Woody Allen faz mais do mesmo sem dar ar de graça.
Por Pedro Strazza.
Existe uma cena em Homem Irracional que além de fundamental para o encaminhamento da história serve também para entender o espírito geral do filme. Nela, os dois protagonistas da história, interpretados por Joaquin Phoenix e Emma Stone, discutem questão existencialistas em um restaurante quando, desgastados pela conversa, passam a escutar o diálogo dramático que acontece na mesa ao lado e envolve a disputa pela custódia de um filho e a posição desumana adotada pelo juiz titular no processo.
Esse aparente desinteresse pelos dramas vividos pelos personagens principais parece acompanhar desde o início até o fim da trama deste novo trabalho de Woody Allen. Equilibrado em uma história de propósitos já muito conhecidos do cinema, o longa usa sem qualquer inspiração de seus clichês em um ritmo aborrecido, como se estivesse pronto para se encerrar mesmo antes do fim do primeiro ato. As consequências, claro, são bastante negativas, mas isso não impede que a obra inclua uma boa ideia em algum momento da narrativa.
Escrito e dirigido por Allen, o filme conta a história de Abe Lucas (Phoenix), aclamado professor de filosofia que, envolto em uma depressiva crise existencial capaz até de influenciar em suas performances sexuais, começa a dar aulas em uma pequena universidade. Com um ar depressivo e pessimista, ele se envolve romanticamente com uma outra professora do campus (Parker Posey) e uma de suas alunas, a jovem Jill (Stone) em busca de alguma solução para seu problema sem alcançar qualquer sucesso. Tudo muda, porém, quando ele entra em um restaurante com Jill e acaba no momento descrito acima.
Sem surpresas, Allen repete aqui muitos elementos, temas e discussões que já abordou em outros filmes, mas dessa vez sem maior inspiração. O debate sobre os prazeres do racional e do irracional, central à obra, parece uma mistura dos questionamentos levantados em Magia ao Luar e no fraco Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos sem acrescentar nada ao mostrado nestes longas, e isso repercute em toda a estrutura adotada. Não à toa, o alter-ego da vez do cineasta soa genérico em essência, quase um vazio criativo comparado a outros personagens no qual ele incorporou sua personalidade - que Phoenix, claro, nada pode fazer para ajudar.
Por outro lado, Homem Irracional traz em sua mediocridade um olhar minimamente interessante sobre construção de personagem na narrativa elaborada, justo nesta cena em que escuta a conversa no restaurante. A virada pela qual Abe, o dito protagonista da trama, promove em sua vida parte de um ato que não veio a seu encontro e sim foi vazado de um terceiro, e seus esforços em razão do evento são direcionados para esse desconhecido. Sua felicidade provinda daí, decisiva para que ele consiga ganhar o gosto pela vida mais uma vez e tenha algum objetivo nesta, portanto, vem de uma ação típica de uma figura coadjuvante, e põe em questão toda a sua centralidade no roteiro. Consciente desse viés, Allen (com a ajuda do diretor de fotografia Darius Khondji) mostra interesse em ora ou outra apresentar o professor numa posição de distância, rodeado por uma natureza que parece o engolir em sua beleza.
Dominado por arcos que parecem dar voltas e voltas para chegar a lugar algum (o vivido pela personagem de Stone de longe sendo o pior), Homem Irracional não é nem de perto uma abominação ou um trabalho execrável de Woody Allen. O filme, entretanto, prova ser o longa mais desinteressante do diretor, já que é incapaz de fazer algo mais elaborado de uma história no fim tão previsível e sem graça.
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