mundo dos X-Men avança a passos largos, mas ainda tem-se a necessidade de recorrer à mesma cena de Magneto, seus pais e o portão entortado de Auschwitz para reforçar um trauma superado por todos os envolvidos.
Essa falta de conciliação entre o antigo e o novo são o que levam o filme a se fragmentar, mesmo este sendo capaz de evitar o piripaque e manter tudo mais ou menos unido até o fim. O curioso são as discrepâncias ocasionais, algo do qual X-Men vive no cinema agora como algo comum: a destruição apocalíptica do mundo que em nada se equivale ao teor do clímax concentrado do terceiro ato (e lembra bastante Cavaleiros do Zodíaco na forma como põe mocinhos e vilões para se enfrentar), a macroescala que em nada se conecta com a micro, o drama dos mutantes que soa distante e ocasionalmente palaciano ao restante dos humanos... se em Primeira Classe e Dias de um Futuro Esquecido estes eram problemas rasos, Apocalipse os aprofunda em suas metas de buscar mais das relações e dos arcos em evidência.
E isso não é um problema, a bem da verdade. Os objetivos de Singer em X-Men - Apocalipse são nobres e bastante benéficos neste afã de (parafraseando o antagonista da vez) desbloquear o potencial dos personagens como reflexo da realidade e fonte de boas histórias, mas mais do que nunca está evidente o quão necessário é a iniciativa de realizar essa busca e, em simultâneo, o quão presa no passado a franquia se encontra no momento. Com Apocalipse, os mutantes estão efetivamente prontos para o mundo de hoje e seus temas. O que falta agora é dar o primeiro passo.
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