Não é espetacular, mas está no caminho certo para ser
Por Pedro Strazza
Quando foi adaptado para os cinemas pelas mãos de Sam Raimi, essa construção heroica do personagem se manteve com esplendor. Apesar de ter tropeçado feio no terceiro capítulo, o diretor de Evil Dead manteve no roteiro de seus filmes a índole presente em toda a trajetória de Peter Parker nos quadrinhos, intercalando a isso conflitos e combates que se encaixavam perfeitamente nas situações apresentadas na primeira trilogia. E no momento em que a Sony resolveu realizar um reinício à saga do Amigão da Vizinhança, fãs antigos e novos (estes últimos majoritariamente formados pelos longas originais) temeram ver nas telas uma versão incoerente do vigilante nas telas - temores que só aumentaram com o resultado mediano de O Espetacular Homem-Aranha, perdido em meio a uma proposta dark e incoerente ao protagonista.
O desafio proposto ao diretor Marc Webb e os roteiristas Jeff Pinkner, Roberto Orci e Alex Kurtzman para essa continuação, portanto, seria o de entregar ao público uma versão psicológica de Parker mais próxima de seu original nos quadrinhos do que visto na primeira tentativa do reboot. Para isso acontecer de fato, seriam necessários correções em todos os defeitos - A leitura rasa de Parker, a questão envolvendo os pais, etc. - e ajustes nos acertos do início da franquia - a química do casal principal, as adaptações diretas dos quadrinhos, etc. Além disso, a equipe criativa tinha que, a mando dos desejos financeiro do estúdio, estabelecer conexões para os futuros filmes derivados da franquia, mais especificamente a existência do Sexteto Sinistro.
Com tantos afazeres a serem feitos, pode-se afirmar que o resultado obtido por Pinkner, Orci, Kurtzman e Webb em O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro não é de todo perfeito, mas pelo menos bota o reboot no caminho certo. Divertido e dramático na medida certa, a sequência peca por abordar ao mesmo tempo duas tramas completamente distintas entre si e nada complementares, mas acerta ao manter um ritmo constante e empolgante à história que quer contar.
Mas se na imagem o filme abandona a trilogia de Christopher Nolan, no roteiro ela ainda insiste parcialmente em utilizá-la como base. Principalmente no último ato, a produção usa (e abusa) de estruturas presentes em O Cavaleiro das Trevas e O Cavaleiro das Trevas ressurge - os inocentes postos indiretamente em perigo, a falsa sensação de vitória, o surgimento de um inimigo ainda mais poderoso, por aí vai - para conferir maior dramaticidade aos eventos, o que colide diretamente com o tom mais "leve" adotado e torna a experiência em um verdadeiro "cabo de guerra". Esse confronto de linhas narrativas fica ainda mais claro quando se analisa os dois grandes vilões e seus desenvolvimentos pessoais na trama: Se Harry Osborn (Dane DeHaan) realiza uma trajetória complexa (até onde é possível) de transformação psicológica para se tornar o Duende Verde, Max Dillon é um personagem de perfil extremamente superficial e estereotipado em sua evolução para Electro.
No centro desta confusão há ainda a relação entre Parker e Gwen Stacy, carregada do primeiro filme e novamente bem elaborada pelo diretor. Interpretados com carisma por Andrew Garfield e Emma Stone, o casal passa por crises ainda maiores devido à promessa que Peter fez ao falecido pai de sua namorada, tornando seus diálogos autorreferentes e fofos ainda mais interessantes. Aqui, a direção de Webb, aliada às performances dos atores, se faz fundamental, visto que o relacionamento dos dois é central para a trama e o desenvolvimento psicológico do protagonista como pessoa e super-herói.
A personalidade de Peter, por outro lado, mudou bastante do filme de 2012 para esse. Dividido entre uma personalidade hipster e nerd no primeiro capítulo, a produção abraça de vez aqui a primeira persona, mas não se esquece de manter (ou melhor, adaptar) as características do Homem-Aranha elaborado por Stan Lee em 1962, tais como o humor que descarrega nos vilões e o lado loser para relacionamentos, com o cuidado necessário.
Com final bombástico (mas prejudicado por uma conexão nada sutil com o Sexteto Sinistro) e ação veloz - Como Andrew Garfield bem disse em entrevistas, o Homem-Aranha nunca esteve tão Pernalonga -, O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro se constitui como um bom passo para o sucesso qualitativo da franquia. Ao eliminar tramas e defeitos desnecessários e adicionar interessantes ingredientes à mistura, o filme estabelece nos cinemas um novo Peter Parker, mas próximo da psicologia de sua versão original nos quadrinhos. Ainda há muito a ser feito na trajetória deste Homem-Aranha hipster, é claro, mas já se vê aqui algum progresso real.
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