Problemas anteriores atrapalham última temporada, mas não o final da série
Por Pedro Strazza
Dentre as mais variadas maneiras de se fazer humor na televisão, a sitcom é decididamente a mais difícil de se fazer. Originadas do rádio, as situation comedies (comédias de situação) necessitam de um pesado trabalho de equipe para darem certo e marcar de alguma maneira o público, o que inclui nesse processo um elenco bem escolhido, uma produção organizada e, principalmente, um bom roteiro. Sem qualquer um destes elementos, seriados desse tipo acabam por ser cancelados e logo esquecidos; mas se, por outro lado, possuírem todos estes quesitos, o sucesso está há poucos metros de ser alcançado. Dos últimos, os dois exemplos mais recentes e lembrados são, obviamente, Friends e Seinfeld, as grandes representantes dos tempos áureos das sitcoms nos Estados Unidos dos anos 90 e inspirações para inúmeras séries nos anos seguintes.
How I Met Your Mother é com certeza a "filha de Friends" mais pródiga. Lançada praticamente um ano depois do fim de sua ascendente, o seriado sobre como o arquiteto Ted (Josh Radnor) conheceu sua esposa angariou desde seu início uma legião de seguidores, graças a não só pela curiosidade em conhecer a tal "Mãe" do título, mas também por causa de seu humor peculiar e de saltos de qualidade cada vez maiores em seus episódios. Criando elementos marcantes a cada novo capítulo, não demorou muito para que o espectador começasse a ver ali a concepção de uma "mitologia", fosse nas ações banais do excêntrico Barney (Neil Patrick Harris) ou nos diálogos do próprio grupo.
O sucesso da série, porém, não foi para sempre alto. Talvez pela notável esticada na série (a emenda da aposta dos tapas e as excessivas idas e vindas de Ted e Robin são claros nesse ponto), talvez pela dificuldade em manter o nível qualitativo lá em cima, How I Met Your Mother foi sofrendo altos em baixos maiores à cada nova temporada, tornando difícil para os fãs conseguirem ver a trajetória dos cinco amigos. Adiar o inevitável final não foi nada saudável, seja em termos financeiros ou artísticos.
E o fim finalmente veio, mas de forma ligeiramente ambiciosa para os padrões da série. Para a nona e última temporada, os criadores Craig Thomas e Carter Bays resolveram narrar, durante 24 episódios, os preparativos e o casamento de Barney e Robin (Cobie Smulders), que acontecem em apenas um final de semana. Complicada, essa estratégia poderia ser um desastre completo sem o cuidado prévio dos roteiristas, já que o final de uma série tão longeva - são nove anos já! - estava em jogo.
Mas mesmo que se compondo inicialmente como uma aposta perigosa, a grande verdade é que a última temporada superou com tranquilidade o material apresentado na sétima e oitava temporadas. Apesar de lenta em seu início, o nono ano de How I Met Your Mother soube deixar de lado as tentativas de conquistar um maior público na reta final para privilegiar seu público remanescente, através das inúmeras referências a episódios marcantes do passado e amarrando eventuais pontas soltas de seu longo caminho até o casamento em Farmhampton. O melhor dessa abordagem, entretanto, não seu deu por causa das inserções, mas sim pela maneira sutil como elas foram colocadas, sem fazer nenhuma explicação a novos espectadores.
Ainda sim, o ano nove não se esqueceu de criar novos elementos à série em prol de uma experiência saudosista. Ao mesmo tempo em que via-se o retorno de certos personagens, momentos e regras estabelecidas anteriormente, o espectador também testemunhou aqui o surgimento de bordões como o "Thank you, Linus" de Lily (Alyson Hannigan) e situações cômicas como a disputa pelo cargo de padrinho, que duraram aqui mais tempo que o costumeiro um episódio pela estrutura do roteiro da temporada - afinal, não se pode se esquecer o que fez há menos de uma hora. Aliando criatividade e nostalgia, os 24 episódios se tornaram assim mais interessantes e divertidos que o que vinha sendo exibido até então, um alívio para o público.
How I Met Your Mother não possui, porém, apenas um lado cômico, e a história de Ted, Marshall (Jason Segel), Lily, Barney e Robin e seus respectivos arcos dramáticos precisavam ser encerrados de maneira no mínimo satisfatória. Além disso, a nona temporada tinha como agravante nesse quesito a adição da própria Mãe (Cristin Milioti), que precisava ser introduzida e desenvolvida no curso final da história.
Neste ponto, cabe dizer que a temporada foi prejudicada em vários momentos pelo próprio curso da série. A "crise" final no casamento de Marshall e Lily, envolvendo agora o conflito de projetos futuros dos dois, perdeu força aqui por causa da esticada precipitada e mal planejada da série, coisa que também afetou seriamente o amadurecimento pessoal final de Barney. A questão do medalhão de Robin e a partida de Ted para Chicago, por outro lado, são fracas se pensarmos que o casamento vai dar certo no final e que ele enfim conhecerá a mulher.
Mas se How I Met Your Mother tropeça com seus personagens originais pela extensão desnecessária de seus dramas, ela acerta no desenvolvimento da Mãe, a sua mais nova peça na engrenagem. Inicialmente fazendo apenas pequenas aparições, a Sra. Mosby foi aos poucos sendo apresentada aos outros protagonistas, participando de momentos decisivos da vida de cada um deles (no presente ou no passado), e ao público, onde sua apresentação era vital para a conclusão da série. Crescendo em suas participações - principalmente nos flash-forwards, onde o espectador pode ver as suas interações futuras com o marido antes e depois de casados -, a esposa de Ted ganhou todos os holofotes enfim com o episódio How Your Mother Met Me - 16° do nono ano e 200° da temporada(!) -, onde sua vida nos oito anos em que a série se passa foi divulgada e o espectador pode entrar em contato com a personagem, conhecendo seu passado doloroso. Nesse ínterim, a atuação de Milioti se prova sutil para compor esse quadro sentimental, o que contribui ainda mais na simpatia da audiência com seu papel.
Ainda sim, o ano nove não se esqueceu de criar novos elementos à série em prol de uma experiência saudosista. Ao mesmo tempo em que via-se o retorno de certos personagens, momentos e regras estabelecidas anteriormente, o espectador também testemunhou aqui o surgimento de bordões como o "Thank you, Linus" de Lily (Alyson Hannigan) e situações cômicas como a disputa pelo cargo de padrinho, que duraram aqui mais tempo que o costumeiro um episódio pela estrutura do roteiro da temporada - afinal, não se pode se esquecer o que fez há menos de uma hora. Aliando criatividade e nostalgia, os 24 episódios se tornaram assim mais interessantes e divertidos que o que vinha sendo exibido até então, um alívio para o público.
How I Met Your Mother não possui, porém, apenas um lado cômico, e a história de Ted, Marshall (Jason Segel), Lily, Barney e Robin e seus respectivos arcos dramáticos precisavam ser encerrados de maneira no mínimo satisfatória. Além disso, a nona temporada tinha como agravante nesse quesito a adição da própria Mãe (Cristin Milioti), que precisava ser introduzida e desenvolvida no curso final da história.
Neste ponto, cabe dizer que a temporada foi prejudicada em vários momentos pelo próprio curso da série. A "crise" final no casamento de Marshall e Lily, envolvendo agora o conflito de projetos futuros dos dois, perdeu força aqui por causa da esticada precipitada e mal planejada da série, coisa que também afetou seriamente o amadurecimento pessoal final de Barney. A questão do medalhão de Robin e a partida de Ted para Chicago, por outro lado, são fracas se pensarmos que o casamento vai dar certo no final e que ele enfim conhecerá a mulher.
Mas se How I Met Your Mother tropeça com seus personagens originais pela extensão desnecessária de seus dramas, ela acerta no desenvolvimento da Mãe, a sua mais nova peça na engrenagem. Inicialmente fazendo apenas pequenas aparições, a Sra. Mosby foi aos poucos sendo apresentada aos outros protagonistas, participando de momentos decisivos da vida de cada um deles (no presente ou no passado), e ao público, onde sua apresentação era vital para a conclusão da série. Crescendo em suas participações - principalmente nos flash-forwards, onde o espectador pode ver as suas interações futuras com o marido antes e depois de casados -, a esposa de Ted ganhou todos os holofotes enfim com o episódio How Your Mother Met Me - 16° do nono ano e 200° da temporada(!) -, onde sua vida nos oito anos em que a série se passa foi divulgada e o espectador pode entrar em contato com a personagem, conhecendo seu passado doloroso. Nesse ínterim, a atuação de Milioti se prova sutil para compor esse quadro sentimental, o que contribui ainda mais na simpatia da audiência com seu papel.
O Último Capítulo e o Final de fato [SPOILERS]
Embora se passe na realidade, How I Met Your Mother sempre manteve um tom fantasioso para contar suas histórias - culpa, em parte, da linha narrativa em forma de memórias pelas mãos do comediante Bob Saget. Torna-se esquisito, portanto, a maneira realista com a qual o último capítulo foi feito, não dando exatamente aquilo que os fãs esperavam do encerramento de uma sitcom. E isso não é ruim; pelo contrário, merece palmas pela abordagem ousada e eficiente.
Além disso, este último episódio merece aplausos pelo foco total no destino de todos os seus personagens principais. É notável que todas as tramas estabelecidas na nona temporada foram encerrados no 22° episódio, The End of the Aisle, para que o series-finale ocorresse apenas entre os cinco amigos e a Mãe. Se reparar bem, até a própria cerimônia e seus preparativos são irrelevantes aqui, contribuindo ainda mais para a teoria de que as partes 1 e 2 de Last Forever já haviam sido escritas há muito tempo por Thomas e Bays.
E o primeiro grande acerto do episódio final decorre justamente do tom realista assumido, ao ser mostrado que o final "felizes para sempre" não aconteceu com o casal Barney e Robin. Desde o início da temporada (e da série, com algumas leves exceções), o público testemunhou que o casal, ao contrário de Lily e Marshall - e seus três bebês -, não conseguiria levar o casório para frente por muito tempo, seja pela incompatibilidade de perfis, seja pelos projetos pessoais de cada um. O mais eficiente, porém, foi mostrar que ambos se divorciaram sem qualquer um possuir ódio pelo outro, apesar dos eventuais ressentimentos - Robin não consegue ficar observando Barney dando em cima de mulheres mais novas, enquanto ele procura ignorar as saudades do grupo quanto ao afastamento dela da família.
A separação de Robin da turma é um ponto bastante interessante na composição do capítulo. Durante toda a nona temporada, o roteiro insistiu o tempo todo na partida de Ted para Chicago por causa dela e de seus sentimentos remanescente por ela. Mas quando a vida resolve sorrir de volta para Ted e ele inicia seu relacionamento duradouro com Tracy, a Mãe, torna-se insustentável para Robin conviver com o homem que uma vez a amou, fazendo com que ela se dedique inteiramente em seu trabalho - sua eterna rota de fuga da realidade e principal causa para o fim de seu casamento com Barney e da maioria de seus relacionamentos. E o mais curioso dessa passagem é que Robin retorna ao grupo justamente no casório de Ted, e não no nascimento da filha de Barney.
O encerramento do "Homem dos Ternos" foi, por sinal, extremamente bem trabalhado na composição do personagem. Depois que Barney encerra seu casório com Robin, ele retorna à rotina de Don Juan, e acaba cometendo a ação esperada há anos: Ele engravida uma mulher e tem uma filha. E, num gesto extremamente maravilhoso do roteiro, Barney declara à pequena Ellie seu amor incondicional que antes afirmara nunca mais possuir dentro de si. Saber se ele ficou ou não com a mãe de sua filha torna-se, assim, desnecessário, visto que sua paixão para sempre será pela criança.
Marshall e Lily são personagens que também não precisam ter seu futuro apresentado em Last Forever. Como a série inteira demonstrou, o casal foi feito um para o outro, e saber de sua felicidade conjunta já é o suficiente. Ainda sim, saber que Marshall virou juiz e do nascimento de um terceiro filho foram informações agradáveis aos fãs.
O maior objetivo da série, porém, era o de mostrar como Ted conheceu sua mulher, e isso foi feito com esplendor. Como comentei aqui, a nona temporada desempenhou bem sua função de apresentar Tracy ao público, e mostrar como eles se conheceram - e seu futuro feliz como casal - acabou por ser uma tarefa ligeiramente superficial.
Contar a história de como Ted e Tracy se conheceram, porém, poderia ter se tornado algo muito fraco com um "felizes para sempre", visto o caráter mais realista do episódio final em relação à série e que já havia um casal encaixado nesta categoria (formado, obviamente, por Marshall e Lily). A solução encontrada por Carter e Bays, então, foi a de matar a mulher de Ted, mas de preservar ainda o amor deste por ela - e criando uma belíssima comparação com a própria Tracy, que permaneceu fiel ao falecido noivo por anos graças à sua paixão por este -, tornando a narração da série em um livro de memórias dos mais interessantes.
Mas How I Met Your Mother não possuiria um encerramento digno com uma revelação tão drástica dos acontecimentos futuros de Ted. Faltava à série um arco a ser fechado. Desde o início da série aberto, o relacionamento confuso de Ted e Robin ditou praticamente todos os acontecimentos, e deixar ambos separados não faria sentido (apesar de merecido, graças à extensão totalmente errada da série). Como a filha de Ted, Penny, bem aponta quando seu pai termina a história, "Esta história não é sobre como você conheceu a mamãe, mas sim como você sempre teve tesão pela tia Robin!".
E tal como How I Met Your Mother bem nos ensinou, o amor não existe apenas uma vez. O ser humano se apaixona diversas vezes ao longo da vida, e nenhum desses amores que tem por uma pessoa desmerece a da outra. Quando Ted vai oferecer mais uma vez a Blue French Horn para Robin no final da série, portanto, ele encerra um ciclo longo de idas e voltas com ela, marcado por grandes desilusões e de grandes amores (Um bastante especial), mostrado pelos nove anos da série.
Mas principalmente de grandes - e apaixonantes - amores.
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