Conflito pesa no drama, mas encontra no humor seus melhores momentos.
Por Pedro Strazza.
No cinema, pelo menos, esse afastamento entre Marvel e DC (ou agora Disney e Warner, se preferir) fica mais claro na maneira como elas trabalham esta metodologia, e os carros-chefes das duas empresas em 2016 servem como bons exemplos para tal. Pois enquanto o confronto do Homem-Morcego com o Homem de Aço dirigido por Zack Snyder privilegia no embate o debate, criado em cima de como tais figuras se relacionam em diferentes campos e níveis de entendimento, a guerra entre Tony Stark (Robert Downey Jr.) e Steve Rogers (Chris Evans) é voltada pelos irmãos Anthony e Joe Russo para a aplicação direta, de maneira que tais imagens beneficiem o combate em peso e eficiência.
É uma forma mais prática de direcionar essas elaborações, e por isso mesmo depende muito de como os diretores irão executar isso na narrativa de fato. Como Joss Whedon nos dois Vingadores e James Gunn em Guardiões da Galáxia, os Russo entendem bem a importância e o peso daquilo que tratam quando abordam os diversos heróis em questão, e precisam encarar no fundo uma missão muito mais difícil que a dos outros dois cineastas: agora que as figuras estão estabelecidas, que caminho seguir com eles?
Pelo menos em Guerra Civil, a solução encontrada pelo irmãos para essa pergunta é a de contorná-la, de forma conveniente a seus propósitos mantendo em curso os rumos dados a esses personagens sem contudo interferir ou alterá-los de fato. Assim, para iniciar o conflito do título, a dupla de diretores e os roteiristas Christopher Markus e Stephen McFeely deixam intactas as imagens consagradas em filmes anteriores, preservando tanto o arco de rebeldia do Capitão América como o do empreendedor arrependido do Homem de Ferro, de forma que elas naturalmente se ponham em lados opostos do espectro de uma questão - aqui, a dos efeitos colaterais provocados pela ação dos super-heróis nas populações ao qual se empenham tanto em proteger.
Essa decisão, similar à de Whedon em A Era de Ultron (mas melhor executada) e que também afeta os outros vingadores presentes na briga, serve bem aos Russo na abordagem individual de cada personagem, pois permite a eles que alternem de ponto de vista constantemente sem provocar maiores instabilidades narrativas. Ao mesmo tempo, porém, a reles manutenção restringe seus movimentos de maiores ambições temáticas, privando-os de se aprofundarem mais nas possibilidades oferecidas na variedade dessas figuras, que tem na fácil conotação com a realidade o seu maior charme - a Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) sendo a garota problema, o Visão (Paul Bettany) o tio responsável, o Homem Aranha (Tom Holland) o millennial e por aí vai. O resultado, pelo menos em termos dramatúrgicos, é um novelão mexicano arrastado quando focado nesta tarefa de desenvolvimento, que centrado na dinâmica entre Stark, Rogers e Bucky Barnes (Sebastian Stan) abraça sem qualquer pingo de hesitação romances e amizades como estrutura principal.
Mas o que os diretores não tem de capacidade para lidar com o drama eles compensam na entrega do entretenimento, e é aí que Guerra Civil sai ganhando. É nos sets de ação que os irmãos Russo melhor resolvem sua abordagem, encontrando um equilíbrio difícil no longa entre a comédia e o peso do conflito (sentido pelos heróis conforme os dois lados brigam com aqueles antes considerados seus amigos) no reconhecimento inerente daqueles personagens como figuras de ação elementais, que, individualizados até o âmago de suas identidades, não mergulham tais momentos em nenhuma repetição logística enfadonha. A batalha no aeroporto, ápice do filme, é aonde essa experiência proposta é mais recompensadora e soa fluida, justamente porque assume para si a materialização do imaginário como modo de operação prioritário.
Mais uma consequência que parte do planejamento, essa materialização acaba por oferecer muito mais ao filme que o drama triangulado na relação dos dois protagonistas com o Soldado Invernal, em muitos momentos aspirante porém nunca tão trágico quanto gostaria. Mesmo que não queira quebrar o claro desbalanço entre a representação iconográfica glorificante e a gravidade das histórias a serem contadas, característica central de todas as produções da Marvel Studios (e sempre prejudicial a seus vilões), é perceptível em Capitão América - Guerra Civil uma tentativa de mexer de alguma maneira nesse status quo, que privilegie o estilo mais austero e deixe de lado a aparente "fórmula" da superficialidade dos filmes do estúdio.
O curioso disso é que enquanto os Russo, afim de obter maior sucesso e um revigoramento da fórmula, tentam injetar maior carga dramática na introdução do Pantera Negra (Chadwick Boseman) e na seriedade dos assuntos tratados - e eles até obtém algum sucesso parcial na interessante virada final da história -, quem lhes garante isso no fim é o humor, que melhor dosado enfim tem o espaço adequado para entreter. Alinhar e desprender isso de amarras tão supressoras é, então, a próxima tarefa a ser resolvida, seja pelos irmãos ou qualquer outro cineasta disposto a mexer em uma estrutura tão aclamada pelo público.
Pelo menos em Guerra Civil, a solução encontrada pelo irmãos para essa pergunta é a de contorná-la, de forma conveniente a seus propósitos mantendo em curso os rumos dados a esses personagens sem contudo interferir ou alterá-los de fato. Assim, para iniciar o conflito do título, a dupla de diretores e os roteiristas Christopher Markus e Stephen McFeely deixam intactas as imagens consagradas em filmes anteriores, preservando tanto o arco de rebeldia do Capitão América como o do empreendedor arrependido do Homem de Ferro, de forma que elas naturalmente se ponham em lados opostos do espectro de uma questão - aqui, a dos efeitos colaterais provocados pela ação dos super-heróis nas populações ao qual se empenham tanto em proteger.
Essa decisão, similar à de Whedon em A Era de Ultron (mas melhor executada) e que também afeta os outros vingadores presentes na briga, serve bem aos Russo na abordagem individual de cada personagem, pois permite a eles que alternem de ponto de vista constantemente sem provocar maiores instabilidades narrativas. Ao mesmo tempo, porém, a reles manutenção restringe seus movimentos de maiores ambições temáticas, privando-os de se aprofundarem mais nas possibilidades oferecidas na variedade dessas figuras, que tem na fácil conotação com a realidade o seu maior charme - a Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) sendo a garota problema, o Visão (Paul Bettany) o tio responsável, o Homem Aranha (Tom Holland) o millennial e por aí vai. O resultado, pelo menos em termos dramatúrgicos, é um novelão mexicano arrastado quando focado nesta tarefa de desenvolvimento, que centrado na dinâmica entre Stark, Rogers e Bucky Barnes (Sebastian Stan) abraça sem qualquer pingo de hesitação romances e amizades como estrutura principal.
Mas o que os diretores não tem de capacidade para lidar com o drama eles compensam na entrega do entretenimento, e é aí que Guerra Civil sai ganhando. É nos sets de ação que os irmãos Russo melhor resolvem sua abordagem, encontrando um equilíbrio difícil no longa entre a comédia e o peso do conflito (sentido pelos heróis conforme os dois lados brigam com aqueles antes considerados seus amigos) no reconhecimento inerente daqueles personagens como figuras de ação elementais, que, individualizados até o âmago de suas identidades, não mergulham tais momentos em nenhuma repetição logística enfadonha. A batalha no aeroporto, ápice do filme, é aonde essa experiência proposta é mais recompensadora e soa fluida, justamente porque assume para si a materialização do imaginário como modo de operação prioritário.
Mais uma consequência que parte do planejamento, essa materialização acaba por oferecer muito mais ao filme que o drama triangulado na relação dos dois protagonistas com o Soldado Invernal, em muitos momentos aspirante porém nunca tão trágico quanto gostaria. Mesmo que não queira quebrar o claro desbalanço entre a representação iconográfica glorificante e a gravidade das histórias a serem contadas, característica central de todas as produções da Marvel Studios (e sempre prejudicial a seus vilões), é perceptível em Capitão América - Guerra Civil uma tentativa de mexer de alguma maneira nesse status quo, que privilegie o estilo mais austero e deixe de lado a aparente "fórmula" da superficialidade dos filmes do estúdio.
O curioso disso é que enquanto os Russo, afim de obter maior sucesso e um revigoramento da fórmula, tentam injetar maior carga dramática na introdução do Pantera Negra (Chadwick Boseman) e na seriedade dos assuntos tratados - e eles até obtém algum sucesso parcial na interessante virada final da história -, quem lhes garante isso no fim é o humor, que melhor dosado enfim tem o espaço adequado para entreter. Alinhar e desprender isso de amarras tão supressoras é, então, a próxima tarefa a ser resolvida, seja pelos irmãos ou qualquer outro cineasta disposto a mexer em uma estrutura tão aclamada pelo público.
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