domingo, 18 de setembro de 2016

Crítica: Bruxa de Blair

Nova versão transforma temática do original em montanha-russa de imersão.

Por Pedro Strazza.

Seguindo a tradição recente de sequências de franquias mais velhas que reproduzem o original com novidades pontuais, o novo Bruxa de Blair a princípio não deixa de fazer o mesmo com A Bruxa de Blair de 1999. Da obra-prima responsável pela popularização do found footage nesse início de século, o filme de 2016 mantém principalmente a estrutura, que envolve a preparação do horror em dois atos para a consumação deste em um terceiro por meio da história "real" de um grupo de jovens que adentra a floresta de Black Hills à procura da lenda do título.

Comparar as duas versões pelo esforço da justificação (ou seja, sobrepondo suas narrativas para encontrar diferenças), entretanto, pode se provar um esforço equivocado, já que o longa dirigido por Adam Wingard tem uma proposta muito diferente da concebida por Daniel Myrick e Eduardo Sánchez no fim dos anos 90. Se o terror provindo da colagem de filmagens realizadas por Heather, Joshua e Michael e encontradas algumas semanas depois de seu desaparecimento era criado pelo processo de testemunho ao qual o espectador inevitavelmente era submetido, a do grupo liderada por James (James Allen McCune) e Lisa (Callie Hernandez) está ligado a uma experiência de imersão, capaz de jogar o público para dentro dos eventos narrados e colocá-lo na mesma posição de suspense ao qual estão os personagens.

Essa medida imposta por Wingard, bastante ligada ao advento de formas novas de experimentar e interagir com um ambiente distante ao vivido pelo indivíduo - seja na realidade aumentada, nos óculos de realidade virtual dos games ou mesmo nos vídeos filmados em 360 graus -, potencializa o horror da estrutura de Bruxa de Blair no sentido de aumentar o frenesi de suas ações e, por consequência, o pânico gerado nestas. O diretor, porém, sabe como distribuir isso sem perder tanto o timing quanto o controle: com um número bem maior de câmeras e muito mais pressa que o original, o filme se preocupa em usar estas para mapear espaços e demarcar a lógica contraditória destes, abraçando de vez o viés de labirinto sem saída da trama. Se a câmera em primeira pessoa desempenha bem sua função de situar o espectador dentro desse ambiente enlouquecedor, as situadas no drone e nas filmadoras convencionais são ideais para a produção estabelecer o espaço virtual que tanto procura à obra.

O resultado é que Bruxa de Blair, por mais ligado que esteja ao original em termos de trama, consegue se diferenciar deste ao levar o conceito de terror lúdico ao status de modo de operação único. Se as cenas na floresta e na cabana da bruxa não se desvencilham da emulação do longa de Myrick e Sánchez, elas em simultâneo aumentam o nível de desespero da crescente de pânico da história, graças ao efeito de imersão que se propõe a realizar. Ainda que não mostre aqui pretensão alguma sobre o campo simbólico, Wingard é eficaz nesse desejo de aterrorizar sua audiência apenas pelas situações apresentadas em sua narrativa bem desenvolvida.

Mas se por um lado tal ação amplifica a tensão sentida durante o desenrolar dos eventos, ela também prejudica a produção pela falta de substância. Enquanto os personagens do roteiro de Simon Barrett, meros avatares confeccionados para uso do espectador, possuem perfis ocos e abandonam qualquer ambição a partir da metade da trama, a ausência de uma temática maior que não seja a de conceber uma montanha-russa de horror cinematográfico ressalta repetições, gorduras e exageros da direção, como a cena do túnel e as aparições rápidas de criaturas no clímax ou os pequenos gores no restante da narrativa. Se há uma comparação a ser feita entre a versão original e a nova é que o primeiro possuía pelo menos o arco da materialização do pesadelo do autor de se ver preso dentro da própria obra para se guiar.

Esse é um problema sentido não apenas por Bruxa de Blair, mas por tantos outros terrores contemporâneos que são conduzidos mais por propostas visuais que pela criação de significados dentro destas. No caso da obra de Wingard, a decisão pelo rompimento total com a camada temática produz um filme bastante eficaz na experiência de horror mais imediata, mas como qualquer outro entretenimento lúdico ele se dissolve pouco tempo depois do fim da sessão e acaba por não incutir um tormento a longo prazo.

Nota: 7/10

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