Produção francesa embarca no atual conflito ideológico do país por sua via mais discursiva.
Por Pedro Strazza.
Embora a rápida colagem de entrevistas sobre a retórica que serve de prólogo à produção acene para a possibilidade de tornar o discurso um tema de debate, O Orgulho no fundo está menos interessado na construção e metodologia das discussões que se dão ao longo da história que na possibilidade de trabalhar o confronto entre conservadorismo e liberalismo que ocorre na sociedade francesa, um tópico vital aos caminhos do país e da Europa nos dias de hoje. Cada vez mais recorrente no cinema francês por estar presente em quase todas as suas questões político-sociais, o assunto é aproveitado pelo diretor Yvan Attal no filme sob um teor subjetivo, mas presente desde o início nos conflitos entre seus dois protagonistas, uma estudante de direito pobre e descendente de árabes (Camélia Jordana) e seu professor reacionário e de argumentação quase sempre preconceituosa em sala de aula (Daniel Auteuil).
Se este duelo começa instigante por conta de seu contexto histórico e o verniz discursivo que assume com rapidez - algo inaugurado no longa sob uma discussão tensa em sala de aula por conta de um atraso da aluna e depois tornado recorrente conforme o professor, querendo evitar a demissão, se vê forçado a ensinar à nova pupila sobre os pormenores da retórica - ele também ganha consistência pela fachada que não demora a incorporar no esforço de tocar o debate pelas vias literais deste discurso. Como todo diretor emergido de uma relativa bem-sucedida carreira de atuação, Attal trabalha a narrativa com interesse maior pelas questões de atuação que pela encenação em si, uma medida que se a princípio favorece apenas o trabalho dos dois atores depois se revela feita para privilegiar os diálogos, cuja escrita joga em cima destas duas ideologias antagônicas e em suas consequentes desconstruções conforme o contato entre os dois personagens se prolonga.
Neste sentido, a produção não demora a lembrar A Trama, outro longa francês que tinha nas discussões o motor principal para promover o choque de pessoas de origens e realidades completamente distintas. É uma comparação também capaz de ajudar a melhor compreender o que impede o trabalho de Attal de obter um resultado similar de qualidade: se o filme de Laurent Cantet via no embate entre a professora esquerdista e o aluno de flerte com a extrema-direita um espaço para discutir o atual clima de extremos do cenário, a relação pouco amigável que norteia os movimentos de O Orgulho aos poucos se revela confortável para fazer a opção pelo drama de relações tradicional e disposto a conciliações, uma medida que sai cara a quaisquer intenções ambicionadas pelo projeto quando ele se vê na incômoda tarefa de fazer a aluna liberal "passar pano" para o professor preconceituoso afim de ter seu final feliz.
Mas enquanto que os debates entre os dois protagonistas aos poucos vão descambando para as soluções óbvias e novelescas, o filme acaba se mantendo mais ou menos unido graças à dinâmica de Jordana e Autuil, que mesmo preso a papéis clichês sabem como tornar seus embates fluidos. A direção conformada em fazer o trivial e o roteiro escrito a quatro mãos (além de Attal, também colaboram no texto Noé Debré, Victor Saint Macary e Yaël Langmann), porém, ajudam a sedimentar no longa a noção de um projeto com muito pouca vontade de elaborar em cima da boa premissa, disposto (com o perdão do trocadilho) a adotar o chavão do pensamento comum ao invés de plenamente desafiá-lo.
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