Falta tudo na continuação de 300
Por Pedro Strazza
[Esta resenha talvez possua alguns leves spoilers sobre a trama do filme. Nada muito pesado, mas se quiser ver o filme como ele o é talvez seja melhor deixar este texto para depois da sessão.]
O choque visual que 300 trouxe às telas em 2007 foi sem dúvida interessante e marcante. Adaptando a HQ de Frank Miller (Os 300 de Esparta), o filme dirigido por um ainda iniciante Zack Snyder (na época, ele havia até então realizado apenas um filme, Madrugada dos Mortos) mostrava um "ideal" de virilidade masculina em meio ao banho de sangue proporcionado pela Batalha de Termópilas, confronto protagonizado pelo rei espartano Leônidas (Gerard Butler, em atuação exageradíssima, convincente e fundamental para o longa) e seus 300 soldados, que lutava pela liberdade de seu povo; e por Xerxes (Rodrigo Santoro, outro com performance necessariamente exagerada) e seu gigantesco exército persa, cujo objetivo era o de subjugar a nação grega. Esse conflito, bastante deturpado pela obra de Miller para seus próprios fins, ganhou nas mãos de Snyder uma estética belíssima de videoclipe, aliando a violência exagerada dos combates com elementos gráficos de quadrinhos estilizados, como o sangue notavelmente artístico ou a fotografia grandiosa.
A direção de Snyder, o texto de Miller, a brutalidade gráfica e as atuações explosivas do elenco principal formam as quatro bases mais importantes para 300, que com estas obteve naquele ano sucesso como obra e produto, angariando pouco tempo depois o status de filme cult para fãs e leitores de quadrinhos. Sua sequência, por outro lado, praticamente não terá nenhuma chance de alcançar esse posto, visto que seu conteúdo consegue não só falhar em quase todos os alicerces do primeiro longa como também chega a tirar parte da bravura de Leônidas na façanha de desafiar o deus-rei persa.
Passado em uma linha de tempo maior que a da produção de 2007 (Mas, curiosamente, com menor duração que o o original), 300 - A Ascensão do Império acompanha a jornada do general ateniense Themistokles (Sullivan Stapleton) no decorrer da guerra contra os persas, mostrando desde sua participação chave na batalha de Maratona - onde assassinou o rei Dario - até o confronto contra a marinha inteira de Xerxes em Salamis. O foco maior do filme, entretanto, é na batalha pelo controle do mar Egeu, que confronta a mente tática do ateniense com a do braço direito de Xerxes, Artemisia (Eva Green), e se desenrola ao mesmo tempo que Leônidas e seus espartanos guerreiam em Termópilas.
A premissa do roteiro (elaborado por Snyder e Kurt Johnstad) de explorar o contexto que ocorre em volta de 300 é inicialmente interessante, mas rapidamente naufraga em meio aos mais diversos fatores. A começar pelo próprio Themistokles, que deixa a desejar muito em liderança quando comparado ao rei espartano. Se Leônidas marcava o imaginário do público com o overacting de Gerard Butler e seus discursos - capazes de inflamar o mais desmotivado de seus soldados -, o ateniense é por sua vez burocrático e tedioso demais com pregações burocráticas e nada marcantes, propondo-se a explicar seus planos tim-tim por tim-tim, além de uma atuação oscilante de Stapleton.
Outros dois personagem que também sofrem desenvolvimentos péssimos na sequência são Xerxes e a rainha Gorgo (Lena Headey). Enquanto o deus-rei persa perde por completo o destaque inicial, ganho por sua origem apressada e mal detalhada, quando vai para Termópilas e recebe um estranho status de manipulado, a espartana sofre uma mudança de perfil radical e irreal, deixando de ser aquela mulher disposta a sacrificar tudo pela liberdade de sua cidade-estado do primeiro filme para ser aqui uma governante tão receosa quanto os políticos que combatia.
A necessidade de explicação também atrapalha o desenvolvimento natural de A Ascensão do Império. Em vários momentos, a narração em off de Gorgo e a retomada de certas cenas provam-se ser extremamente desnecessária para o andamento da história, a exemplo da derrota da armada de Themistokles - precisava mesmo falar que ele estava desolado em ver seus soldados mortos quando a câmera mostra isso claramente? - ou a flechada no rei Dario, repetida pelo MESMO ângulo da primeira visualização. Esses deslizes na montagem da produção, repetidos à exaustão, levam a crer que o diretor Noam Murro (em seu segundo trabalho como diretor) encara o seu público como incapaz de entender o peso dos acontecimentos mostrados - algo completamente inverossímil e recorrente na Hollywood de hoje.
Ainda sobre Murro, é infeliz sua decisão em convergir seus esforços na emulação do estilo visual de Snyder (e de sua violência, portanto) aqui. Mesmo que sendo uma tentativa louvável, a fotografia de sua produção não chega nada perto do resultado obtido em 2007, faltando claramente a Murro a fetichização característica e consagrada do diretor de Watchmen e O Homem de Aço. Se Zack tem um cuidado especial em banalizar a violência que filma - tirando assim muito do peso da maioria das cenas violentas de 300 -, Noam por sua vez procura desesperadamente copiar as técnicas de seu antecessor em todas os momentos possíveis, empregando o slow-motion e o sangue (agora muito mais digitalizado e irreal) sem nenhum tato artístico na ação, cuja brutalidade tem seu peso constatado o tempo todo.
Dentre todos esses problemas técnicos e criativos, entretanto, há um acerto personificado na figura de Artemisia, a grande antagonista do longa. De passado trágico e violento, a comandante da frota de Xerxes prova-se ser uma adversária perigosíssima e diabólica ao longo do filme, utilizando seu cérebro e sensualidade nos momentos adequados. E se Stapleton não sabe se exagera ou não o seu personagem, Eva Green abraça toda a loucura da vilã para entregar uma atuação das mais formidáveis - e de longe a melhor do longa.
Mas o filme se auto sabota novamente quando aborda o relacionamento entre Artemisia e Themistokles. É bastante claro que, com o passar do tempo, o espectador enxergue no confronto tático exercido ali a criação de uma paixão entre ambos os líderes, nascidos para lutar e casados com o suor e sangue da guerra. O longa, entretanto, rapidamente entrega essa subjetividade curiosa numa bandeja, em uma das cenas de sexo mais sem sentido - e ainda tem encaixado um alívio cômico dos mais fracos.
A grande verdade de 300 - A Ascensão do Império é que sua existência foi de fato desnecessária para agora. Mesmo Frank Miller estando em má fase, a produção poderia ter esperado que este concluísse Xerxes, a continuação de Os 300 de Esparta, para possuir uma base mais fortalecida que a elaborada por Snyder e Johnstad aqui - ou até esperado o próprio Snyder ter um espaço aberto em sua agenda, bastante abarrotada agora por causa de seus compromissos com a DC Comics. Se Leônidas tivesse sobrevivido aos acontecimentos do primeiro filme, é bem provável que este teria se suicidado com esta desprezível continuação.
2 comentários :
No final acabou dando nota 2 mesmo XD
O 1 foi quase, só digo isso XD
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