domingo, 19 de julho de 2015

Crítica: Homem-Formiga

Herói diminuto se aproveita do caráter marginal para contar história de assalto.

Por Pedro Strazza.

Embora pregue a acessibilidade universal em todos os seus longa-metragens, é estranho que só em seu 12° trabalho a Marvel Studios use como tema principal as relações familiares. Em outros filmes abordado pelas beiradas - No primeiro Thor o conflito entre o protagonista e Odin era muito mais sobre a responsabilidade do primeiro que o relacionamento entre os dois, enquanto Homem de Ferro 2 traz o pai de Tony Stark apenas por este ser a representação mais imediata do passado -, o assunto "pais-e-filhos" ganha centralidade em Homem-Formiga, conduzindo a trama de assalto super-heroica em direção aos seus próprios objetivos.

Relação esta, a bem da verdade, muito mais sobre pais e filhas, já que ambos os personagens principais da ação tem mulheres como cria e centro de suas próprias crises. Enquanto o brilhante cientista Hank Pym (Michael Douglas) sofre pelo distanciamento auto-imposto de sua filha Hope (Evangeline Lilly), Scott Lang (Paul Rudd) sofre do mesmo problema com a pequena Cassie (Abby Ryder Fortson), afastado pela família e autoridades graças à sua atuação criminosa - mesmo que sendo para o bem, como lembra o roteiro de Edgar Wright, Joe Cornish, Rudd e Adam McKay. Quando os dois se unem para sabotar a recriação da partícula inventada por Pym antes que esta seja vendida às pessoas erradas por seu pupilo Darren Cross (Corey Stoll), é óbvio que o roubo servirá de base para eles resolverem seus problemas pessoais.

A trama de reparações, mesmo clichê em muitos momentos, funciona em parte pelo próprio alívio dado pelo diretor Peyton Reed ao seu inevitável peso sem que este seja sublimado de vez. Ao mesmo tempo que a relação de Pym com Hope e a de Lang com o padrasto de Cassie (Bobby Cannavale, ator experiente no papel de autoridade de contestação) trazem todos os embates de reaproximação necessário, o filme apresenta humor na mesma medida, distribuindo-a bem entre seus alívios cômicos (aos quais Michael Peña lidera bastante inspirado) e até na figura de Rudd, encarregado de criar o mesmo humor em cima da seriedade da situação que Chris Pratt faz em Guardiões da Galáxia.

Essa comédia que simultaneamente tira sarro e não desmerece a história, marca cada vez mais constante nas produções da Marvel Studios, é tão eficaz em Homem-Formiga quanto no longa de James Gunn, porém por motivos distintos. Se no épico espacial isso ocorre porque a obra encontra nos gêneros ao qual pertence um campo livre para piadas, aqui ela funciona pela própria percepção do filme em ser marginal ao seu próprio universo. Assim, o que se vê em tela não é a franquia Marvel guiando a trama para se encaixar à sua mitologia, mas sim a trama se valendo de personagens e acontecimentos dela para conceber sua narrativa, sem esquecer de fechar seu mundo a um determinado número de elementos que consiga controlar.

O que o longa acerta em risadas e conexões, entretanto, ele peca na ação e antagonismo, muito em parte pela própria escalação de seu diretor. Bastante experiente com comédias, Reed se prova amador na hora de conduzir as cenas de combate e não aproveita o material em mãos da melhor forma possível, restringindo-se à fórmula da alternação rápida entre personagens e ambiente para brincar com os poderes encolhedores dos seus super-seres. Para piorar, graças ao tempo dado para desenvolver os relacionamentos dos protagonistas, o vilão Cross acaba sem espaço na narrativa para desempenhar qualquer tipo de arco de vilania ou enlouquecimento, e parte do início como figura de perigo para no final se revelar apenas um vendedor.

Considerado por muitos umas das produções mais complicadas da Marvel Studios - culpa em parte do caráter jocoso do herói e seus poderes, em parte do processo conturbado que foi a realização do filme -, Homem-Formiga acaba por sair bem de suas próprias adversidades, mas tropeça em erros menores ao se preocupar demais com as primeiras. Mas apesar destes problemas, o longa no fim entrega uma história pura em intenções e de execução funcional, não tendo medo de se atestar periférico em seu mundo para elaborar com calma os conflitos familiares ao qual se dispõe tanto a analisar.

Nota: 8/10

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